Construção de quebra-mar cria polémica em Cabo Verde
16 de agosto de 2013 O projecto de impacto ambiental apresentado pelo grupo privado Resort Group para a construção de esporões na praia da Baía do Algodoeiro, foi avaliado e aprovado recentemente pelos organismos públicos (em particular pela Direcção Geral do Ambiente, Instituto Marítimo e Portuário de Cabo Verde, Instituto Nacional de Desenvolvimento das Pescas (INDP) e Direcção do Turismo e Câmara Municipal do Sal).
“Não há grande impacto na circulação das tartarugas marinhas naquela área, até porque aquela zona não é a zona principal de nidificação das tartarugas na ilha do Sal. Portanto, o impacto sobre as tartarugas existe mas é preciso relativizar”, justifica Moisés Borges, Director Geral do Ambiente.
O responsável argumenta ainda: “Nós fazemos uma análise criteriosa, trabalhamos com base em considerações técnicas consistentes e por conseguinte [a decisão] tem que se basear em factos técnicos e em argumentos científicos”, sustenta Moisés Borges.
Medidas de compensação
O executivo cabo-verdiano afirma que está ciente quanto a um ou outro impacto ambiental. Todavia, o grupo privado, dono do projeto da construção do quebra-mar, deverá implementar medidas compensatórias para minimizar esses impactos ambientais.
De acordo com Moisés Borges, Director Geral do Ambiente, “foi exigido que a empresa crie ninhos para a transladação dos ovos das tartarugas que forem colocados em lugares mais vulneráveis. Os ovos deverão ser acondicionados nos tais ninhos”.
Será necessário, por conseguinte, “fazer o seguimento e assegurar que as medidas compensatórias são, de facto, implementadas e que os impactos são minimizados, dentro das possibilidades”, acrescenta Moisés Borges.
Postos de trabalho assegurados
Para além de questões de cariz ambiental foram também analisados económicos e sociais.
Segundo o Director Geral do Ambiente, “o grupo que está a propor a obra é um grupo que tem na sua dependência cerca de 1.400 postos de trabalho. A infraestrutura [o quebra-mar] vai permitir a continuidade desses postos de trabalho, o que também teve o seu peso na tomada de decisão” de aprovar o projeto.
Moisés Borges afirma que há um outro impacto a considerar: já que a praia da Baía do Algodoeiro não tem condições para banho, com a "construção dos esporões passará a haver condições para as pessoas usufruírem de mais uma praia na ilha do Sal", defende.
Ambientalistas apontam críticas
Todavia os ambientalistas têm outra opinião. Alberto Taxonera, da Organização Não Governamental (ONG) SOS Tartarugas, na ilha do Sal, afirma que “o impacto ambiental vai ser muito mais elevado” do que o estimado pelo grupo privado responsável pelo projeto de construção do quebra-mar.
O ambientalista duvida também das medidas compensatórias impostas pelas instituições governamentais ao Resort Group: o projeto aprovado “não tem nenhum tipo de técnica para ajudar a preservar a desova das tartarugas. A única estratégia a seguir para diminuir o impacto é deixar a praia o mais natural possível sem quebra-mar e sem poluição luminosa”, diz Alberto Taxonera.
Contrariando o Director Geral do Ambiente, o ambientalista da SOS Tartarugas assegura: “a Baía do Algodoeiro é ainda uma das principais praias de desova das tartarugas marinhas. Tem um fundo com bastantes corais. E também alberga uma população juvenil de espécies de tartarugas marinhas que vão ali para se alimentarem”.
Alberto Taxonera concorda com o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) apresentado, quando este afirma que a construção dos esporões na Baía vai facilitar o aparecimento de novas espécies e de um viveiro de peixes. Contudo, "isso poderá demorar algum tempo", prevê o ambientalista.
Enquanto isso, muitas outras espécies serão negativamente afetadas. A primeira delas é a tartaruga cabeçuda, a única que está a nidificar nas praias de Cabo Verde, porque vai perder o local onde podia desovar.
Depois, afetará a natureza do fundo coralino, que poderá vir a desaparecer, e que atualmente dá para alimentar outras espécies de tartarugas, como a tartaruga verde e a de casco levantado. Haverá também consequências negativas a nível da movimentação de areias. “Se for ali construído o quebra-mar, deixará parte da praia sem areia”, teme Alberto Taxonera.
Além das tartarugas, a praia é um viveiro para peixes, há aves que se alimentam na praia. A construção do quebra-mar poderá, portanto, pôr em risco toda a biodiversidade, alerta Alberto Taxonera, da SOS Tartarugas.
Inverdades do projeto
O objectivo do quebra-mar, realça Alberto Taxonera, é apenas melhorar as condições balneárias, em particular, para as pessoas que frequentam os hotéis da região.
Sobre a criação de empregos na localidade, o ambientalista afirma que esses empregos vão ser para poucas pessoas e que serão de curta duração. Nesse sentido, as tartarugas marinhas, o meio natural e a biodiversidade "estão a dar mais meio de trabalho às pessoas da localidade do que qualquer tipo de construção", advoga Alberto Taxonera da SOS Tartarugas.
Aquela ONG já divulgou um contra estudo que apresenta, alegadamente, todas as inverdades que tem o EIA e todos os impactos que esses esporões podem causar a nível de biodiversidade.
A SOS Tartarugas conta com o apoio de outras entidades para outros estudos e tem procurado ajuda junto de juristas internacionais para apoiarem a causa. A organização argumenta que o processo da aprovação do projecto não foi muito claro e que não terá recebido toda a informação que deveria ser pública.
A apresentação do estudo tem poucos dados exatos sobre as dimensões e a localização do quebra-mar. Mas Alberto Taxonera acredita que não irá ocupar uma grande extensão da praia da Baía do Algodoeiro.
Há menos tartarugas na ilha do Sal
O número de tartarugas nas praias da ilha do Sal tem diminuído, muito em parte devido à construção de hotéis e do desenvolvimento turístico na ilha, segundo o ambientalista.
No entanto, a Baía do Algodoeiro ainda é muito frequentada por varias espécies de tartarugas. Por isso, a organização SOS Tartarugas quer proteger todas as espécies que procuram aquele local para nidificar.
Com o aumento da pressão, as tartarugas poderão ter que mudar de praia ou de ilha. Todavia, nas outras ilhas de Cabo Verde a qualidade das praias para as tartarugas é menor, as condições climáticas são menos favoráveis e há mais caçadores, sustenta o ambientalista Alberto Taxonera.
Recorde-se que o arquipélago de Cabo Verde está em plena época de desova das tartarugas, que começou a 1 de julho e prolonga-se até meados de outubro, seguido do período dos nascimentos que vai até finais de Dezembro. Em 2012, a Direcção Geral do Ambiente contabilizou um total de 29 mil ninhos de desova de tartarugas nas praias de Cabo Verde, e espera para o corrente ano o mesmo resultado.
Segundo os especialistas , uma tartaruga desova em média 5,2 vezes em cada temporada, daí que se estime que durante o ano 2012, 4.307 tartarugas visitaram as praias de Cabo Verde para desova.