Parlamento moçambicano aprovou esta segunda-feira uma Lei de Amnistia para afastar a responsabilidade criminal por atos praticados durante a crise militar de 2014-2016. Presidente Nyusi diz que "amnistia é para todos".
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"Nós, moçambicanos, só podemos desenvolver este país sabendo que todos somos um único povo e também perdoando outra pessoa, tolerando, compreendendo", disse esta segunda-feira (29.07) o Presidente Filipe Nyusi, num comício popular em Macossa, província central de Manica, ao comentar a aprovação da Lei de Amnistia.
O chefe de Estado destacou o facto de o Parlamento ter aprovado a lei de forma célere: "As três bancadas viram que os moçambicanos não podem viver com ódio, com inveja. Vamos esquecer o que passou, com o perdão que há para todos nós. Ninguém está a dizer que é só para perdoar as pessoas da RENAMO se existem outras pessoas que não eram da RENAMO e cometeram esses crimes. A amnistia é para todos."
Filipe Nyusi: "A amnistia é para todos"
Filipe Nyusi conversou este domingo (28.07) com o líder da Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), Ossufo Momade, com quem diz ter aprofundado aspetos relacionados com o processo de paz. Indicou ainda que estava previsto para esta segunda-feira o início do registo das forças residuais da RENAMO para posterior desarmamento.
Consolidação da paz efetiva
O projeto de lei de amnistia foi apresentado no Parlamento pelo ministro da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos. Joaquim Veríssimo explicou que esta lei tem como objetivo a consolidação de uma paz efetiva, condição primária para uma convivência sã entre os moçambicanos, a estabilidade política, o desenvolvimento económico harmonioso e a importância da equidade social.
A lei resulta dos entendimentos alcançados há cerca de um ano entre o Governo e a RENAMO, que preveem o desarmamento, desmobilização e reintegração das forças residuais do maior partido da oposição e visa permitir a realização das eleições gerais e provinciais deste ano num clima de paz.
Ao abrigo deste instrumento legal serão amnistiados os cidadãos que tenham cometido crimes no contexto das hostilidades militares, no período compreendido entre agosto de 2014 e 24 de dezembro de 2016, quando foi declarada a cessação das hostilidades político-militares, indicou o governante.
Moçambique: Um ano após a morte de Afonso Dhlakama
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Abrangidos estão "crimes contra a segurança do Estado, crimes militares e conexos, crimes contra a segurança exterior e interior do Estado, crimes contra a ordem e segurança públicas e crimes cometidos contra pessoas e contra propriedade, no âmbito das hostilidades militares ou conexas", segundo Veríssimo.
Debate consensual
O debate do projeto de lei de amnistia no Parlamento foi marcado por consensos quanto à pertinência da aprovação do documento. "A Lei de Amnistia cria as bases necessárias para a assinatura de um acordo de cessação definitiva das hostilidades militares com vista ao alcance de uma paz definitiva e duradoura", considerou Sérgio Pantie, deputado da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO).
"Dada a pertinência que este instrumento representa, considero a presente proposta oportuna, pelo que recomendo a todos os deputados meus pares para uma apreciação positiva", afirmou também o deputado da RENAMO Ezequiel Gusse.
Já o deputado Armando Artur, do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), a terceira bancada parlamentar, lembrou que, "quando o legislador nacional, que é todo o povo moçambicano, previu a concessão da amnistia, fê-lo pensando na fragilidade humana, na precariedade da existência e, acima de tudo, na primazia do interesse nacional sobre todas as coisas."
Moçambique: Guerra civil com pausas de paz
A paz nunca foi uma certeza em Moçambique. Ela apenas tem intercalado confrontos militares desde a independência. Acordos de paz mal concebidos parecem estar na origem dos conflitos. Mas há novos bons sinais à vista.
Foto: Presidencia da Republica de Mocambique
O começo da guerra civil
A guerra entre o Governo da FRELIMO e a RENAMO começou em 1977, isso cerca de dois anos após a proclamação da independência do país. A RENAMO contestava a governação da FRELIMo e queria democracia. Este movimento tinha o apoio da ex-Rodésia e da África do Sul, dois vizinhos de Moçambique. A guerra matou milhões de moçambicanos e quase paralisou a economia do país.
Acabar com a guerra era o obetivo deste acordo, alcançado em 1984. Foi assinado entre os antigos Presidentes de Moçambique e da África do Sul, Samora Machel e Peter Botha, respetivamente. Ficou acordado que Pretória deixava de apoiar a RENAMO e Maputo parava o apoio ao ANC. Este último que lutava contra o Apartheid. Mas ninguém respeitou o acordo.
