Corrupção causa prejuízos de milhões aos cofres do Niassa
Conceição Matende
2 de maio de 2023
Niassa perdeu mais de 108 milhões de meticais em atos de corrupção, segundo Gabinete Provincial de Combate à Corrupção. Setores da Saúde e Educação e Ministério do Interior foram os que mais lesaram os cofres do Estado.
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O Gabinete Provincial de Combate à Corrupção do Niassa, no norte de Moçambique, diz que a província perdeu mais de 108 milhões de meticais (mais de um milhão e meio de euros) em atos de corrupção, resultante de 74 processos que deram entrada na instituição.
Trata-se de processos-crime ligados a atos de corrupção passiva, ativa e peculato que tramitaram durante os pouco mais de três meses de funcionamento do órgão, com destaque para os setores da Saúde, Educação e a Polícia no Niassa.
A informação foi avançada na cidade de Lichinga pelo diretor provincial do Gabinete de Combate à Corrupção no Niassa, João Chaua, durante a sua primeira conferência de imprensa após a instalação daquele órgão da administração da Justiça na província.
João Chaua: "Os envolvidos nos atos criminais atuaram de diversas formas"
Subornos e pagamentos indevidos
Segundo o responsável, "os envolvidos nos atos criminais atuaram de diversas formas", destacando-se "o pagamento de valores monetários a título de suborno a agentes reguladores de trânsito para não emissão de avisos de multa".
Foram também descobertos casos de "solicitação ou recebimento de valores monetários em troca de prestação de serviços no setor público, solicitação e recebimento de dinheiro não devido mediante promessas de emprego na Função Pública", além da "retirada de dinheiro para pagamento indevido de ajudas de custo, cuja actividades não estavam programadas."
João Chaua destacou ainda um dos processos, relativo a "suspeitas de práticas do crime de peculato, corrupção passiva para ato ilícito e abuso de cargo" por parte de funcionários do Conselho Municipal de Lichinga "indiciados, por via de concurso público, de terem adjudicado a favor de uma empresa, supostamente das suas relações, a aquisição de uma viatura protocolar, no valor de aproximadamente oito milhões e 900 mil meticais".
Este processo está agora na fase de instrução, decorrendo neste momento a recolha de provas, revelou ainda o diretor provincial do Gabinete de Combate à Corrupção no Niassa.
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Governo mal preparado
Membros da sociedade civil na província de Niassa dizem que o governo não está preparado para combater a corrupção. Segundo Víctor Maulana, membro da Associação Amigos da Criança de Boa Esperança, não existem condições nos setores onde mais se praticam os atos de corrupção.
"Isso tem-se verificado muito mais na questão de procura de oportunidades de emprego e como a Saúde, a Educação assim como o Ministério do Interior são os setores que mais movimentam pessoas em massa, isso faz com que o pessoal desse setor se aproveite e burle as pessoas. Algumas pessoas já pagaram vagas e não tiveram a devida vaga", critica Víctor Maulana.
"Estamos a ver o que está a acontecer no nosso país, em que um funcionário fica três a quatro meses sem salário. O que esse funcionário estará a pensar fazer é corromper pessoas vulneráveis, aproveitando-se da vulnerabilidade que existe dentro do seu setor", exemplifica.
Maxixe: Obras sem qualidade são adjudicadas por milhões
Em Maxixe, Moçambique, somam-se os casos de obras públicas sobrefaturadas. A DW África juntou exemplos de obras cujo processo de adjudicação não foi transparente e nas quais os orçamentos foram inflacionados.
Foto: DW/L. da Conceição
Favorecimento na seleção das empresas
Em Maxixe, parte das obras de construção civil têm sido adjudicadas à empresa SGI Construções Lda. que não se encontra registada no Boletim da República e que apenas tem escritórios em Maputo. A empresa, com laços fortes com o Presidente do município, Simão Rafael, faturou, nos últimos dois anos, mais de 30 milhões de meticais (cerca de 427 mil euros) em obras que até hoje ainda não terminaram.
Foto: DW/L. da Conceição
Falta de transparência
Como se vê na imagem, para além de não se saber a data do início desta obra, não se conhece o fiscal nem a distância exata para a colocação de pavés. Sabe-se apenas que tem um prazo de execução de 90 dias.
