Autoridades moçambicanas alertam para risco de terceira vaga
Lusa | ms
4 de março de 2021
O diretor do Instituto Nacional de Saúde (INS) de Moçambique está preocupado com risco de o país poder enfrentar uma terceira vaga de covid-19 "mais intensa", caso se verifique um "relaxamento" das medidas de prevenção.
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"No nosso entender, o relaxamento das medidas restritivas poderá resultar numa terceira vaga com transmissão mais intensa", afirmou Ilesh Jani, na quarta-feira (03.03), durante a apresentação de dados sobre a evolução da pandemia. Um encontro entre o Presidente Filipe Nyusi e representantes de clubes, para um ponto de situação sobre a criação de condições visando a retoma de provas desportivas no país, interrompidas devido ao novo coronavírus.
O diretor do INS avançou que os óbitos e infeções pelo novo coronavírus estão a mostrar "sinais de estabilização" nas últimas semanas, depois da subida registada em janeiro. "A situação epidemiológica no país, incluindo na região metropolitana de Maputo, tende a estabilizar-se, provavelmente devido às medidas restritivas tomadas", referiu Jani.
Ainda assim, prosseguiu, o país continua com uma taxa de positividade alta, atingindo atualmente 20%, ou seja, "uma em cada cinco amostras testadas é positiva para a Covid-19". Em fevereiro, o país registou mais internamentos e mais óbitos do que em janeiro e espera-se ainda um "número significativo" de mortes em março, acrescentou.
"Geralmente, o pico de óbitos acontece um pouco mais tarde do que o pico de casos", explicou o diretor do INS, assinalando ainda que a taxa de letalidade do vírus em Moçambique é de 1,1%, sendo mais baixa do que a média do continente africano, que é de 2,5%.
Elites contribuíram para propagação da doença
O epidemiologista Avertino Barreto, um dos mais conhecidos do país, também alertou para uma eventual terceira vaga se houver uma suavização das medidas de prevenção. "Não lancemos foguetes, porque daqui a dois ou três meses teremos uma terceira onda, se não tomarmos precauções agora", declarou Barreto, em entrevista ao canal televisivo STV.
Como a pandemia tem afetado o negócio dos artesãos em Maputo
07:15
O especialista, que faz parte da comissão científica contra a Covid-19, criada pelo executivo moçambicano, defendeu que o país não deve "aliviar agora, nem um bocado". "Sou da opinião de que se deve manter o recolher obrigatório e, mais, estender para outras cidades em que se julgava que a situação estava controlada, como Nampula, Beira e Quelimane", afirmou.
Avertino Barreto considerou que a segunda vaga de Covid-19 que o país vive desde o início do ano deve-se a diversos fatores, entre eles, a forma como as "elites" festejaram a quadra natalícia e a passagem de ano. "Quem fez as festas grandes não foi o nosso [cidadão] desgraçado, a vender tomates", numa alusão à venda informal de rua de que depende boa parte da população. Na opinião daquele especialista, as elites "contribuíram grandemente" para a propagação da doença.
O Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, faz hoje uma comunicação à nação sobre o rumo que o país vai seguir na prevenção e combate à Covid-19, um mês após ter decretado um recolher obrigatório na região do grande Maputo e ter anunciado o agravamento das restrições.
Moçambique contabiliza cumulativamente 668 óbitos por Covid-19 e 60.395 casos, dos quais 72% estão recuperados e outros 184 atualmente internados (73% destes na cidade de Maputo).
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Adiadas discussões com o FMI
As discussões sobre um programa de assistência financeira a Moçambique foram adiadas a pedido do Governo devido ao contexto de pandemia, disse à Lusa o diretor do departamento africano do Fundo Monetário Internacional (FMI), Abebe Aemro Selassie.
"As autoridades de Moçambique pediram um programa e eu disse, em outubro, que íamos começar as discussões em breve", afirmou Selassie, em declarações à Lusa, quando questionado sobre o atraso na discussão de um programa de ajuda financeira para Moçambique, que o país tem dito ser necessário há meses.
Segundo o responsável, "o tempo para essas discussões foi adiado, principalmente devido ao pedido do Governo, não por falta de interesse, mas pela dificuldade em fazer o trabalho necessário a um programa durante este contexto de pandemia".
"Normalmente viajamos e debatemos, reunimos, e isso facilita o intenso diálogo que é necessário, o que em missões virtuais é muito difícil, mas da nossa parte continuamos prontos para apoiar o Governo assim que sentirem que estão prontos", concluiu Selassie.
Covid-19 em Maputo: os sítios em que menos se cumpre o distanciamento social
Com o aumento dos casos positivos de Covid-19 em Maputo, crescem também as críticas aos espaços onde as medidas restritivas para conter a pandemia, como são o distanciamento social e regras de higiene, não são cumpridas.
