É uma forma de cumprir o isolamento social decretado pelo Governo. Muitos estudantes universitários passaram a ter aulas online. A fraca qualidade da Internet e os preços altos da ligação são os grandes problemas.
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Uma das instituições que está a apostar no ensino pela Internet é a Universidade Eduardo Mondlane, em Maputo. Em teoria, os estudantes nem precisam de sair de casa, ou das suas cidades, para ter acesso às lições. É uma forma de cumprir com a regra do isolamento social e de evitar atrasos nos planos das aulas.
Mas alguns estudantes queixam-se do sinal fraco da Internet e dos preços: fazer videoconferências todos os dias sai caro. "Para nós é complicado", desabafa um estudante do curso de Engenharia Eletrónica na Universidade Eduardo Mondlane, que pediu para não ser identificado.
"Os custos financeiros é que estão a abater sobre nós. Por cada aula somos obrigados a ter mais ou menos 20 meticais (cerca de 0,30 euros) para Internet e todos os dias temos aulas. Quanto é 20x5? Contando que, por dia, são três aulas, isso sai muito caro", conta o aluno.
Baixar mensalidades para compensar despesas
Baixar as propinas seria uma opção para compensar as despesas, segundo este estudante. "Nós pagamos mensalidades e ainda procuramos recargas. Dão-nos trabalhos [de grupo], mas um está em Maputo, outro está em Nampula, na Zambézia ou em Tete... Como é que um trabalho de grupo vai ser feito assim?", questiona.
O cenário é um pouco diferente na Universidade Licungo, em Quelimane. Não há videoconferências e os estudantes têm apenas recebido os livros para leitura por correio eletrónico ou pelas redes sociais.
Mas não é a mesma coisa, diz Baloi Júnior, estudante de Sociologia. "Não estou de acordo com essa questão de se dar o texto e cada um ler e enviar fichas de leitura para o docente. Devia haver uma interação entre o docente e o estudante", sugere.
O estudante também se queixa dos trabalhos de grupo, que a seu ver não fazem sentido. "Será que, com a dimensão da doença, estamos preparados para fazer trabalhos em agrupamento? O chefe de Estado disse para não se agruparem e não saírem de casa. Mas aparecem docentes a darem trabalhos em grupo e nós temos de sair e irmos à casa de colegas que, por vezes, vivem muito longe. Então, anulemos os trabalhos em grupo e optemos por trabalhos individuais", argumenta.
Internet lenta e custos
Fazer esses trabalhos pela Internet também seria complicado. Mais uma vez, há os problemas da má ligação e dos custos.
"Como medida preventiva, é importante até certo ponto, mas do ponto de vista da continuação das atividades letivas por outras vias, para além das tradicionais, vai ser muito difícil para as universidades moçambicanas", afirma o professor Ricardo Raboco, que não é apologista da introdução de aulas virtuais nas universidades, porque, segundo explica, Moçambique não está preparado tecnologicamente para isso.
Primeiro, a avaliar pela qualidade de Internet, "que não é das melhores", sublinha o docente. Além disso, acrescenta, "há muito poucas universidades públicas em Moçambique onde podemos ter um ponto de acesso à Internet para acompanhar todo o processo de ensino e aprendizagem por esta via. Não será no âmbito da Covid-19 que o uso das tecnologias de informação e comunicação na universidade vai passar a ser um elemento estruturante."
Inhambane: 20 mil alunos começam ano letivo sentados no chão
Ano letivo começa esta sexta-feira em Moçambique, mas há muitos alunos que não têm sequer uma carteira para se sentarem. Só na província de Inhambane, sul do país, são mais de 20 mil. E há salas de aula sem condições.
Foto: DW/L. da Conceicao
Aulas no chão, sem condições
Sentados no chão, sem condições mínimas para trabalhar. É assim que milhares de alunos da província de Inhambane, no sul de Moçambique, começam o ano letivo esta sexta-feira. Os alunos mais afetados são os das zonas rurais. O Governo disse que haveria novas carteiras escolares, mas entregou muito menos do que as que tinha prometido.
Foto: DW/L. da Conceicao
Chão sem cimento
Muitos alunos trazem bancos de casa para a escola, para evitarem sujar o uniforme com a areia da sala de aula. A maioria das escolas tem salas como esta: com material precário, sem chão cimentado e em avançado estado de degradação. Milhares de alunos abandonam o ensino no Inverno, por causa da falta de condições.
