A capital moçambicana foi esta sexta-feira palco de protestos de vendedores informais, que não querem sair dos passeios onde trabalham. A polícia foi chamada a intervir e disparou gás lacrimogéneo e balas de borracha.
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A baixa da cidade de Maputo, a zona comercial da capital de Moçambique, acordou esta sexta-feira (13.03) debaixo de protestos de vendedores informais. Os comerciantes recusam-se a aceitar a ordem de retirada dos passeios, dada pelo Conselho Autárquico de Maputo há seis meses.
Os manifestantes bloquearam as ruas e avenidas da baixa da capital e partiram vidros de algumas lojas. O comércio esteve encerrado toda a manhã e foi impedida a circulação de viaturas.
A polícia de intervenção rápida foi chamada ao local para repor a ordem e disparou gás lacrimogéneo e balas de borracha. A polícia também teve de retirar as barricadas montadas pelos manifestantes logo nas primeiras horas da manhã.
Confrontos entre vendedores informais e polícia em Maputo
A vendedora informal Maria Rafael trabalha na baixa da capital e não esconde a sua frustração com a atitude do município de Maputo.
"Estamos a ser retirados dos passeios e não sabemos para onde vamos. Primeiro, deve construir um mercado para nos mostrar que está aqui", sugere.
O vendedor Carlos Zacarias disse que exerce a atividade informal na baixa desde 1993, quando o governo autárquico começou a fazer promessas de determinar o espaço para os vendedores informais. Mas isso nunca aconteceu: "Nunca o governo fez alguma coisa por nós. Agora estão a retirar as pessoas. Com esta situação, o que vão fazer as pessoas para suportar as suas despesas?"
Vendedores exigem mercados para sair dos passeios
Ricardo Carlos, outro vendedor informal, diz que a condição para saírem dos passeios passa pela construção de mercados que alberguem todos os informais. "Os mercados estão cheios. Ouvi dizer que deviam sair para Xiqueleni [um dos maiores mercados informais de Maputo] ou ir para o mercado grossista [do Zimpeto]. Mas são locais que já estão preenchidos", lembra.
Os vendedores informais lamentam a atitude do município, que diariamente cobra uma taxa de ocupação do espaço num valor correspondente a 0,6 cêntimos de euro.
Para tentar solucionar o problema, houve uma reunião entre o município e os vendedores informais, da qual saiu a promessa do executivo de Eneas Comiche de arranjar um espaço para o exercício da atividade.
O vereador da Economia Local no Conselho Autárquico de Maputo, João Munguambe, disse que os vendedores informais concordaram retirar-se dos passeios. "Estamos a trabalhar com a liderança dos informais para mostrar os locais nos mercados e mostrar outros lugares que possam acomodar maior número de vendedores", assegura.
O município prometeu analisar o pedido feito pelos informais que querem mais tempo para preparar a sua retirada dos passeios. "Este pedido é legítimo, na medida em que eles não têm conhecimento do trabalho que já se iniciou com as suas lideranças. De qualquer forma, a nossa responsabilidade neste encontro era auscultar e ouvir as preocupações", diz.
Impacto da crise na vida dos moçambicanos
Trabalhadores em Maputo relatam as dificuldades que enfrentam todos os dias, com o país mergulhado numa crise financeira. Alguns ainda conseguem pequenos lucros, enquanto outros tentam estratégias para atrair clientes.
Foto: DW/Romeu da Silva
Novos tempos, menos lucros
Ana Mabonze tem uma loja de gelados há pouco mais de sete anos e diz que os rendimentos não têm sido bons ultimamente. Por dia, lucra apenas o equivalente a cerca de dois euros. O negócio é feito na ponte cais, também conhecida por Travessia. Nestes dias, os lucros baixaram porque os automobilistas que iam de ferryboat para Katembe agora usam a nova ponte.
Foto: DW/Romeu da Silva
"Boa cena"
O negócio de transferência de dinheiro por telefone conhecido por Mpesa está a alimentar muitas famílias. É o caso de Angélica Langane, que na sua banca "Boa Cena" diz ter clientes frequentemente, porque muitos estão preocupados em transferir dinheiro, seja para pagar dívidas, fazer compras ou apenas para ter a sua conta em dia.
Foto: DW/Romeu da Silva
O dinheiro não aparece
Numa das ruas de Maputo também encontramos Dulce Massingue, que montou a sua banca de venda de fruta. Para ela, este negócio não está a dar lucros. Diz que o pouco que ganha apenas serve para pagar o seu transporte. Nestes dias de crise, Dulce pensa em mudar de negócio, mas tudo depende do dinheiro que não aparece.
Foto: DW/Romeu da Silva
Trabalhar para pagar o transporte?
O trabalho de Jorge Andicene é recolher garrafas plásticas para serem recicladas pelos chineses. Sem ter revelado quanto ganha por este negócio, Jorge diz que não chega a ser bom, porque o mercado está muito apertado. Os preços de vários produtos subiram, por isso também os lucros são apenas para pagar o transporte.
Foto: DW/Romeu da Silva
"As pessoas comem menos na rua"
A dona desta barraca não quis ser identificada, mas confessa que por estes dias o negócio baixou bastante. Vende hambúrgueres e sandes. As pessoas agora preferem trazer as suas refeições de casa para poupar dinheiro, diz. O negócio rende-lhe por dia o equivalente a dois euros, dinheiro que também deve servir para comprar outros bens para as crianças.
Foto: DW/Romeu da Silva
Costureira também não vê lucros
O arranjo de roupas é outro negócio pouco rentável, mesmo nos tempos das "vacas gordas". É oneroso transportar todos os dias esta máquina, por isso Maria de Fátima decidiu ficar num dos armazéns na cidade de Maputo, pagando um determinado valor. São poucos os clientes que a procuram para arranjar as suas roupas.
Foto: DW/Romeu da Silva
Negócio já foi mais próspero
Um dos negócios que tinha tendência de prosperar na capital era a venda de acessórios de telefones. Mas como há muitas pessoas que fazem este negócio, a procura agora é menor e o lucro baixou muito. O que salva um pouco estes empreendedores é o facto de cada dia haver novos tipos de telefones.
Foto: DW/Romeu da Silva
Poder de compra reduzido
Nesta oficina trabalham jovens mecânicos especializados na reparação de radiadores. Não quiseram ser identificados, mas afirmam que durante anos este negócio lhes rendia algum dinheiro para pagar a escola. Mas com a crise que se vive agora, a situação agravou-se. São poucos os clientes que os procuram e alegam que muitos moçambicanos perderam poder de compra.
Foto: DW/Romeu da Silva
Nada de brilho
O negócio de engraxador é outro que já não está a render, segundo os profissionais. Os únicos indivíduos que os procuram são estrangeiros de origem europeia, sobretudo portugueses. Os nacionais, diz Sebastião Nhampossa, preferem fazer o serviço por conta própria em casa. Com esta crise, é normal os engraxadores serem visitados apenas por um ou dois clientes por dia.
Foto: DW/Romeu da Silva
Estratégias para atrair o cliente
Quando as atividades da Inspeção Nacional das Atividades Económicas (INAE) trouxeram à tona a real situação de higiene nos restaurantes, muitos cidadãos passaram a não frequentar estes locais. Como forma de deleitar a clientela, o dono deste pequeno restaurante promove música ao vivo de cantores da velha guarda e ten uma sala de televisão para assistir a jogos de futebol.