Comité Central da FRELIMO: Apelos a coesão e unidade
Leonel Matias (Maputo)
3 de maio de 2019
É em contexto de lutas internas que acontece a terceira sessão ordinária do Comité Central da FRELIMO. Não se esperam grandes novidades apesar da onda de problemas que atinge o partido no poder. Haverá mais do mesmo?
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O Comité Central da FRELIMO, o partido no poder, vai passar em revista a situação política, económica e social do país e a "vida" interna da formação. Também deverá alinhar o seu posicionamento face às eleições gerais de outubro de 2019 e o processo de descentralização.
O presidente da FRELIMO, Filipe Nyusi, reconheceu na abertura do encontro que o processo de descentralização constitui um desafio e disse que o partido deve aprimorar as diretivas de eleições internas, de modo a garantir a identificação e integração de candidaturas de quadros com influência real, competentes e idóneos.
Dossier RENAMO: "Bastante lento" e "já cansa"
Nyusi apelou ainda a unidade, coesão, e disciplina no seio do partido, sublinhando que não há inimigos dentro da organização. No seu discurso, o líder da FRELIMO voltou a exigir o desarmamento, desmobilização e reintegração social das forças da RENAMO, o maior partido da oposição, um dossier que segundo afirmou, tem sido "bastante lento" e "já cansa".
"A RENAMO deve dizer quantos e quais os guerrilheiros existem e indicar as bases onde devem juntar-se com as respetivas armas", exigiu o presidente da FRELIMO.
Filipe Nyusi defende que "os moçambicanos têm o direito de ir às eleições num ambiente de paz para votarem nos candidatos da sua preferência, de forma livre e sem o espetro do regresso à guerra".
O líder da FRELIMO e Presidente do país reiterou ainda que o pacote de descentralização e a questão do desarmamento, desmobilização e reintegração social dos homens da RENAMO são duas componentes indissociáveis, sublinhando que o Governo facilitou a aprovação da legislação sobre a descentralização.
Apelos e mais apelos...Sobre os ataques de homens armados até aqui desconhecidos na província nortenha de Cabo Delgado, Filipe Nyusi enalteceu o papel das Forças de Defesa e Segurança no combate àquele grupo e apelou às instituições da justiça para que continuem a trabalhar com celeridade para a responsabilização exemplar dos indiciados, de modo a esclarecer a verdadeira identidade e objetivos dos insurgentes.
Comité Central da FRELIMO: Apelos a coesão e unidade com foco nas eleições
"Notamos alguns absolvidos a regressar às fileiras [do grupo de insurgentes] e isso desmotiva. Há aqueles a quem se diz que não há matéria e que depois são abatidos no terreno. Isso é mau", lamenta Nyusi.
Após a sessão de abertura da sessão do Comité Central, seguiram-se à porta fechada a apresentação e apreciação dos relatórios da Comissão Política e do Comité de Verificação do Partido. Segundo o porta voz do encontro, Caifadine Manasse, os debates decorrem com muita abertura e com tempo ilimitado nas intervenções.
"Há um debate interessante no sentido de chamar a coesão, a unidade, com foco nas eleições e na defesa dos interesses do povo", afirmou Manasse, sem adiantar detalhes sobre o conteúdo das intervenções.
Caso Samito: Espera-se mais do mesmo?
Fora da sala de sessões, o público está na expetativa em relação ao resultado do debate em torno de alguns temas que têm dominado a atualidade como a contestação da liderança de Filipe Nyusi por parte de Samora Machel Júnior, filho do primeiro Presidente de Moçambique independente.
Mas, o jornalista Francisco Carmona não espera que venham a público pormenores sobre estas lutas internas no seio da FRELIMO: "Vão sair com aquele discurso, que já nos habituaram, de que o partido está forte, que o partido está coeso, vão reiterar a candidatura de Filipe Nyusi para as eleições de outubro."
E acrescentou: "Eu penso que o que vão tentar dizer é que este assunto ainda está a ser tratado, ainda está em investigação, e empurrarem até depois de outubro, depois das eleições."
Carmona nota que nas vésperas da sessão, Nyusi reuniu-se em separado com a bancada parlamentar e o braço juvenil do partido que reiteraram o seu apoio a sua candidatura, posição também tornada pública pelo Secretário Geral da Associação dos Combatentes da Luta de Libertação Nacional.
"Vejo essas reuniões como uma forma que ele encontrou para desarticular algumas vozes contestatárias que poderiam surgir dentro do comité central. Ele não vai tão fragilizado. Eu penso que ele sairá mais reforçado deste Comité Central".
