Moçambique: Distanciamento social entre principais desafios
Leonel Matias (Maputo)
18 de junho de 2020
O não cumprimento do distanciamento social dificulta a implementação do estado de emergência, conclui conferência científica sobre a Covid-19, em Maputo. Medidas para conter o impacto da pandemia devem ser reforçadas.
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Cerca de 80% de mulheres e 99% de homens adultos saem de casa, alegadamente para se deslocarem às compras, para irem para o trabalho ou para realizarem negócios, revela um estudo divulgado pelo Centro de Investigação em Saúde da Manhiça.
A principal fonte de sobrevivência da maioria dos moçambicanos é o comércio informal. "Nós verificamos diariamente que as pessoas, em média, ficavam fora de casa, antes da Covid-19, 13 horas. E depois da Covid, este tempo apenas reduziu ligeiramente", explica a investigadora Aleia Rachide Agy, do Observatório do Meio Rural.
"E grande parte das pessoas que saíam dependem daquela atividade para o seu sustento", afirma também o director executivo do Instituto para Democracia Multipartidária, Hermenegildo Mulhovo.
O Observatório do Meio Rural defende que o Governo devia criar uma cesta básica para garantir a permanência em casa das famílias vulneráveis.
Dados avançados na conferência indicam igualmente que 40% das crianças não permanecem em casa, apesar das escolas se encontrarem encerradas.
"Doença das cidades e das elites"
Contrariamente ao distanciamento social, a implementação das medidas de higienização das mãos e do uso das máscaras regista maior adesão. No entanto, no campo as pessoas têm ainda a percepção errada de que a Covid-19 é uma "doença das cidades e das elites". Para a investigadora Janet Dulá, "as zonas mais urbanizadas têm acesso fácil à informação e acabam tendo algum privilégio nas mensagens-chave, mas há que abranger as zonas mais ruralizadas".
Moçambique: Agricultores lançam "Quarentena sem fome"
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Também foi constatado num inquérito que metade dos pais deixariam que os filhos regressassem à escola caso diminuíssem os casos de Covid-19 e fossem criadas condições de prevenção nos estabelecimentos de ensino.
Já 100% dos trabalhadores estão prontos para retomarem o trabalho, mediante a tomada de medidas de prevenção.
Moçambique figura entre os dez países com o registo mais rápido de duplicação da pandemia no mundo.
É preciso "rever prioridades"
O escritor Mia Couto, que é igualmente biólogo e membro da Comissão Técnico Cientifica sobre a Covid-19, considera que é preciso olhar desde já para o impacto desta pandemia no futuro da sociedade. "Se nós voltarmos àquilo que chamamos normalidade vamos arranjar uma cura para esta doença, mas não vamos arranjar cura para outras doenças mais antigas que são doenças sociais, a falta de solidariedade, a desigualdade, a injustiça, que agora se tornaram bem patentes".
Mia Couto defende ainda que "é preciso que se revejam as prioridades que é preciso dar. Por exemplo, a ideia desse modelo neoliberal em que o Estado fica emagrecido, os sistemas públicos ficam enfraquecidos porque o mercado é que vai resolver, não serve".
De capulanas a máscaras: alfaiatarias de Moçambique inovam em tempos de Covid-19
Em Moçambique, a grande procura levou muitas pessoas a investirem na produção e no comércio de máscaras faciais feitas de capulana.
Foto: DW/R. da Silva
As máscaras de capulana
As pessoas procuram pelas máscaras na tentativa de conter a propagação do coronavírus no país. O uso da máscara é também uma recomendação do Governo e, em alguns casos, obrigatório. As müascaras feitas de capulana estão a ganhar o mercado, conquistar os clientes e render um bom dinheiro.
Foto: DW/R. da Silva
Nova utilidade da capulana
É a capulanas como estas que muitos produtores recorrem para fabricar o seu mais novo produto: máscaras faciais. A capulana passou a ter mais esta utilidade por causa do coronavírus. O preço da capulana continua a ser o mesmo, custando entre o equivalente a 1,20 a pouco mais de 4 euros, dependendo da qualidade.