Foto: Romeu da Silva/DW
Mercados, maiores focos
A propagação do novo coronavírus na cidade de Maputo está aumentar. Na capital moçambicana, os locais onde há menos distanciamento social são apontados como os maiores focos de propagação do vírus. Os mercados são um destes lugares, como podemos ver nesta imagem do mercado informal de "Xikeleni".
Foto: Romeu da Silva/DW
Filas nos bancos
O mesmo acontece nos bancos. O Presidente da República Filipe Nyusi criticou, na sua comunicação à nação, o atendimento neste serviço. Como mostra esta imagem, continua a ser comum as filas à porta dos bancos. As pessoas aglomeram-se não cumprindo o distanciamento de dois metros determinado pelo governo.
Foto: Romeu da Silva/DW
Cidadãos cansados
Também nas ATM o distanciamento social não é cumprido, algo que pode ser justificado com o desgaste dos cidadãos em ficar muito tempo na fila à espera da sua vez para levantar o dinheiro. Aqui, não é só o distanciamento que preocupa. Não existe também sabão para a lavagem ou desinfeção das mãos após a utilização da máquina.
Foto: Romeu da Silva/DW
Escolas
Também nas escolas, é difícil falar em distanciamento, apesar de chefe de Estado ter elogiado a postura destes estabelecimentos no combate à pandemia. No entanto, nos intervalos, as crianças continuam aos abraços, muitas vezes sem máscaras ou viseiras, o que pode propiciar a propagação do vírus.
Foto: Romeu da Silva/DW
Transportes coletivos
Diversos círculos sociais criticam os operadores dos transportes semicoletivos a quem acusam de estar a violar as orientações do governo, segundo as quais, em cada banco devem sentar-se apenas três pessoas. No entanto, e por causa da receita, alguns "chapeiros" violam a regra. A polícia municipal, ao que tudo indica, não está a conseguir controlar a situação.
Foto: Romeu da Silva/DW
Número de passageiros mantém-se
A mesma crítica estende-se aos chamados "Smart kikas" que continuam a transportar mais de cem pessoas, quando deviam reduzir para metade. Em Maputo, estes sãos os meios de transporte preferidos porque levam pessoas desde o centro da cidade até à periferia. Nas horas de ponta, o cenário de aglomeração é arrepiante. Não há desinfeção das mãos à entrada, nem mesmo do próprio autocarro.
Foto: Romeu da Silva/DW
Paragens sem distanciamento
Outro cenário muito comum na capital moçambicana são as filas, sem distanciamento, nas paragens de transporte semi-coletivo. O cenário piora quando chega o transporte, pois há "guerra" pelo assento, ninguém quer viajar de pé.
Foto: Romeu da Silva/DW
Terminais de autocarros
Os terminais são tidos também como focos de propagação do coronavírus. Nestes locais, desaguam diariamente vários "chapas" provenientes de quase toda a periferia. Ao já acentuado movimento de passageiros, juntam-se os vendedores informais, o que dificulta ainda mais o cumprimento do distanciamento social.
Foto: Romeu da Silva/DW
Fila numa padaria
Observamos também alguma falta de distanciamento nas filas para a compra de pão em algumas padarias de Maputo. No interior dos estabelecimentos, o controlo é eficaz, pois entra apenas um cliente de cada vez. Mas no exterior, a realidade é diferente como se pode ver nesta fotografia tirada no bairro da Malhangalene, fronteira entre a cidade de cimento e os bairros periféricos.
Foto: Romeu da Silva/DW
Difícil mas não impossível
Os supermercados são também estabelecimentos com muita procura. Para além do entra e sai, muitos dos clientes mexem nos produtos sem desinfetar as mãos. O distanciamento social é também um problema, no entanto, tem vindo a melhorar em muitos dos espaços. Aos fins de semana, os gestores preferem deixar alguns cliente de fora do estabelecimento para evitar aglomerados no interior.
Foto: Romeu da Silva/DW
Serviços públicos
Diariamente, são muitas as pessoas que precisam de se dirigir aos serviços públicos para tratar de assuntos variados. Às repartições de registo criminal, por exemplo, acorrem todos os dias muitos candidatos que procuram empregos nas instituições do estado. Apesar da afluência, a rapidez no atendimento acaba por minimizar o risco, e aumentar o distanciamento social.
Foto: Romeu da Silva/DW
Tradição inimiga da prevenção
As cerimónias familiares, por exemplo funerais, estão limitadas, atualmente, a 20 pessoas. No entanto, e porque culturalmente este tipo de eventos costuma ter muito mais gente, continuam a existir funerais com o dobro do número permitido.