A garantia é dada por dois analistas políticos de Moçambique, depois do Gabinete Central de Combate à Corrupção (GCCC) ter divulgado o desvio de mais cinco milhões de euros dos cofres públicos no último trimestre.
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Só em três meses, foram abertos 284 processos-crime relativos a casos de corrupção em Moçambique para apurar o paradeiro dos mais de cinco milhões de euros (370 milhões de meticais) que desapareceram do erário público. Nampula e Cabo Delgado foram as províncias que mais registaram desvios de fundos públicos, segundo o relatório do GCCC.
“Pelos casos que são divulgados pelo Gabinete Central de Combate à Corrupção, a corrupção está instalada em todo o país”, comenta Celeste Banze, economista e investigadora do Centro de Integridade Pública de Moçambique.
“Tem sido mais comum, sobretudo agora, que se está a pautar pela descentralização do sistema. À medida que está a ocorrer essa descentralização, mais pessoas têm a prerrogativa de fazer desvios dos cofres do Estado, porque essa descentralização não está a ser acompanhada por um sistema de controlo mais forte”, acrescenta.
Empresas-fantasma
Segundo o relatório do Gabinete Central de Combate à Corrupção, revelado na segunda-feira (23/10), a maioria dos casos (80%) de pequena corrupção envolve agentes de departamentos financeiros que criam empresas-fantasma ou beneficiam empresas de familiares que não reúnem requisitos para serem aprovadas em concursos públicos.
“Basta que haja conluio entre o agente e o supervisor, que é a pessoa que dá conformidade aos processos do sistema. É fácil o agente introduzir alguns abonos ou mesmo transferir a sua categoria salarial para uma categoria mais alta. Se houver esse concluio, há saque. Não há um controlo direto do Ministério das Finanças para este tipo de transações”, denuncia a economista.
24.10.2017 Corrupção em Moçambique - MP3-Mono
Entretanto, o porta-voz do Gabinete Central de Combate à Corrupção anunciou que foram constituídos três arguidos na investigação sobre a alegada corrupção na compra, pelas Linhas Aéreas de Moçambique, de dois aviões "Embraer".
Documentos da justiça brasileira revelam que a Embraer terá pago 741 mil euros a gestores da companhia área nacional e a um intermediário pela venda de duas aeronaves em 2009.
Para Fernando Lima, jornalista e analista moçambicano, não há um setor que escape à corrupção em Moambique. “Está instalada, está entranhada e está a desenvolver-se a passos galopantes. Não há um setor em que não haja corrupção. Desde o funcionário do atendimento que recebe a pequena gorjeta, que é também comum no polícia, à grande corrupção, das luvas, para os grandes projetos e grandes contratos”, lamenta o comentador.
Medidas insuficientes
Fernando Lima frisa que o Estado e o poder judicial têm feito esforços no sentido de combater o desvio de dinheiros públicos, nomeadamente com a campanha anti-corrupção que tem tomado conta dos discursos do Presidente moçambicano Filipe Nyusi. No entanto, para a analista Celeste Banze, há protecionismo do Estado com os agentes responsáveis pela grande corrupção, como é o caso dos 500 milhões de dólares que desapareceram dos cofres públicos, segundo a auditoria da consultora norte-americana Kroll, mas que o Governo não comenta. Por outro lado, para esta analista, a pequena corrupção continua a ser combatida com penas demasiado leves ou coimas inferiores às quantias desviadas, o que mostra que as medidas são insuficientes.
“Há alguns avanços que foram feitos nesse sentido. Anteriormente não era possível saber quem é que fez, como fez, a hora que fez e o dia em que fez [o desvio ilegal de verbas]. Hoje em dia, pelo menos na Direção de Finanças Públicas, pode detetar-se o desvio no sistema através das senhas, ver a respetiva transação, e perceber quem a fez e em que minuto”, explica Celeste Banze.
“Mas ainda não é o suficiente, porque ainda é possível ser corrupto. A partir do momento em que não for possível, é que teremos avançado bastante”, conclui a economista do CIP.
Desmascarar os corruptos
A organização não-governamental Transparência Internacional seleccionou, entre 383 candidaturas, os 15 casos "mais simbólicos de grande corrupção". A votação decorre até 10 de fevereiro. Isabel dos Santos está na lista.
Isabel dos Santos
A filha mais velha do Presidente angolano está entre os 15 casos "mais simbólicos da grande corrupção" seleccionados pela Transparência Internacional. Isabel dos Santos foi considerada a primeira bilionária africana pela revista Forbes, que questiona a sua fortuna de mais de três mil milhões de dólares, num país em que dois terços da população vive com menos de dois dólares por dia.
Foto: picture-alliance/dpa
Banco Espírito Santo
As suspeitas de corrupção do Banco Espírito Santo (BES) em Portugal começaram quando entrou em bancarrota em 2014, levando accionistas e investidores a perderem dez mil milhões de euros, estima a Transparência Internacional. Foram descobertas fortes evidências de corrupção, fraude e lavagem de dinheiro. Ricardo Salgado, ex-presidente do BES, já esteve preso e foi recentemente libertado sob fiança.
Foto: DW/J. Carlos
Teodoro Nguema Obiang
Conhecido pelo seu estilo de vida luxuoso, o filho do Presidente da Guiné Equatorial é, desde 2012, segundo vice-presidente da República e chefe de Defesa e Segurança do Estado. A Guiné Equatorial é o país mais rico de África, per capita, apesar do Banco Mundial alegar que mais de 75% da população vive na pobreza, com menos de dois euros por dia.