“A Palavra e o Gesto” de Samora Machel
Na Fundação Mário Soares, em Lisboa, estão expostas as fotografias de Samora Moisés Machel, líder da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO). As imagens são do fotógrafo moçambicano Kok Nam (1939-2012).
Foto: Fundação Mário Soares/Estúdio Kok Nam
Dos primeiros retratos do Presidente
O conceituado fotojornalista moçambicano, Kok Nam, registou as imagens e os gestos que tornaram lendária a figura e o carisma do primeiro Presidente da República de Moçambique. Machel foi Presidente de 25 de junho de 1975 a 19 de outubro de 1986.
Os registos fiéis de Kok Nam
A exposição, inaugurada no dia 24 de novembro, abre com esta imagem de 1985 em que o Presidente moçambicano falava à população. No verso Kok Nam escreveu “The maestro of the mass rally” (O maestro do comício de massas). Após a independência, em 1975, com a fuga generalizada dos quadros brancos, Machel lançou programas de reorganização económica, com o apoio dos países socialistas.
Foto: Fundação Mário Soares/Estúdio Kok Nam
Graça Machel: primeira-dama
Em 1976, casa com Graça Simbine, que entrara em 1969 para a organização clandestina da FRELIMO. Além de primeira-dama, Graça Machel foi ministra da Educação até 1989. Uma das figuras mais conhecidas da História africana, Graça Machel é a única mulher que foi primeira-dama de dois países. Depois da morte de Samora, casou com Nelson Mandela, primeiro Presidente da África do Sul do pós-apartheid.
Foto: Fundação Mário Soares/Estúdio Kok Nam
Político frontal e didático
Frontal, direto, seguro de si e desafiador no discurso à população: esta foto de 1983 captou um dos gestos típicos do político. Samora convencia pela simplicidade com que abordava os assuntos mais complexos do país e dos moçambicanos. Foi assim que conquistou a adesão das populações às suas mensagens e doutrina.
Foto: Fundação Mário Soares/Estúdio Kok Nam
A mobilização dos jovens
Nascido a 29 de setembro de 1933, em Xilambene, na província de Gaza, Machel viria a assumir-se como um combatente pela liberdade. O seu objetivo era dar continuidade à luta iniciada pelo seu antecessor, Eduardo Mondlane, assassinado em fevereiro de 1969, e que fundou a FRELIMO em junho de 1962. Nesta foto, Machel dirige-se aos jovens militares na base de Nachingwea (1974).
Foto: Fundação Mário Soares/Estúdio Kok Nam
Unir todos os moçambicanos
Conversa com uma cidadã moçambicana (1983). Samora sabia escutar a voz do povo. Das suas frases, esta proferida em setembro 1973 expressa bem uma das suas maiores preocupações: "Unir todos os moçambicanos, para além das tradições e línguas diversas, requer que na nossa consciência morra a tribo para que nasça a Nação.”
Foto: Fundação Mário Soares/Estúdio Kok Nam
Capacidade de diálogo
A unidade da Nação ainda hoje é uma prioridade defendida pela FRELIMO, no poder desde 1975. Samora afirmou que "O povo não é um conjunto de raças. É um conjunto de homens iguais". Perante o olhar atento de populares e da imprensa, o líder conversa com uma senhora, dando provas da sua capacidade de diálogo no período de transição entre a dominação colonial e a independência de Moçambique.
Foto: Fundação Mário Soares/Estúdio Kok Nam
Atenção à saúde dos moçambicanos
Samora Machel em visita a uma unidade hospitalar moçambicana em 1983. Machel dizia que o doente era sagrado para o hospital: "Um enfermeiro, um servente, um médico, não conhecem a vingança na sua missão. O pessoal médico não discrimina doentes", dizia. Gostava de dar orientações em todos os setores e momentos da vida moçambicana.
Foto: Fundação Mário Soares/Estúdio Kok Nam
A ligação ao bloco soviético
Samora Machel tratou sempre de privilegiar a relação com o bloco socialista, que apoiou a luta de libertação das antigas colónias portuguesas. Kok Nam registou o Presidente à partida para uma visita à então União Soviética. Esta desempenhou um papel relevante nos chamados países da “Linha da Frente” de luta contra o regime do apartheid da África do Sul.
Foto: Fundação Mário Soares/Estúdio Kok Nam
Morte em Mbuzini
Samora Machel morreu em 19 de outubro de 1986, quando o avião em que seguia se despenhou em Mbuzini, na vizinha África do Sul, na fronteira com Moçambique. Regressava a Maputo vindo de uma cimeira na Zâmbia, com os presidentes de Angola, Eduardo dos Santos, e do Zaire, Mobuto Sese Seko, entre outros. A exposição em Lisboa assinala os 30 anos da sua morte.