Confrontos fazem 37 mortos na República Centro-Africana
AFP | Lusa | Reuters | nn
17 de novembro de 2018
Confrontos entre grupos armados em Alindao, no centro-sul da República Centro-Africana (RCA), provocaram pelo menos 37 mortos, segundo um relatório interno da ONU a que a agência France-Presse teve acesso.
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Um balanço anterior dava conta da existência de sete mortos, entre os quais um padre, resultantes de combates entre milicianos antibalaka e do grupo União para a Paz na República Centro-Africana (UPC, na sigla em francês). "Na quinta-feira de manhã, os antibalaka mataram pessoas de fé muçulmana. Uma hora mais tarde, a UPC ripostou em ataque a um campo de deslocados", especificou o porta-voz da missão da Organização das Nações Unidas (ONU) no país (MINUSCA, na sigla em inglês), Vladimir Monteiro, em declarações à agência France-Presse (AFP).
Um padre foi morto durante estes confrontos e um outro está desaparecido, adiantou uma fonte religiosa em Bangui. A igreja de Alindao e uma parte do campo de deslocados que está na localidade foram incendiados, acrescentou a fonte da ONU. "Parte da população fugiu para a floresta. Centenas de deslocados refugiaram-se no posto militar avançado da MINUSCA", indicou Monteiro.
"Muito cedo, durante a manhã, numerosos habitantes de Alindao, em fuga dos combates, chegaram a Kongbo", declarou à mesma agência Michel Asebatcha, um notável desta localidade situada a 40 quilómetros de Alindao, na estrada para Bangassou.
Situação humanitária "desastrosa”
Durante muito tempo base da UPC (um dos principais grupos armados da ex-coligação Séléka, dirigido por Ali Darassa), Alindao tem sido palco de confrontos entre grupos armados nos últimos meses. Nesta vila charneira no centro do país, na principal estrada que conduz ao sudeste da RCA, um trabalhador humanitário foi morto no início de agosto e há seis meses foram mortos dois 'capacetes azuis'.
No início de setembro, a ONU tinha alertado para a situação humanitária "desastrosa" que aqui prevalecia, afirmando que Alindao estava "sob o controlo de grupos armados, reduzindo a nada o papel das autoridades locais".
Portugal participa na MINUSCA, comandada pelo tenente-general senegalês Balla Keita, que já classificou as forças portuguesas como os seus 'Ronaldos'. "Ronaldo é o melhor jogador do mundo e quando as nossas tropas são classificadas de 'Ronaldos' isso tem uma leitura muito clara. Sentimos orgulho pela forma como o seu trabalho é reconhecido", disse o ministro da Defesa Nacional, João Gomes Cravinho, à agência Lusa.
Portugal também integra e lidera a Missão Europeia de Treino Militar-República Centro-Africana (EUMT-RCA), comandada pelo brigadeiro-general Hermínio Teodoro Maio. A EUTM-RCA, que está empenhada na reconstrução das forças armadas do país, tem 45 militares portugueses, entre os 170 de 11 nacionalidades que a compõem.
Há 5 anos em guerra
A República Centro-Africana caiu no caos e na violência em 2013, depois do derrube do ex-Presidente François Bozizé por vários grupos juntos na designada Séléka (que significa coligação na língua franca local), o que suscitou a oposição de outras milícias, agrupadas sob a designação anti-Balaka.
O conflito neste país, com o tamanho da França e uma população que é menos de metade da portuguesa (4,6 milhões), já provocou 700 mil deslocados e 570 mil refugiados, e colocou 2,5 milhões de pessoas a necessitarem de ajuda humanitária.
O Governo do Presidente, Faustin-Archange Touadéra, um antigo primeiro-ministro que venceu as presidenciais de 2016, controla cerca de um quinto do território.
O resto é dividido por 18 milícias que, na sua maioria, procuram obter dinheiro através de raptos, extorsão, bloqueio de vias de comunicação, recursos minerais (diamantes e ouro, entre outros), roubo de gado e abate de elefantes para venda de marfim.
Fuga e sofrimento na República Centro-Africana
Desde o golpe de Estado, há um ano, a situação na República Centro-Africana está fora de controle. Aqueles que podem, fogem. Aqueles que permanecem, lutam todos os dias pela sobrevivência.
