Os rappers MCK e Ikonoklasta, que formam a dupla Ikopongo, realizaram no domingo (12.03.) um concerto no município de Viana. A expetativa era grande, depois do espetáculo ter sido várias vezes impedido pelas autoridades.
Publicidade
Cerca de 400 pessoas foram ver o concerto dos rappers Luaty Beirão e MCK que, por serem críticos do Governo angolano, têm sido constantemente impedidos pelas autoridades de cantar nas grandes salas de espetáculo de Angola.
Mas os dois jovens, que formam a dupla "Ikopongo", resistiram.
"Ikopongo significa resistência", explica Luaty, que no mundo do rap também é conhecido por Ikonoklasta.
MCK e Ikonoklasta no "país do pai banana"
03:11
Finalmente, no domingo, os rappers conseguiram montar o "show", aguardado há muito tempo. As entradas foram grátis.
O espetáculo durou quase duas horas. No palco, MCK e Luaty Beirão apresentaram os sucessos "Atrás do Prejuízo", "A Bala Dói", "O País do Pai Banana", entre outras músicas que já se tornaram "hinos" de protesto contra a governação do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), o partido que, desde a independência, domina o poder em Angola.
O concerto foi realizado no "Complexo da Sovismo", onde se encontram as instalações da Rádio Despertar, no município de Viana, província de Luanda.
Rapazes e raparigas "curtiram bué" a atuação
Diandengue, um dos dos jovens que acompanharam o espetáculo do princípio ao fim, deu nota positiva: "Como diz o nome da dupla: Resistência! Uma vez barrados, eles resistiram até conseguirem realizar o que eles pretendiam", afirmou.
"O evento foi fixe", acrescentou Henriques dos Santos. "Porque quando a gente vai reivindicar algo, temos que ter mil maneiras e mil formas para poder levar a mensagem."
Isabel da Costa é uma das poucas mulheres que estiveram no concerto "Ikopongo". A jovem acompanha a carreira de Ikonoklasta e MCK há longos anos. Para ela, a música dos dois rappers ensina a sociedade a conhecer os seus direitos num país onde as leis são constantemente violadas.
"Têm feito um trabalho muito bom para a população", disse Isabel. "As suas músicas fazem as pessoas entender como funcionam as coisas e como reclamar os seus direitos. Infelizmente, estamos numa república não democrática, estamos numa república comunista. Aqui não aceitam as pessoas que pensam de maneira diferente, ao contrário deles. Por isso é que foram barrados."
"Felizmente o campo da Sovismo funciona como uma embaixada para aqueles que cantam para que haja uma boa governação", concluiu a jovem.
Previstos concertos noutros países lusófonos
13.03.2017 Concerto Luaty e MCK - MP3-Mono
This browser does not support the audio element.
MCK e Ikonoklasta são amigos há mais de 20 anos. A apresentação deste domingo, afirmam, "poderá ser a última no país", devido aos impedimentos.
Em declarações à DW África, o rapper MCK agradeceu o carinho que ambos receberam do público, e afirmou que a dupla poderá apresentar-se em Moçambique e também no Brasil nos próximos tempos.
"Atualmente há dois convites: Um para Maputo e outro para o Brasil", revelou. "Infelizmente, não atuaremos tão cedo no interior de Angola, porque não há liberdade. Se em Luanda há todas estas limitações, então imagine-se como será nas regiões mais afastadas", lamenta o artista, lembrando que já foi impedido de cantar nas províncias da Huíla e do Namibe em 2016.
"No ano passado, depois de dois concertos cancelados em Luanda, tive mais dois concertos cancelados: um no Lubango, a 18 de Novembro, e outro a 19 de Novembro, no Namibe. Não depende de nós, os artistas. O artista quer cantar sempre. Só que vivemos no país onde a democracia é embrionária e se fecha para a liberdade de expressão."
Artivismo: a arte política de André de Castro
O papel político da arte é o mote de "Liberdade Já", a exposição do artista brasileiro André de Castro que lembra, entre outros ativistas, os presos políticos angolanos.
Foto: MUXIMA/A. Ludovice
"Liberdade Já" em serigrafia
A arte pode ter uma missão política - é o que prova esta exposição de André de Castro, a primeira mostra a solo do artista visual brasileiro na Europa. Este primeiro painel à entrada da exposição, em Lisboa, é um tributo aos presos políticos angolanos. O autor deu-lhe o título de "Liberdade Já", slogan que alimentou o movimento de solidariedade internacional pela libertação dos ativistas.
