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ConflitosRepública Democrática do Congo

RDC: Porque é que o cessar-fogo não está a resultar?

Cai Nebe
27 de agosto de 2024

Os combates prosseguem no leste da República Democrática do Congo, apesar de o governo ter acordado, em julho, um cessar-fogo com os rebeldes do M23. O conflito envolve o Ruanda, a SADC e grupos de milícias.

Pessoas reagem após explosão em campo de refugiados em Goma, na RDC, em maio de 2024
Os civis estão a suportar o pior do conflito armado no leste do CongoFoto: Moses Sawasawa/AP Photo/picture alliance

Os confrontos entre as forças governamentais congolesas e o grupo rebelde M23 prosseguem no leste da República Democrática do Congo (RDC). Estão a aproximar-se de áreas densamente povoadas entre o Lago Eduardo e o norte do Lago Kivu, relativamente perto das fronteiras do Ruanda e do Uganda. No domingo, 25 de agosto, alguns relatos sugeriam que o M23 tinha capturado a cidade de Kirumba, um importante centro regional.

O M23 já capturou uma série de cidades, por vezes mesmo sem luta, desde que foi acordado um cessar-fogo em julho passado. Os rebeldes têm acumulado vastas extensões de território desde que reapareceram da dormência em 2021. Acredita-se que o grupo é apoiado militar e logisticamente pelo Ruanda.

"Goma, capital da província de Kivu do Norte, está isolada. Não há forma de nos deslocarmos para o norte, porque o M23 já se apoderou de Nyiragongo", disse à DW o analista político Jack Kahorha, baseado em Goma. Segundo ele, a rota de transporte de alimentos e outros abastecimentos foi interrompida.

Ligações do M23 ao Ruanda

Kinshasa acusa o Ruanda de apoiar cada vez mais abertamente os rebeldes do M23, seja com armas, munições ou pessoal. O Ruanda nega a alegação mas, em fevereiro, admitiu que tem tropas e sistemas de mísseis no leste do Congo para salvaguardar a sua segurança, apontando para uma acumulação de forças congolesas perto da fronteira.

Os rebeldes do M23 estão bem armados e familiarizados com a difícil situação no terreno Foto: Moses Sawasawa/AP Photo/picture alliance

Segundo os observadores, o Ruanda quer exercer influência sobre a vasta região oriental da RDC por razões económicas e de segurança. O território possui recursos naturais importantes, como madeira, minerais raros e ouro. A zona alberga também milícias extremistas hutus, que Kigali acusa de serem responsáveis pelo genocídio de 1994 contra os tutsis.

"Se olharmos para a governação de Kagame desde o início dos anos 1990, vemos que grande parte dela se baseou na construção de uma ideologia em torno de si próprio e na doutrina contra-genocídio, em que Kagame é o 'protetor'", afirma David van Dalen, analista de risco baseado na África do Sul.

Líderes apelam à paz

A instabilidade no leste da RDC, que remonta à década de 1990, quando eclodiu uma complexa guerra regional, provocou tal confusão em termos de segurança que cerca de 120 grupos armados operam na região, através de fronteiras internacionais porosas.

Crianças-soldado são recrutadas de forma desenfreada, proliferam armas de pequeno porte e abundam os relatos de abusos e violações de civis, com atrocidades cometidas alegadamente por todas as partes envolvidas no conflito.

A ONU calcula que os combates tenham levado à fuga de mais de 1,7 milhões de pessoas no Kivu do Norte, elevando o número total de congoleses deslocados por múltiplos conflitos para um recorde de 7,2 milhões.

O Presidente congolês, Felix Tshisekedi, e o seu homólogo ruandês, Paul Kagame, manifestaram o desejo de paz e estabilidade no leste da RDC, mas o comentador Jack Kahorha não está otimista: "Da forma como a situação está a decorrer atualmente, não há esperança de uma solução se não houver um diálogo de paz. Há 30 anos que estamos em guerra. Tornou-se uma crise interminável".

As forças da SADC estão a lutar contra o grupo rebelde M23 desde dezembro de 2023Foto: AUBIN MUKONI/AFP

Presença das forças da SADC

Mas é a atual ofensiva dos rebeldes do M23 e o seu desrespeito ao cessar-fogo que alarma os observadores. Isto apesar do envio de uma missão da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC) para o leste do Congo.

Em dezembro de 2023, a SADC enviou uma força militar para ajudar o governo congolês a expulsar os rebeldes. Até à data, porém, as tropas da SADC não conseguiram travar o M23.

Relativamente às tropas da SADC, o Presidente do Malawi, Lazarus Chakwera, disse em exclusivo à DW que "a paz é um pré-requisito para o desenvolvimento. Quer se trate de guerras por procuração ou de quem tem poder sobre este ou aquele recurso, é uma decisão que tem de ser tomada para garantir a proteção daquelas comunidades" vulneráveis.

Mas a SADC não tem necessariamente forças vocacionadas para a manutenção da paz: "O mandato da missão da SADC é lutar ativamente contra o M23", diz Daniel van Dalen.

"É uma coincidência, talvez não tão coincidente, que os membros que agora contribuem para a força da SADC sejam exatamente os mesmos que fizeram parte da Brigada de Intervenção da Força da ONU em 2012, que basicamente derrotou o M23. Mas estão agora apenas a fazê-lo a título individual."

Com as forças da SADC a enfrentarem efetivamente um representante do Ruanda a pedido do governo congolês (membro da SADC), surgem mais complicações geopolíticas. As forças da SADC e do Ruanda aliaram-se efetivamente, com grande sucesso, para expulsar as forças islamistas no norte de Moçambique.

Mas, de acordo com Van Dalen, a missão militar da SADC no leste da República Democrática do Congo poderá testar a futura cooperação militar. "Não estão a lutar apenas contra um grupo rebelde, estão a lutar contra uma das Forças Armadas mais capazes do continente, através do Ruanda, e contra um grupo rebelde que está a ser equipado com armas avançadas", diz o analista, acrescentando que a falta de apoio aéreo da SADC tem prejudicado a sua eficácia.

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