Estudantes cabo-verdianos pedem ajuda para voltar do Senegal
Ângelo Semedo
7 de maio de 2020
Os alunos estão a passar dificuldades para suportar os gastos com alimentação e aluguer no país. Apesar dos pedidos de repatriamento na embaixada de Cabo Verde, eles não estão a ser vistos como prioridade na pandemia.
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A pandemia da Covid-19 está a complicar a vida de muitos estudantes cabo-verdianos que estão no Senegal por conta própria ou com bolsas de estudo. Muitos deles são de famílias de baixa renda e queixam-se da falta de apoio das autoridades cabo-verdianas. Por causa destas dificuldades, cerca de 30 de estudantes estão a pedir para serem repatriados para Cabo Verde.
Em entrevista à DW, alguns destes alunos confirmaram ter pedido apoio à embaixada cabo-verdiana em Dakar, mas sem sucesso. Aline Sequeira é estudante do 1º ano de Relações Internacionais e Diplomacia e contou como foi o contato com as autoridades.
"Nós chegamos a falar com eles por duas vezes. Na primeira vez, disseram-nos que, naquele momento, não havia como, porque não tinha voos. Entretanto, disseram-nos que poderia vir a surgir um voo para repatriar as rabidantes que estavam aqui e que poderíamos comprar a passagem para que, se no caso desse, fôssemos juntamente com elas", afirmou a estudante.
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Segundo a jovem, na hora de adquirir os bilhetes para regressar a casa, não puderam comprar porque não estavam na lista das prioridades.
"Fomos comprar a passagem e nos disseram que não vendiam passagens para os estudantes e que não dava para irmos. Na segunda vez, disseram-nos que naquele momento não éramos a prioridade", completou Aline Sequeira.
Custos no Senegal
Para contornar as dificuldades, os estudantes estão a morar em grupo para diminuir os custos com a renda e suportar as despesas, explica Alexandra Gomes, que está no 1º ano do curso de Francês:
"Somos quatro meninas num quarto. Uma teve que deixar a sua casa onde morava sozinha, para vir juntar-se a nós. A outra que estuda fora de Dakar, devido ao fecho das escolas por causa desta pandemia, teve que vir para ficar conosco. Agora, estamos todas unidas e nós as quatro dividimos as despesas para ver se conseguimos amenizar os gastos".
Igor Sanches, estudante de Direito na Universidade Cheick Anta Diop, é quem tem dado a cara em defesa dos estudantes cabo-verdianos com dificuldades no Senegal. O estudante critica: "As autoridades não têm estado a ver quais são os nossos problemas no Senegal".
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De acordo com Igor Sanches, os estudantes foram "abandonados". "Nunca fomos vistos no Senegal. Nunca a embaixada nos chamou. Eles têm os nossos números de telefone, mas nunca nos chamaram para saber o que se passa conosco", relatou o estudante de Direito.
Segundo Sanches, a embaixada confirmou que repatriar os estudantes que estão fora do país não é uma prioridade do Governo."Chamei o embaixador para colocar os problemas e a resposta que ele me deu é que a prioridade agora era para aquelas pessoas que estão a enfrentar o coronavírus em Cabo Verde".
Sem apoio do Governo
Cerca 70% dos estudantes cabo-verdianos no Senegal não têm apoio do Governo de Cabo Verde, de acordo com Igor Sanches. Ele lembra que, até agora, a embaixada só alugou uma casa para colocar os 14 alunos que ficaram desalojados devido ao encerramento da residência estudantil, por causa da Covid-19.
"Há muitos estudantes que já ficaram sem pagar a escola. Nós precisamos de mais ajuda no Senegal. Precisamos de mais ajudas para os nossos estudantes. Não se pode abandonar os estudantes desta maneira", apelou.
A reportagem da DW tentou ouvir o ministro dos Negócios Estrangeiros e Comunidades de Cabo Verde. No entanto, Luís Filipe Tavares pediu-nos para contatar o embaixador de Cabo Verde em Dakar, que, segundo o ministro, tem apoiado os estudantes com rendas de casa e outros apoios pontuais.
Entretanto, o ministro Luís Filipe Tavares lembrou que, neste momento, há centenas de pedidos de repatriamento de estudantes cabo-verdianos em vários países e que o Governo está a analisar esta problemática para ver as melhores soluções.