Foto: MUXIMA/A. Ludovice
Debate sobre política internacional
Tanto este projeto "Liberdade Já" (2015) como "Movimentos" (2013-2014) tiveram repercussão mundial. O artista brasileiro destaca, através das suas obras, os jovens presos políticos de Angola, libertados em 2016. As suas imagens acabam por incentivar o debate sobre acontecimentos políticos internacionais.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Os "revús" compõem o painel…
O artista compõe o painel com "monoprints" em serigrafias repetidas. Aqui podem ver-se alguns dos jovens angolanos presos em Luanda, em 2015, por discutirem um livro sobre métodos pacíficos de protesto. Luaty Beirão, Domingos da Cruz, Nuno Álvaro Dala, Nito Alves, Benedito Jeremias e Nelson Dibango, entre outros, foram julgados pelo crime de atos preparatórios para a prática de rebelião.
Foto: DW/J. Carlos
… e multiplicam-se pelo mundo digital
O luso-angolano Luaty Beirão foi escolhido como símbolo do ativismo político, dando força à exposição, com a curadoria da Muxima. Os retratos multiplicaram-se no mundo digital, foram reproduzidos em t-shirts e posters. A venda das serigrafias expostas em mostras coletivas em Lisboa e Nova Iorque, em 2016, reverteu integralmente a favor das famílias dos presos políticos angolanos.
Foto: DW/J. Carlos
Além de Angola...
Em dezembro, André de Castro comemorou com as irmãs a abertura da exposição em Lisboa, que também apresenta rostos de ativistas como José Marcos Mavungo, advogado e ativista de Cabinda. Além de Angola, o artista desafia os visitantes a revisitar o movimento da Primavera Árabe. Dá a conhecer as pessoas e as suas lutas, propondo um ângulo mais pessoal e humano na narração do momento histórico.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Arte como ator social
No interesse do público e das comunidades, o artista brasileiro assume ser um promotor social. "Ao expor 'Movimentos' e 'Liberdade Já' juntos, a mostra permite um recorte da arte como ator social, questionando intenção, receção, apropriação e estética nas ruas e na internet", afirma André de Castro. É o que mostra a coleção "Movimentos", colocada na outra parede da sala.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Coragem para mudar o mundo
Nesta segunda parede, André de Castro imortaliza várias causas em diversas partes do mundo. São mulheres e homens que recusam aceitar a forma como são tratados pelos respetivos Estados. Acreditam, tal como o autor da exposição, que o mundo pode ser muito melhor. Por isso, com coragem, decidiram sair à rua.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Identidade política dos manifestantes…
Este primeiro projeto de André de Castro, em 2013, foi selecionado para a 11ª Bienal Brasileira de Design Gráfico e visto por mais de 40 mil visitantes, passando por Miami (2013), Nova Iorque (2014) e Brasília (2015). As serigrafias, que resultam de entrevistas realizadas através das redes sociais, retratam as identidades políticas dos manifestantes de diferentes países.
Foto: DW/J. Carlos
… e cultura das manifestações
Através das serigrafias, o artista procurou valorizar a força da ação individual dos manifestantes. Cada participante enviou uma foto de rosto, usando as redes sociais, e respondeu a uma série de perguntas sobre a sua identidade política. Assim, foram criados retratos políticos individuais que, em conjunto, formam uma mini etnografia da cultura material e imaterial das manifestações.
Foto: DW/J. Carlos
Do outro lado do mundo
Em Nova Iorque, no Zuccotti Park, a sugestão original foi ocupar Wall Street, símbolo dos capitais financeiros internacionais. Porque, afinal, foi a especulação de capitais que deu origem à crise que atormentou o mundo há anos. Questiona Daniel Aarão Reis, ao apresentar a exposição: "Como aceitar que os responsáveis não ficassem com o fardo principal das medidas de superação desta mesma crise?"
Foto: DW/J. Carlos
Novos dispositivos de mobilização
A arte política de André de Castro, que também evoca figuras como Ghandi e Martin Luther King, faz lembrar a tradição dos grandes movimentos dos anos 1960, que dispensava partidos e sindicatos. Ao invés disso, surgiram novos dispositivos de mobilização e de ação.
Foto: DW/J. Carlos
Espelho D’ Água valoriza as serigrafias
A exposição, que também será posteriormente exibida no Porto (a norte de Portugal), encontra-se no Espaço Espelho D’Água, em Lisboa. A calçada deste espaço, tipicamente portuguesa, foi construída com base numa obra do autodidata artista plástico angolano, Yonamine, que tem vivido em diversos países de África, Europa e América do Sul.