Presidenciais: Novos protestos violentos na Costa do Marfim
mc | com agências
15 de setembro de 2020
Alassane Ouattara foi considerado elegível para concorrer a um terceiro mandato presidencial e uma nova onda de protestos violentos surgiu na Costa do Marfim. Oposição diz que recandidatura é inconstitucional.
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Na Costa do Marfim, o Conselho Constitucional deu esta segunda-feira (14.09) "luz verde" ao Presidente Alassane Ouattara para concorrer a um terceiro mandato nas eleições presidenciais de outubro.
Só 4 dos 44 candidatos foram aprovados pelo Conselho Constitucional. Impedidos de participar estão, entre outros, o ex-Presidente Laurent Gbagbo, que foi absolvido pelo Tribunal Penal Internacional (TPI) por crimes contra a humanidade acusados no ano passado, e o antigo primeiro-ministro e líder rebelde Guillaume Soro.
A comissão eleitoral disse que qualquer pessoa condenada por um crime será desqualificada para concorrer ao cargo mais alto e impediu Soro de concorrer, uma vez que foi condenado em abril a 20 anos de prisão por "ocultação de desvio de fundos públicos".
Gbagbo foi condenado à revelia a um período de 20 anos durante a pilhagem da sucursal local do Banco Central dos Estados da África Ocidental durante a crise de 2010-2011.
Quem vai a votos?
Os outros candidatos aprovados foram o antigo Presidente Henri Konan Bedie, do partido historicamente dominante PDCI, o antigo primeiro-ministro de Gbagbo, Pascal Affi N'Guessan, e Kouadio Konan Bertin, um dissidente do partido de Bedie.
Num comício em que participaram dezenas de milhares de apoiantes na capital Yamoussoukro, Bedie prometeu, se eleito, trabalhar para "o regresso incondicional de todos os exilados, bem como a libertação de todos os presos políticos, civis e militares da crise pós-eleitoral".
Bedie procura regressar à presidência depois de ter sido deposto no primeiro golpe de Estado do país em 1999.
Onda de protestos
Na sequência do anúncio do Conselho Constitucional, na segunda-feira (14.09) houve protestos violentos em várias cidades contra a recandidatura de Alassane Ouattara.
Em Yopougon, bairro da classe trabalhadora da capital económica, Abidjan, manifestantes atearam fogo a um autocarro, segundo testemunho de um fotógrafo da agência France-Presse, na sequência de confrontos entre a polícia e grupos de jovens durante a manhã. A situação já se tinha acalmado ao meio-dia.
O bairro é considerado um reduto do ex-Presidente exilado Gbagbo, cujos apoiantes tinham apresentado um pedido para ele concorrer na votação.
Foi a recusa de Gbagbo em conceder a derrota a Ouattara após as eleições de 2010 que desencadeou a uma breve guerra civil que matou mais de 3.000 pessoas.
Em Bangolo (Centro-Oeste), após uma marcha, os manifestantes atearam fogo a um camião e a vários outros veículos, tendo sido dispersados pelas forças de segurança com gás lacrimogéneo, segundo relatou um residente sob condição de anonimato.
Testemunhas dão também conta de várias tentativas de bloqueio de estradas da parte ocidental do país, levando a intervenções da polícia.
Os distúrbios preocupam os observadores políticos que a temem que a votação possa desestabilizar a Costa do Marfim, o maior produtor mundial de cacau e a maior economia da África Ocidental francófona.
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Porque se recandidata Quattara?
Alassane Ouattara, 78 anos, que tinha anunciado, em março, que não se recandidataria, mudou de posição após a morte por ataque cardíaco do seu "delfim" e candidato presidencial, Amadou Gon Coulibaly, em julho.
Vai concorrer novamente à chefia do Estado nas eleições de 31 de outubro, numa interpretação da Constituição largamente contestada pela oposição, que sustenta que um terceiro mandato é inconstitucional.
Manifestações desencadeadas na sequência do anúncio da recandidatura de Ouattara, em agosto, degeneraram em violência, deixando pelo menos 15 mortos.
A Constituição de 2016 limita os mandatos presidenciais a dois, mas os apoiantes de Ouattara dizem que a alteração constitucional feita nesse ano reiniciou o contador de mandatos permitindo uma nova candidatura.
Presidentes a todo o custo
São derrotados nas eleições, mas contestam os resultados. Mesmo depois de esgotarem todos os recursos, estes candidatos à mais alta magistratura continuam a reivindicar a Presidência.
