Há 20 anos, o assassinato do moçambicano Alberto Adriano no leste da Alemanha chocou o país. Uma associação em Berlim apoia vítimas de discriminação racial e mostra como episódios racistas podem ser punidos pela lei.
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Há vinte anos, a Alemanha ficou chocada com o assassinato de Alberto Adriano. O moçambicano de 39 anos foi brutalmente espancado por um grupo de neonazistas, perto do Stadtpark, na cidade de Dessau, leste do país, quando regressava à sau casa depois de uma noite com amigos. Casado e pai de três filhos, Alberto Adriano acabou por não resistir aos graves ferimentos na cabeça e faleceu no hospital no dia 14 de junho de 2000.
Duas décadas se passaram desde então e a verdade é que a discriminação racial continua a motivar ataques na Alemanha. Aliás, os números mais recentes divulgados pela Agência Federal Anti-Discriminação (ADS) alemã dão conta de um aumento significativo na discriminação racial no país.
Céline Barry é responsável do gabinete anti-discriminação da "Each One Teach One”, uma associação criada em Berlim e que pretende ser um espaço de partilha e solidariedade, onde vítimas de discriminação podem contar a sua história e pedir ajuda.
"O que queremos é que a associação seja um espaço onde as pessoas de pele negra se possam encontrar, partilhar os seus conhecimentos e falar das suas experiências", conta.
Legislação antiracista
Mas não só. A associação pretende ir mais além e mostrar que certos episódios que se repetem no quotidiano alemão podem ser punidos por lei. Um dos mais comuns, diz a ativista e socióloga Céline Barry, é ser negada aos jovens de pele negra a entrada numa discoteca.
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"Há muitas opções legais. A entrada na discoteca está abrangida pela Lei Geral da Igualdade. Ou seja, se me é negada a entrada, eu tenho o direito de processar", informa.
Como aconteceu em centenas de países, a morte de George Floyd, nos Estados Unidos da América, também não passou despercebida na Alemanha.
Foram várias as cidades onde foram realizados protestos de apoio ao Movimento "Black Lives Matter".
"É um momento desafiante. Mas é também um momento que nos dá esperança de que as coisas mudem na sociedade alemã, que começa a mostrar sensibilidade para esta questão", observa a ativista.
Lei inédita aprovada
Entretanto, e na sequência dos protestos em massa nos Estados Unidos e em todo o mundo contra o racismo e a violência policial, a capital Berlim aprovou, a semana passada, uma lei antidiscriminação, inédita na Alemanha.
A nova lei impede os funcionários públicos, incluindo a polícia e as escolas públicas, de discriminar qualquer habitante da capital alemã com base no sexo, origem étnica, religião, convicções políticas, deficiência, idade, identidade sexual ou estatuto social.
Protesto contra o racismo nos cinco cantos do mundo
A morte de George Floyd move pessoas em todo o mundo. Apesar das restrições devido à pandemia da Covid-19, centenas de milhares de manifestantes decidiram sair às ruas e protestar contra o racismo sistémico.
Foto: picture-alliance/AP Photo/T. Hadebe
Lisboa: Agir agora!
Embora a manifestação não tenha sido autorizada, a polícia permitiu que os participantes avançassem. Em Portugal, também há violência policial contra a população negra. Em janeiro de 2019, quando centenas de pessoas se manifestaram espontaneamente, após um incidente no bairro da Jamaica, a polícia disparou balas de borracha.
Foto: picture-alliance/NurPhoto/J. Mantilla
Paris: Protesto no "Champ de Mars"
Nos últimos dias a polícia francesa tem dispersado manifestantes com gás lacrimogéneo nas manifestações nas proximidades da Torre Eiffel e em frente à embaixada dos EUA. No entanto, milhares de pessoas saíram à rua - mesmo para além de Paris - contra o racismo. A violência policial contra a população negra é particularmente generalizada nos subúrbios.
Foto: picture-alliance/Photoshot/A. Morissard
Manifestação apesar da proibição
A Bélgica, assim como a maioria dos países europeus, tem uma quota-parte na exploração e subjugação colonial de outros continentes. A atual República Democrática do Congo foi, em tempos, propriedade privada do Rei Leopoldo II, que estabeleceu um regime racista. Em Bruxelas, Antuérpia e Liège, houve manifestações contra o racismo, apesar das proibições impostas devido à Covid-19.
Foto: picture-alliance/abaca/B. Arnaud
Munique: Baviera colorida
Uma das maiores manifestações da Alemanha teve lugar em Munique, onde se reuniram 30.000 pessoas. Colónia, Frankfurt e Hamburgo também foram palcos de grandes manifestações. Em Berlim, a polícia teve de bloquear temporariamente as estradas de acesso à Alexanderplatz, porque havia demasiadas pessoas.
Foto: picture-alliance/Zumapress/S. Babbar
Viena: 50 mil contra o racismo
Na capital austríaca de Viena, reuniram-se 50 mil pessoas, segundo a polícia local. Esta foi uma das maiores manifestações dos últimos anos, incluindo o escândalo de Ibiza e a espetacular implosão da coligação de governo de direita em 2019.
Foto: picture-alliance/H. Punz
Sófia: Oposição ao racismo
Como a maioria dos países europeus, a Bulgária proíbe a realização de agrupamentos com mais de dez participantes. No entanto, centenas reuniram-se na capital da Bulgária, Sófia. Juntas, gritaram as últimas palavras de George Floyd antes de morrer: "Não consigo respirar", mas também chamaram a atenção para o racismo na sociedade búlgara.
Foto: picture-alliance/AA
Turim: Protesto com máscara
Esta mulher em Turim agrafou a sua preocupação política à mascára necessária num dos países mais afetados pela Covid-19: "As vidas negras também contam em Itália". As manifestações, incluindo em Roma e Milão, serão os maiores aglomerados registados desde o início das medidas de combate ao coronavírus. A Itália é um dos principais países de acolhimento de emigrantes africanos da União Europeia.
Foto: picture-alliance/NurPhoto/M. Ujetto
Cidade do México: Floyd e Lopez
No México, não é apenas a morte de George Floyd que está a perturbar o país, mas também o destino semelhante do pedreiro Giovanni Lopez. Foi detido em maio, no estado ocidental de Jalisco, porque não estava a usar máscara. Presume-se que morreu vítima de violência policial. Após a publicação de um vídeo da operação, os manifestantes mexicanos intensificaram os protestos.
Foto: picture-alliance/Zumapress
Sydney: Racismo contra os aborígenes
O rali em Sydney começou com uma cerimónia tradicional de fumo. Aqui, a solidariedade dos pelo menos 20.000 participantes foi dirigida não só a George Floyd, mas também aos australianos da população aborígene, que também foram vítimas de violência policial racista. Os manifestantes exigem que ninguém continue a morrer sob custódia policial.
Foto: picture-alliance/NurPhoto/I. Khan
Pretória: Com o punho levantado
O punho levantado no ar é um símbolo do movimento "Black Lives Matter". Mas o gesto é muito mais antigo. Quando o regime do apartheid na África do Sul libertou Nelson Mandela da prisão, em fevereiro de 1990, ele levantou o punho no seu caminho para a liberdade, tal como este manifestante em Pretória. Na África do Sul, os brancos continuam a ser frequentemente favorecidos.