Foto: Avant Verlag/Birgit Weyhe
Acordo Geral de Paz de Roma
Colocou finalmente fim a guerra em 1992. Foi patrocinado pela Comunidade Santo Egídio, instituição católica italiana. Nessa altura o país já estava devastado e tinha transitado do sistema socialista para o da economia de mercado. Afosno Dhlakama, líder da RENAMO, e Joaquim Chissano, ex-Presidene de Moçambique, assinaram um acordo que pôs fim a uma guerra de 16 anos.
Eleições: nova era de desentendimentos
Em 1994 o país dava os seus primeiros passos rumo a democracia: início do multipartidarismo e realização das primeiras eleições, patrocinadas pela ONU. O primeiro Presidente eleito do país foi Joaquim Chissano. A RENAMO contestou, mas acabou por aceitar os resultados eleitorais.
Foto: Getty Images/AFP/Gianluigi Guercia
Eleições 1999: RENAMO revolta-se
Nas segundas eleições, em 1999, Joaquim Chissano e a FRELIMO voltaram a ganhar. Mas o processo foi novamente marcado por graves irregularidades, a RENAMO diz que houve fraude e contestou com mais veemência. E no ano 2000 apoiantes da RENAMO manifestaram-se em Montepuez província de Cabo Delgado, contra os resultados. Cerca de 700 manifestantes terão sido detidos e mortos por asfixia nas celas.
Foto: Marc Dietrich-Fotolia.com
Rastilho para o barril de pólvora já arde
As sucessivas irregularidades nas eleições, a lei eleitoral desajustada e difícil integração dos ex-guerrilheiros da RENAMO no exército nacional foram os principais pontos que aumentaram a tensão com o Governo. A falta de confiança que caracteriza a relação entre as partes aumentou.
Foto: Gerald Henzinger
As armas falam novamente
Em 2013 a polícia e homens da RENAMO confrontaram-se. Era o início dos conflitos armados. Nesse ano a RENAMO recusa a aprovação da Lei Eleitoral e não participa nas autárquicas. Há um interregno no conflito para a realização de eleições gerais em 2014. A RENAMO perde e acusa a FRELIMO de fraude. O país volta a ser palco de guerra. RENAMO exige governar as seis províncias onde diz ter ganho.
Foto: Fernando Veloso
Guebuza e Dhlakama: o braço de ferro até ao fim
Em setembro de 2014 o Presidente Armando Guebuza e o líder da RENAMO chegam a acordo para por fim ao conflito armado. Abriu-se assim caminho para as eleições gerais, onde a RENAMO participou. Mas as negociações entre os dois homens nunca foram fáceis. Para começar os encontros foram poucos.
Foto: Jinty Jackson/AFP/Getty Images
Na guerra vale tudo
Em Setembro de 2015 Dhlakama sofreu dois atentados. Um deles contra a coluna em que viajava, de Manica a Nampula. Afonso Dhlakama saiu ileso, mas segundo relatos morreram várias pessoas. Mais tarde várias viaturas da comitiva do líder da RENAMO foram queimadas. Dhlakama acusou a FRELIMO pelos atentados.
Foto: DW/A. Sebastião
Cerco a casa de Afonso Dhlakama
Em outubro de 2015 a guarda pessoal do líder da RENAMO foi desarmada pelas forças governamentais durante um cerco à sua residência na cidade da Beira. O Governo pretendia um desarmamento forçado dos homens da RENAMO. O desarmamento da maior força da oposição é um dos pontos controversos nas negociações de paz.
Foto: picture-alliance/dpa/A. Catueira
Diálogo de paz pouco frutífero
Infindáveis rondas marcaram as negociações de paz. E em paralelo as armas falavam nas matas, membros da RENAMO eram assassinados a média de um por mês em 2016. Observadores e mediadores, nacionais e internacionais, entraram e saíram do barulho sem conseguir muito. Houve também adiamentos de rondas e algumas pausas no processo.
Foto: Leonel Matias
Dhlakama e Nyusi: maior proximidade, bons sinais
Em agosto de 2017 o Presidente Nyusi deslocou-se à Gorongosa, bastião da RENAMO, para se encontrar com Dhlakama. Os dois líderes acordaram sobre os próximos passos no processo de paz. Esperavam um acordo de paz até ao final de 2017, mas tal não deverá acontecer. Entretanto, Dhlakama está satisfeito com o andamento das negociações. O sigilo entre os dois parece ser o segredo de um bom entendimento.