Maurice Kamto: o auto-proclamado "presidente"
O candidato da oposição às presidenciais de 7 de outubro nos Camarões, Maurice Kamto, reivindica a vitória frente a Paul Biya. "Convido o Presidente da República a criar as condições para uma transição pacífica para proteger os Camarões de uma crise eleitoral desnecessária", declarou o líder do MRC - Movimento para o Renascimento dos Camarões.
Foto: AFP/Getty Images
Nelson Chamisa, o "presidente legítimo" do Zimbabué
O líder da oposição zimbabueana contesta a vitória do Presidente Emmerson Mnangagwa nas eleições de 30 de julho de 2018. Considera-se vencedor e reclama a cadeira presidencial numa cerimónia simbólica de tomada de posse, a 15 de setembro.
Foto: Reuters/P. Bulawayo
Cissé rejeita a tomada de posse de Keïta
Soumaïla Cissé não marca presença na cerimónia e fala num vazio de poder no Mali depois da tomada de posse "nula e de efeito nulo" do seu rival, Ibrahim Boubacar Keïta, a 4 de setembro de 2018. A 20 de agosto, o Tribunal Constitucional do Mali declarou Keïta vencedor das presidenciais com 67,16% dos votos na segunda volta de 12 de agosto contra os 32,84% de Soumaïla Cissé.
Foto: DW/K. Gänsler
Raila Odinga, efémero "presidente do povo"
A 30 de janeiro de 2018, o opositor que tinha boicotado as presidenciais de outubro de 2017 contra Uhuru Kenyatta autoproclama-se "presidente do povo" perante milhares de apoiantes, numa cerimónia simbólica em Nairobi. O país é palco de violência pós-eleitoral, mas, a 9 de março, Odinga e Kenyatta surpreendem ao anunciar a sua reconciliação.
Foto: picture-alliance/Anadolu Agency/B. Jaybee
Jean Ping : "Exercerei o poder que me confiaram"
Dois anos após as presidenciais de agosto de 2016, o líder da oposição gabonesa continua determinado. A 31 de agosto, numa cerimónia de "homenagem aos mártires" da violência pós-eleitoral, em Libreville, diz que quer continuar a sua "luta" para "libertar" o Gabão. Jean Ping deposita esperanças nomeadamente no inquérito preliminar do Tribunal Penal Internacional sobre a crise pós-eleitoral no país.
Foto: DW/A. Kriesch
Kizza Besigye, o eterno rejeitado
Em fevereiro de 2016, o opositor histórico enfrenta Yoweri Museveni pela quarta vez no Uganda. Quando Museveni é declarado vencedor e se prepara para prestar juramento para um quinto mandato, Kizza Besigye toma posse como presidente numa cerimónia alternativa. Afirma "ter provas" da sua vitória. Detido e condenado por alta traição, é libertado algumas semanas depois.
Foto: DW/E.Lubega
André Mba Obame, o outro adversário de Ali Bongo
Inspirado pelos acontecimentos na Costa do Marfim, o antigo ministro "AMO" autoproclama-se presidente do Gabão, em janeiro de 2011, 17 meses depois de perder as presidenciais frente a Ali Bongo. Acusado de alta traição, refugia-se numa agência da ONU. Os problemas de saúde põem fim às suas ambições presidenciais. A sua morte, em abrir de 2015, aos 57 anos, leva a confrontos em Libreville.
Foto: cc-by-sa Ernest A. TEWELYO
Étienne Tshisekedi, duas vezes "presidente"
Em 2006 e 2011, o líder do principal partido da oposição congolesa (UDPS) declara-se vencedor frente a Joseph Kabila e "presidente eleito". Toma posse na sua residência em Limete, arredores de Kinshasa. O seu estado de saúde deteriora-se em 2014 e em 2017 morre com o eterno opositor o desejo de ocupar a cadeira presidencial.
Foto: picture-alliance/dpa/T. Roge
Laurent Gbagbo, opositor histórico
No ano 2000, o líder do FPI declara-se vencedor frente a Robert Gueï e pede aos costa-marfinenses que saiam à rua para fazer cair o general. Os manifestantes atacam os agentes de segurança do chefe da junta militar. Os protestos continuam até que a polícia e, mais tarde, o exército, começam a passar para o lado de Laurent Gbagbo.
Foto: AP
John Fru Ndi às portas do palácio presidencial
John Fru Ndi autoproclama-se presidente a 21 de outubro de 1992. Dois dias depois, o Supremo Tribunal declara Paul Biya vencedor do escrutínio presidencial. O fundador do SDF contesta estes resultados nas ruas. É declarado o estado de emergência no nordeste do país e John Fru Ndi fica em prisão domiciliária.