Foto: DW/L. da Conceicao
Carteira é só do professor?
Para muitos alunos das zonas rurais e dos bairros suburbanos, há uma pergunta que não quer calar: Por que é que o professor tem direito a uma carteira, para colocar o seu material, mas eles têm de assistir às aulas sentados no chão? Na província de Inhambane, as autoridades de educação estimam que mais de 20 mil alunos não têm carteiras escolares neste início de ano.
Foto: DW/L. da Conceicao
Onde estão as carteiras e a madeira?
O governo provincial de Inhambane entregou madeira a uma empresa da província de Sofala para produzir carteiras escolares, mas, nos últimos dois anos, só foram entregues 3.000 de um total de 10 mil carteiras encomendadas. A empresa alega que só recebeu uma parte do dinheiro da encomenda e não tem recursos para produzir mais. Entretanto, milhares de alunos esperam por um lugar para se sentar.
Foto: DW/L. da Conceicao
As promessas do governo
O setor da Educação prometeu distribuir, até finais de 2018, mais de 16 mil bancos melhorados e mais de 10 mil carteiras duplas. Mas esses bancos e carteiras ainda não chegaram. Palmira Pinto, diretora provincial da Educação e Desenvolvimento Humano em Inhambane, promete que se estão a fazer esforços para, ainda ao longo deste ano, minimizar a preocupação dos alunos que não têm carteiras.
Foto: DW/L. da Conceicao
Aulas debaixo da árvore
Algumas escolas, sobretudo escolas primárias, vêem-se obrigadas a dar aulas debaixo de árvores, porque não têm dinheiro para mandar construir salas. A situação piorou com a saída de alguns parceiros internacionais, que cooperavam diretamente com o setor da Educação em Moçambique na construção de recintos escolares.
Foto: DW/L. da Conceicao
Crise reflete-se nas escolas
Com o conflito entre as forças do Governo e o braço armado da RENAMO e a crise financeira e a descoberta das "dívidas ocultas", parceiros internacionais, que costumavam cooperar com Moçambique, deixaram de dar apoios - também na Educação. Para evitar que os alunos tenham aulas debaixo de árvores, como noutros sítios, há escolas que constroem salas com chapa de zinco. Mas faltam carteiras.
Foto: DW/L. da Conceicao
Como é que se escreve aqui?
Uma das soluções que os alunos arranjaram foi ir buscar blocos de cimento, para não se sentarem no chão. Mas os pais e encarregados de educação estão preocupados com as condições no ensino. Como é que os alunos podem aprender a escrever aqui, sem mesa - só em cima do joelho?
Foto: DW/L. da Conceicao
Escolas privadas
Devido à falta de condições, muitos pais e encarregados de educação acabam por matricular os filhos e educandos em escolas privadas. E, mesmo aqui, há queixas quanto à qualidade das carteiras escolares. Ainda assim, mais vale ter carteiras do que ter aulas no chão, pensam os pais.
Foto: DW/L. da Conceicao
Buracos na sala de aula
Há escolas públicas, como esta, que estão numa fase avançada de degradação. Muitos alunos acabam por contrair doenças, devido à falta de condições. Tanto as autoridades do setor da Educação como líderes comunitários têm levado a cabo uma campanha para construir salas de aula em cada zona pedagógica.
Foto: DW/L. da Conceicao
Contributo comunitário
No âmbito da campanha, membros da comunidade têm construído salas de aula com materiais locais. Mas ainda faltam carteiras escolares, e os alunos têm de se sentar no chão ou nos blocos de cimento. Uma sala de aula acolhe cerca de 60 a 70 alunos, de uma só turma. Face a estas condições, há quem diga que, para conseguir estudar e ter sucesso na vida, é preciso ter muita força de vontade.
Foto: DW/L. da Conceicao
"O maior problema é nas escolas primárias"
Onde há mais falta de carteiras escolares é nas escolas primárias e completas, onde há um maior número de alunos, diz a diretora provincial da Educação e Desenvolvimento Humano, Palmira Pinto. Mas a província de Inhambane espera, neste ano letivo de 2019, retirar mais alunos do chão, para que eles possam assistir às aulas sentados em carteiras.