Foto: DW/L. da Conceição
Figuras ligadas à FRELIMO criam empresa
Esta obra, orçada em mais de sete milhões de meticais, foi adjudicada à MACROLHO Lda, uma empresa com sede em Inhambane e que tem, segundo a imprensa local, participações de sócios ligados ao partido FRELIMO, como o ex-governador de Inhambane, Agostinho Trinta. Faturou, nos últimos dois anos, mais de 40 milhões de meticais em obras que, até agora, ainda não foram entregues. O prazo já expirou.
Foto: DW/L. da Conceição
Obras faturadas e abandonadas
Esta via é a entrada do bairro Eduardo Mondlane. Desde 2016, o munícipio já gastou na reparação desta estrada - com cerca de 200 metros -, mais de quatro milhões de meticais. Até à data, apenas foram executados 150 metros. Ao que a DW África apurou, o empreiteiro apenas trabalha nos dias de fiscalização dos membros da assembleia municipal. O dinheiro faturado dava para pavimentar mais de 1 km.
Foto: DW/L. da Conceição
Obras sobrefaturadas
Este é o estado atual de várias obras na cidade de Maxixe. Na imagem, a via do prolongamento da padaria Chambone, foi faturada em mais de cinco milhões de meticais (cerca de 71 mil euros) no ano de 2016. No entanto, esta mesma obra voltou a ser faturada este ano, não tendo o valor sido tornado público.
Foto: DW/L. da Conceição
Obras sem qualidade
Desde o ano de 2015, o conselho municipal da cidade de Maxixe já gastou mais de 10 milhões de meticais (cerca de 142 mil euros) com as obras de reparação de buracos nas avenidas e ruas do centro da cidade. No entanto, o trabalho não tem qualidade e os buracos continuam a danificar carros ligeiros. O empreiteiro desta obra é também a SGI Construções Lda.
Foto: DW/L. da Conceição
MDM denuncia corrupção
A bancada do MDM na assembleia municipal de Maxixe denunciou que as viaturas adquiridas pela edilidade não estão a ser compradas em agências, mas no mercado negro em África do Sul. Diz a oposição que as últimas duas viaturas adquiridas custaram mais de sete milhões de meticais. Um preço quatro vezes superior, quando comparado ao valor das duas viaturas no mercado em Moçambique.
Foto: DW/L. da Conceição
“Não interessa qualidade, queremos faturar”
Jacinto Chaúque, ex-vereador do município de Maxixe, está a ser investigado pelo Gabinete de Combate à Corrupção de Moçambique. Da investigação consta, entre outros, uma gravação telefónica entre Chaúque e o empreiteiro desta obra, na avenida Ngungunhane, e em que o ex-vereador afirma que “não interessa a qualidade. Queremos faturar nestas obras”. Chaúque está a aguardar julgamento.
Foto: DW/L. da Conceição
Preços altos nas construções de edifícios
Em 2015, o conselho municipal de Maxixe construiu um posto policial no bairro de Mabil. Esta infraestrutura - com apenas dois quartos, uma sala comum e uma cela com capacidade para cinco pessoas – custou mais de 1,3 milhões de meticais, não contando com a aquisição de material como mesas ou cadeiras. Ao que a DW África apurou junto do mercado, esta obra não custaria mais de 300 mil meticais.
Foto: DW/L. da Conceição
Um milhão de meticais por cada sede do bairro
As sedes dos bairros são outro exemplo. Todas as sedes dos bairros construídas pelo conselho municipal contam com a mesma planta. Cada uma custou cerca de um milhão de meticais (cerca de 14 mil euros). O preço real de mercado para uma casa tipo dois, sem mobília de escritório, é de cerca de 300 meticais.
Foto: DW/L. da Conceição
Empreiteiro exige dinheiro de volta
O empreiteiro Ricardo António José reclamou, em 2015, a devolução do dinheiro que foi exigido pelo ex-chefe da Unidade Gestora Executora e Aquisições, Rodolfo Tambanjane. O montante pago por Ricardo José era referente ao valor da comissão de Tambanjane por ter selecionado esta empresa e não outra. Rodolfo Tambanjane foi preso, tendo saído depois de pagar caução. O caso continua em tribunal.