Até ao fechamento desta reportagem, não obtivemos nenhuma resposta da embaixada de Cabo Verde em Dakar.
O que mudou em Cabo Verde com a Covid-19
Cabo Verde registou quatro casos de infeção por Covid-19 e uma morte. Todos os casos são importados. Centenas de pessoas estão em isolamento e os voos foram condicionados. O dia a dia também está a ser afetado.
Foto: DW/A. Semedo
Movimentação reduzida nas ruas
A chegada do novo coronavírus a Cabo Verde mudou a rotina dos cabo-verdianos, sobretudo nos centros urbanos, onde se tem notado a diminuição de movimentação e aglomeração de pessoas. Muitos preferem ficar em casa para diminuir o contacto social. Eventos com muitas pessoas foram suspensos em todo o país. Discotecas foram encerradas, bares e restaurantes passaram a fechar mais cedo.
Foto: DW/A. Semedo
Férias escolares antecipadas
Cabo Verde antecipou as férias escolares do ensino pré-escolar, básico e secundário para o dia 23 de março, como medida de contenção à Covid-19. As universidades também suspenderam todas as aulas e outras atividades formativas. Foram ainda estabelecidas medidas "excecionais e temporárias" para o funcionamento de creches, com a possibilidade do teletrabalho para os pais.
Foto: DW/A. Semedo
Informar com urgência a população
Campanhas de sensibilização e de esclarecimento à população sobre a Covid-19 estão a ser realizadas pelas autoridades em Cabo Verde. Carros passam informações à população sobre o que é a Covid-19, as formas de transmissão e como prevenir a doença. Estas viaturas circulam nos centros das cidades e bairros para reforçar a comunicação.
Foto: DW/A. Semedo
Transportes urbanos com lotação a 50%
Os transportes urbanos e interurbanos, como taxis e "hiaces", já estão a sentir os efeitos da Covid-19. A lotação passou para metade, com impacto direto no rendimento dos condutores. A medida visa aumentar o distanciamento entre os passageiros e evitar o contágio. "Hiacistas" e taxistas pedem apoio ao Governo para colmatarem as perdas, como a suspensão de impostos ou a facilitação de créditos.
Foto: DW/A. Semedo
Praias interditadas em todo país
As autoridades interditaram o acesso às praias do país para evitar a aglomeração de pessoas e, consequentemente, prevenir o contágio e a disseminação da Covid-19. A proibição durará enquanto se mantiver o plano de contingência a nível nacional decretado pelo Governo. A polícia está a patrulhar as zonas balneares para garantir o cumprimento da interdição.
Foto: DW/A. Semedo
Acesso limitado aos locais públicos
Mercados, bancos, farmácias, lojas e outras instituições estão a limitar a entrada de pessoas para prevenir a Covid-19, o que tem levado à criação de filas à porta destes espaços. Nos mercados da Praia, por exemplo, foi proibida a entrada de crianças e as vendedeiras com mais de 65 anos devem ficar em casa. Feiras e vendas de animais vivos são agora proibidas. Algumas lojas chinesas já fecharam.
Foto: DW/A. Semedo
Corrida aos supermercados
O anúncio do plano de contingência para a prevenção e controlo da Covid-19 e do primeiro caso da doença no país, disparou as compras em Cabo Verde. O medo de ficar sem alimentos levou as pessoas a comprarem grandes quantidades de comida e produtos de higiene. O Governo alertou a população para não açambarcarem os produtos e reforçou a fiscalização contra a especulação de preços.
Foto: DW/A. Semedo
O medo de ficar sem gás butano
O anúncio do primeiro caso de Covid-19 no país levou os cidadãos à compra desenfreada de gás butano para armazenamento, temendo a sua falta no mercado. Vários postos de venda ficaram sem este combustível para atender à elevada procura. Entretanto, as empresas de combustíveis garantem à população que têm stocks de gás suficiente para abastecer o mercado, afastando um cenário de escassez.
Foto: DW/A. Semedo
Faltam materiais de proteção individual
A falta de máscaras e álcool em gel no mercado tem deixado os cidadãos muito preocupados. A procura por estes produtos aumentou drasticamente com o registo do primeiro caso de Covid-19 no país. A empresa de medicamentos Inpharma passou a produzir álcool em gel para abastecer o país e já garantiu o fornecimento de máscaras às farmácias. Porém, a venda destes produtos está a ser racionada.