Conferência de Munique: Merkel apela ao multilateralismo
Lusa
16 de fevereiro de 2019
No fórum de política externa e defesa, no sul da Alemanha, Angela Merkel lançou o alerta, este sábado: a "Europa tem inimigos", apontando o dedo à Rússia e à extrema direita norte-americana.
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A chanceler alemã, Angela Merkel, fez estas declarações durante a sua intervenção na Conferência de Segurança de Munique (MSC), um fórum de política externa e defesa, no qual participa também o vice-Presidente dos Estados Unidos, Mike Pence.
A chanceler citou em primeiro lugar a "guerra híbrida dirigida pela Rússia", principalmente contra os países europeus "economicamente mais fracos". Também se referiu ao ex-assessor do presidente dos Estados Unidos Steve Bannon, que fundou um movimento em Bruxelas e está a tentar juntar os movimentos de extrema-direita europeus e partidos de eurocéticos para obterem um bom resultado nas eleições europeias de maio próximo.
"Devemos lutar por essa Europa, pelo multilateralismo e contra todos os que lutam contra a Europa", manifestou.
Irão: Diferenças "táticas" com os EUA
Merkel defendeu ainda a importância de manter o acordo nuclear com o Irão e considerou que as diferenças entre a Europa e os Estados Unidos neste ponto são só "táticas" porque face ao "objetivo" final estão de acordo.
Para Merkel, a pergunta na altura de avaliar a conveniência de acabar ou permanecer no acordo com o Irão é que opção é melhor para conter as aspirações nucleares de Teerão, argumentou.
Merkel considera que é melhor manter o acordo, apesar de rejeitar muitas outras ações do Irão, desde o programa de mísseis balísticos à interferência no Iémen ou à intervenção na guerra da Síria.
A chanceler quis sublinhar as diferenças em relação aos Estados Unidos em relação ao acordo nuclear com o Irão com a Casa Branca de Donald Trump, que decidiu abandonar o acordo que foi trabalhado durante o mandato do predecessor, Barack Obama.
"É uma luta tática" porque em relação aos objetivos a longo prazo a Europa e os Estados Unidos estão de acordo.
China deve juntar-se às negociações
Em relação ao tratado sobre armas nucleares de médio alcance (INF, na sigla em inglês), a chanceler lamentou que a Europa não tenha voz num acordo que agora é recusado pelos Estados Unidos e pela Rússia - pelas "violações durante anos" de Moscovo - e que fundamentalmente mantinha a segurança da Europa.
Neste sentido, Merkel instou a China, apesar das suas "reticências", a juntar-se a um acordo que limite o uso de mísseis de alcance intermédio com capacidade nuclear.
Referindo-se à NATO, Merkel indicou que, mais do que uma "âncora de estabilidade" é uma "comunidade de valores".
A chanceler também abordou a polémica em torno do gasoduto Nord Stream II, que ligará diretamente a Rússia à Alemanha, e que recebeu muitas críticas por parte de outros países europeus.
Merkel argumentou que, se durante a guerra fria já se importava gás da Rússia, a situação atual não é pior em termos geopolíticos e que, no fim de contas, aquele combustível já se estava a trazer desde a Rússia, mas através da Ucrânia.
A chanceler referiu que parte desta polémica se explica pelo facto de Washington querer vender o seu gás na Europa e porque a Ucrânia quer manter as receitas como país de trânsito.
Putin e Merkel: Uma relação de altos e baixos
A relação entre a Rússia e a Alemanha atravessa tempos difíceis. No fim de semana, a chanceler alemã, Angela Merkel, esteve no Azerbaijão à procura de um novo parceiro para reduzir a dependência do gás russo.
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Líderes em ascensão
Em 2002, Angela Merkel era líder do então principal partido da oposição na Alemanha, a União Democrata Cristã (CDU). Putin era o novo Presidente de uma nova e moderna Rússia. Depois de se encontrar com Putin no Kremlin, conta-se que Merkel terá dito aos seus assessores que passou no "teste da KGB" de manter o olhar fixo - uma alusão à carreira anterior de Putin nos serviços secretos soviéticos.
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A nova chanceler
Vladimir Putin construiu uma amizade com o antecessor de Angela Merkel, Gerhard Schröder, que se mantém até hoje. No final de 2005, já era claro que Merkel iria destronar o social-democrata Schröder. Numa conversa com Merkel na Embaixada russa em Berlim, Putin prometeu aumentar os laços entre os dois países. Merkel descreveu o diálogo como "muito aberto".
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Um "ouvido amigo" para Putin
Cerca de um ano depois, Putin partilhou as suas impressões sobre a mulher que se tornou chanceler da Alemanha: "Não nos conhecemos a nível muito pessoal, mas estou impressionado com a sua capacidade de ouvir", disse Vladimir Putin à emissora pública alemã MDR de Dresden, acrescentando que ouvir era uma qualidade rara entre as mulheres na política.
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Quando Merkel conheceu o cão de Putin...
É conhecido o medo que a chanceler alemã tem de cães. No entanto, Putin deixou que o seu cão, Konni, passeasse livremente em Sochi, no local em que recebeu Merkel, em janeiro de 2007. Tentativa de intimidação? Merkel parece pensar que sim. "Acho que o Presidente russo sabia muito bem que eu não estava entusiasmada com a ideia de conhecer o cão dele, mas ainda assim trouxe-o com ele", disse.
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E a liberdade de imprensa?
Em 2012, Vladimir Putin assumiu uma posição mais dura em relação à imprensa e aos dissidentes políticos. Questionada sobre a liberdade de imprensa, quando estava em São Petersburgo, Angela Merkel respondeu: "Se eu ficasse irritada todas as vezes que abro um jornal, não duraria três dias como chanceler".
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Diálogo na idade do gelo
As relações entre Moscovo e o Ocidente pioraram após a anexação da Crimeia, em 2014. No entanto, Putin disse à imprensa alemã que ainda mantinha uma "relação de negócios" com a chanceler alemã. "Eu confio nela. É uma pessoa muito aberta. Ela, como qualquer outra pessoa, está sujeita a certas limitações, mas está a tentar resolver as crises de forma honesta", disse ao jornal alemão "Bild".
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Sem querer ofender, mas...
"Não pretendo insultar ninguém, mas a declaração de Merkel é a explosão de uma raiva acumulada há muito sobre a soberania limitada", disse Putin à imprensa em São Petersburgo, em 2017, comentando um discurso da líder alemã em Munique, durante a campanha eleitoral. Angela Merkel pediu aos europeus que confiassem em si próprios, numa altura de disputas com o Presidente norte-americano, Donald Trump.
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"Temos de conversar um com o outro"
Quando Merkel chegou a Sochi, em 2018, Putin recebeu-a com um ramo de flores. Uma oferta de paz? Um galenteio? Sexismo? A chanceler apareceu depois ao lado de Putin e disse que o diálogo precisava de continuar. "Mesmo que haja graves diferenças de opinião sobre alguns assuntos, temos de conversar um com o outro", disse Merkel.