Foto: DW/R. da Silva
Tradição em capulanas
Na baixa de Maputo, a "Casa Elefante" é uma das mais antigas casas de venda de capulana da capital moçambicana. Vende variados tipos do produto. São muitas as senhoras que se deslocam ao local para a compra deste artigo para a produção das máscaras. As casas de venda de capulana passaram a ter muita afluência para responderem à grande procura pelos artigos por causa do coronavírus.
Foto: DW/R. da Silva
Produção caseira
Esta alfaiataria caseira funciona há cerca de 15 anos, em Maputo. Antes, a proprietária dedicava-se a costurar uniformes escolares. Por causa do coronavírus, passou a investir mais na produção de máscaras. Ela vende aos informais a um preço de 0,20 euros cada unidade.
Foto: DW/R. da Silva
Aproveitar a demanda
A alfaiataria da Luísa e da Fátima dedica-se à produção de vestuário de noivas e não só, mas também à sua consertação. Quando começou a procura pelas máscaras de produção com recurso à capulana, as duas empreendedoras tiveram que redobrar os esforços para produzi-las sem pôr em causa a confecção habitual. O rendimento diário subiu de cerca de 40 euros para 60 euros, dizem.
Foto: DW/R. da Silva
Produção a todo o vapor
Estes alfaiates, no mercado informal de Xiqueleni, costumam dedicar-se ao ajustamento de roupas de segundam mão, compradas no local. Mas devido à intensa procura pelas máscaras, dedicam a maior parte do tempo a produzir estes protetores faciais à base da capulana. Também eles estão a aproveitar a grande demanda pelo acessório.
Foto: DW/R. da Silva
Informais a vender máscaras
Desde que o Governo determinou a obrigatoriedade do uso de máscaras nos transportes e aglomerações, há pouco mais de uma semana, muitos vendedores informais, mulheres e homens, miúdos e graúdos compraram-nas para a posterior revenda. Um dos principais locais para a venda ao consumidor final são os terminais rodoviários.
Foto: DW/R. da Silva
Máscara para garantir a viagem
Os maiores terminais rodoviários, como por exemplo a Praça dos Combatentes, são os locais de aglomerados populacionais e onde muitos cidadãos acorrem para comprar as máscaras caseiras. Quando um passageiro não tem a máscara, sabe que pode encontrar o produto sem ter que percorrer longas distâncias e garantir o embarque nos meios de transporte.
Foto: DW/R. da Silva
Grande procura em Maputo
Neste "Tchova", carrinho de tração humana, há vários artigos. Os clientes estão a apreciar as máscaras, e não só, que o vendedor informal exibe. Os clientes referem que compram as máscaras não só para evitar a propagação do coronavírus, mas também porque os "chapeiros" exigem o uso das mesmas, sob pena de não permitirem a viagemm de quem não tiver o acessório.
Foto: DW/R. da Silva
Bons rendimentos
Os vendedores informais aproveitam a muita procura pelas máscaras caseiras para juntar ao seu habitual negócio. Jorge Lucas, além de vender acessórios de telefones, diz que "há muita procura" pelas máscaras feitas de capulana e que este negócio está a render "qualquer coisa como 20 euros por dia".
Foto: DW/R. da Silva
Quase 20 euros por dia
António Zunguze vende uma máscara pelo valor equivalente a 0,80 euros. Por dia, diz que consegue levar para casa o equivalente a quase 20 euros e explica que a procura é muita nos mercados informais. António compra as máscaras nas alfaiatarias e vai, posteriormente, revendê-las nos terminais de semi-coletivos.
Foto: DW/R. da Silva
Propaganda, "a alma do negócio"
Este jovem montou um megafone para anunciar que, além das sandálias, já tem igualmente máscaras para a venda. Na imagem, as máscaras podem ser vistas no topo da sombrinha e o megafone instalado no muro. O jovem refere que na sua banca não tem havido muita procura, mas acredita que melhores dias virão.
Foto: DW/R. da Silva
Máscaras até nos salões de beleza
Alguns salões de beleza também não perderam a oportunidade e estão a revender as máscaras. Neste salão, já não há clientes devido ao período de restrições para conter a propagação do coronavírus. O salão também investe na venda de máscaras feitas de capulana.