Foto: Kriesch/Scholz/DW
Refúgio no aeroporto de Bangui
Desde o golpe de Estado, há um ano, a situação na República Centro-Africana está fora de controle. Milícias cristãs e muçulmanas promovem amargos combates. Um milhão de pessoas estão em fuga. Quase todos os muçulmanos deixaram a capital, Bangui. Entre os que permaneceram, algumas centenas encontram abrigo num velho hangar do aeroporto.
Foto: Kriesch/Scholz/DW
Perder tudo
O marido de Jamal Ahmed tinha guardado dinheiro suficiente para a fuga de sua família, quando as milícias cristãs chamadas "Anti-Balaka" invadiram sua aldeia natal. As poucas economias não foram suficientes - ele pagou com a vida. Jamal Ahmed vive no acampamento que surgiu no aeroporto: "Não conheço ninguém aqui. Não tenho mais nada. Não sei como será daqui para a frente.”
Foto: Kriesch/Scholz/DW
Ver os netos mais uma vez
Aos 84 anos, Fatu Abduleimann está entre os moradores de idade mais avançada do campo de refugiados do aeroporto. Nas últimas décadas, Fatu assistiu a muitas dificuldades em sua terra natal. Mas nunca foi tão ruim quanto agora, diz a idosa. Seu único consolo: a maioria dos seus filhos conseguiu fugir para o Chade. Seu maior desejo: "ver os meus netos mais uma vez."
Foto: Kriesch/Scholz/DW
Quilómetro Cinco, uma cidade fantasma
Exceto o acampamento de refugiados no aeroporto, quase todos os muçulmanos deixaram a cidade. Há alguns meses, o chamado "Quilómetro Cinco" era um animado centro da comunidade muçulmana. Mais de 100.000 pessoas moravam e trabalhavam aqui, a cinco quilómetros do centro da capital, Bangui. Agora, restaram apenas algumas centenas de pessoas. As lojas estão fechadas até nova ordem.
Foto: Kriesch/Scholz/DW
Esperar o momento certo
Quase todos os muçulmanos que ainda restam no "Quilómetro Cinco" querem apenas uma coisa: sair daqui. Os caminhões para a fuga estão prontos. Eles esperam que um comboio tenha como destino os países vizinhos como os Camarões ou o Chade.
Foto: Kriesch/Scholz/DW
A cidade de campos de refugiados
Não apenas os muçulmanos temem por suas vidas. Por toda a cidade de Bangui pode-se encontrar acampamentos provisórios em que a maioria da população, cristãos e animistas, procura proteção - por medo de um retorno das milícias islamistas ou simplesmente porque não têm o que comer - e espera por doações de alimentos.
Foto: Kriesch/Scholz/DW
Ajuda sobrecarregada
O Pastor David Bendima recebeu, na sua igreja, mais de 40 mil pessoas que fugiram dos combates no centro da cidade. Mas ele também não pode garantir-lhes segurança suficiente. "Todas as noites ouvimos tiros e granadas explodindo. As pessoas estão com muito medo", diz o pastor. Ele parece cansado.
Foto: Kriesch/Scholz/DW
Últimas reservas
Chancella Damzousse, de 16 anos, vive em uma aldeia a meia hora de distância de Bangui. Ela prepara o jantar. "Tudo o que resta são alguns grãos de feijão e um pouco de gergelim", diz a jovem. 15 pessoas terão que se satisfazer com a refeição. Desde que milícias muçulmanas destruíram o lugar há alguns meses e mataram muitos cristãos, a família de Chancella recebeu vários vizinhos.
Foto: Kriesch/Scholz/DW
Vítimas, autores, centinelas
Ao lado da casa de Chancella, há um guarda da milícia Anti-Balaka. Os amuletos em seu corpo o tornam invulnerável contra balas, explica ele. A milícia tomou o controle da região. Seu trabalho é proteger os moradores da aldeia do ataque de outros rebeldes. No entanto, a sua proteção aplica-se apenas aos cristãos - há muito tempo os muçulmanos deixaram o local ou foram mortos.
Foto: Kriesch/Scholz/DW
Presença internacional
Sete mil soldados da União Africana e da França têm a responsabilidade de garantir a segurança no país dilacerado. A situação humanitária está piorando a cada dia, no entanto. Em 1 de abril, a União Europeia lançou oficialmente a sua operação militar na República Centro-Africana, com um contingente de até mil homens para reforçar as tropas francesas e africanas por um período de até seis meses.