Comissão de inquérito criada para investigar abusos sexuais na cadeia de Ndlavela, em Maputo, conclui que houve violação de reclusas, mas nega que o crime denunciado pelo CIP tenha acontecido fora da penitenciária.
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A comissão de inquérito criada pelo governo moçambicano para averiguar os abusos sexuais na cadeia feminina de Ndlavela, na província de Maputo, diz ter constatado algumas irregularidades na investigação do Centro de Integridade Pública (CIP), que denunciou o caso.
Houve violação de reclusas, confirma a comissão, que nega, no entanto, que o crime tenha acontecido fora do estabelecimento prisional.
A comissão revelou esta quarta-feira (07.07) que entrevistou 53 prisioneiras que não reconheceram que as reclusas foram retiradas do interior da cadeia para serem abusadas. Constatou também que as inquiridas não reconheceram as reclusas exibidas no vídeo do CIP.
"Tendo sido questionadas se reconheciam as pessoas nelas constantes, nenhuma reclusa conseguiu identificar e reconhecer as caras que nós exibimos extraídas do vídeo da denúncia", disse a relatora da comissão, Elisa Samuel.
Práticas sexuais com reclusas
De acordo com o relatório, as reclusas inquiridas alegaram ainda que, em algumas ocasiões, guardas penitenciários e homens estranhos em conivência com os responsáveis do estabelecimento facilitavam práticas sexuais com as reclusas.
A vida depois da prisão em Moçambique
08:13
"O que acontecia aqui são essas filhas do chefe ou da chefe que se envolviam com os homens que entravam aqui, que eram metidos pelas chefes ou pelo chefe. Elas se encontravam com eles na costura grande [Pavilhão de Costura] e nessa casa tinha lá um colchão e um fogão", precisou a relatora Elisa Samuel.
O relatório classificou ao abusos na cadeia como atos de tortura, tratamento cruel e desumano. Por isso, a comissão recomenda o Ministério da Justiça a "responsabilizar disciplinarmente as pessoas envolvidas e instaurar processos disciplinares contra todos aqueles que haja provado terem praticado qualquer ato que atentem contra os direitos humanos das reclusas, incluindo a exploração e abuso sexual."
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Direitos em caso de abuso
O relatório recomenda ainda que todas as reclusas devem ter o direito de não serem abusadas sexualmente e o direito de reclamar em caso de abuso, além de "garantir todas as denúncias de abusos sexuais sejam investigadas de forma independente, rápida e completa de acordo com as melhores práticas de investigação sobre os abusos sexuais, incluindo ações de seguimento dos casos denunciados."
O "caso Ndlavela" foi despoletado pelo CIP, que durante seis meses de investigação conseguiu falar com reclusas que supostamente eram sujeitas à prostituição. Nessa altura, o investigador Borges Nhamire denunciou "um esquema montado há anos".
"Uma das reclusas explicava que tem nomes de pessoas que referiram que estão à frente disso, mas diziam que quando chegam reclusas mais novas, mais clarinhas são as preferidas, mas tem as mais velhas que fazem uma espécie de identificação", revelou Nhamire.
Mapudjé: A cadeia que produz alimentos no norte de Moçambique
Localizada a 100 km de Lichinga, na província nortenha do Niassa, a cadeia aberta de Mapudjé tem um objetivo: produzir alimentos. A produção serve outras cinco cadeias da região e reduz os custos ao Estado.
Foto: DW/M. David
Reclusos
Este centro de reclusão aberto abriga 150 reclusos. São detidos provenientes da cadeia provincial do Niassa, que estão a cumprir as suas penas em regime aberto graças ao bom comportamento apresentado. Aqui, neste estabelecimento penitenciário, eles também trabalham no campo.
Foto: DW/M. David
Via de acesso
Chegar ao centro de Mapudjé não é tarefa fácil. Com uma estrada totalmente lamacenta, pouco frequentada, o acesso ao local é difícil, sobretudo no tempo chuvoso. Recomenda-se carros com tração às quatro rodas para enfrentar este caminho, que passa também por troços de floresta cerrada.
Foto: DW/M. David
Construção típica
Quem chega ao centro de Mapudjé logo surpreende-se com as infraestruturas típicas da região. Esta casa é um exemplo. Foi construída com materiais locais - paus, bambu e capim - para ser o escritório do centro. A construção chama a atenção, pois foi erguida no alto de uma elevação.
Foto: DW/M. David
Posto de saúde
Para oferecer melhor atendimento sanitário aos reclusos, o centro aberto de Mapudjé conta com um posto de primeiros socorros. Em casos mais graves ou atendimento mais especializado, os detidos são transferidos para uma unidade sanitária distrital ou provincial.
Foto: DW/M. David
Produção agrícola
Com um trator e respetivas ferramentas, oferecidas a título de crédito pelo Fundo de Desenvolvimento Agrário (FDA), a cadeia de Mapudjé explora 135 hectares, cultivando milho, feijão manteiga e hortícolas. Na campanha agrícola passada, o centro de Mapudjé colheu mais de 60 toneladas de milho e 35 toneladas de feijão manteiga.
Foto: DW/M. David
Árvores de fruto
O centro também está a apostar em pequenas áreas para o cultivo de árvores de fruto. Aqui o destaque são as laranjeiras, que também ajudam no fornecimento de alimentos aos centros penitenciários do Niassa.
Foto: DW/M. David
Consumo vs. economia
As cadeias provinciais de Lichinga, Marrupa, Cuamba, Mecanhelas e Mandimba deixaram de comprar milho e feijão manteiga para o consumo dos reclusos. Agora consomem a comida produzida pelos detidos do centro de Mapudjé, no distrito de Sanga. Os Serviços Penitenciários do Niassa poupam mensalmente aos cofres do Estado cerca de 2,5 milhões de meticais (quase 35 mil euros).
Foto: DW/M. David
Produção farta
A produção agrícola do centro de Mapudjé é tão farta que a safra passada de feijão manteiga conseguiu alimentar até fevereiro deste ano os reclusos daquelas cinco cadeias provinciais. Quem o diz é o diretor da cadeia de Mapudjé, Jorge Santina. E ele garante que o milho continuará a ser consumido até à próxima colheita.
Foto: DW/M. David
"Experiência será replicada"
De visita ao centro aberto de Mapudjé, o diretor do FDA, Eusébio Tumuitikile, ficou satisfeito com os resultados da mecanização do processo de produção agrícola naquela unidade, que visa acabar com o défice alimentar no país. Por isso, Tumutikile disse que a experiência da autossuficiência alimentar da cadeia aberta de Mapudje será replicada noutros centros prisionais do país.