Foto: DW/R. Graça
Petrobras
A petrolífera Petrobras está envolvida num escândalo de subornos, comissões e lavagens de dinheiro de alegadamente mais de dois mil milhões de euros, que conduziu o Brasil a uma profunda crise política. Este caso envolveu mais de 50 políticos e 18 empresas. A população brasileira já fez vários protestos nas ruas para exigir justiça pelos crimes cometidos pela empresa estatal.
Foto: picture alliance/CITYPRESS 24
Ricardo Martinelli e companheiros
É ex-Presidente do Panamá e empresário. Possui atualmente uma rede de supermercados no país, entre outras empresas. Está envolvido numa polémica de espionagem política durante o seu mandato entre 2009 e 2014, utilizando alegadamente dinheiros públicos. Tem outras acusações em tribunal, incluindo vários crimes financeiros e subornos e perdões ilegais.
Foto: Getty Images/AFP/J. Ordone
Sistema político do Líbano
O sistema político no Líbano, nomedamante, o Governo, as autoridades a a instituições, encontram-se também na lista da International Transparency. Segundo a Associação de Transparência Libanesa, a corrupção encontra-se em todos setores sociais e governamentais, existindo "uma cultura de corrupção" no país. O Líbano é considerado um país "muito fraco" em termos de integridade.
Foto: Getty Images/AFP
Mohamed Hosni Mubarak
Presidente do Egito entre 1981 e 2011, Mohamed Hosni Mubarak foi também julgado e condenado em 2011 a prisão perpétua por crimes de guerra e contra a humanidade. No entanto, e após estar preso durante três anos, o Tribunal Penal do Cairo cancelou as acusações. Em maio de 2015 foi sujeito a um novo julgamento. Mubarak encontra-se agora preso.
Foto: Reuters/M. Abd El Ghany
Felix Bautista
O senador da República Dominicana foi acusado de branqueamento de capitais, abuso de poder, prevaricação e enriquecimento ilícito no valor de vários milhões de dólares. Bautista já foi presente a tribunal, mas nunca foi considerado culpado, o que originou vários protestos por parte da população dominicana que segundo um relatório de 2014 do Banco Mundial apresenta afluência na pobreza crónica.
Foto: unmaskthecorrupt.org
Estado americano de Delaware
O Estado norte-americano de Delaware está nomeado pelos crimes nos serviços transfronteiriços onde foram aplicadas regras secretas, pela falta de recolha de dados dos benificiários e pela maior incidência nos cidadãos comuns. O jornal The New York Times chegou mesmo a apelidar o Estado como "paraíso fiscal corporativo". Quase metade das empresas públicas nos EUA estão incorporadas em Delaware.
Foto: Getty Images/M. Makela
Zine al-Abidine Ben Ali
O ex-Presidente da Tunísia, que governou entre 1987 e 2011, é acusado de roubar mais de dois mil milhões de euros à população tunisina e de beneficiar amigos e companheiros a escapar à justiça. É conhecido pelo seu estilo de vida extravagante e saiu do Governo em 2011, na sequência de vários protestos e manifestações nas ruas da Tunísia conhecidos como a Revolução de Jasmim.
Foto: picture-alliance/dpa
FIFA
A Federação Internacional de Futebol, mais conhecida como FIFA, é acusada de ultrajar milhões de fãs. Os respoonsáveis pelos cargos mais elevados são acusados de roubar milhões de euros e estão a ser analisados 81 casos suspeitos de branqueamento de capitais um pouco por todo o mundo. Em 2006, o repórter Andrew Jennings lançou o livro "Jogo Sujo - O mundo Secreto da FIFA".
O ex-Presidente da Ucrânia é acusado de "deixar escapar" milhões de ativos estatais em mãos privadas e de ter fugido para a Rússia antes de ser acusado de peculato. Yanukovych começou o seu mandato em 2010, foi reeleito em 2012 e cessou as suas funções no ano de 2014, quando foi destituído após vários protestos populares nas ruas do país contra a possível aproximação com a Rússia.
Foto: picture alliance / AP Photo
Fundação Akhmad Kadyrov
A Fundação Akhmad Kadyrov é a associação para o desenvolvimento social e económico na Chechénia e foi acusada de obter valores que rondam os 55 milhões de dólares por mês, enquanto 80% da população continuava a viver na pobreza. Os membros da associação são ainda acusados de gastar as verbas a entreter e oferecer presentes às estrelas de Hollywood.
Foto: picture-alliance/AP Photo/D. Bondareff
Comércio de jade no Mianmar
O negócio da comercialização de jade está avaliada em cerca de 28 mil milhões de euros. A Transparência Internacional refere que quem mais lucra são traficantes de droga e funcionários de cargos mais elevados. Os conflitos saem também a ganhar através da compra de armas. Sóem novembro de 2015 morreram cerca de 100 trabalhadores na exploração de jade no Mianmar, após um deslizamento de terras.
Foto: Getty Images/AFP/K. Maung Win
China Communications Construction Company
A China Communications Construction Comaonz (CCCC) é uma das maiores empresas de construção do mundo e tem sede na China. A CCCC, que pertence parcialmente ao Estado, está alegadamente envolvida em propostas não-concorrenciais, negociações secretas e supostos casos de subornos. Em 2014 foi processada por violar os direitos dos moradores durante a construção de uma estrada no Uganda.
Foto: AFP/Getty Images
International Transparency
"Unmask the Corrupt" é um projeto da Transparency International e a votação está agora aberta a toda a população mundial até ao dia 10 de fevereiro. Casey Celso, diretor de Advocacia da Transparency International, frisa que a votação é totalmente anónima. "Lutamos contra a corrupção há bastante tempo e tentamos colocar o conceito de grande corrupção em todo o mundo", afirmou.