Segundo neurologistas britânicos, a Covid-19 pode causar sérios danos ao cérebro e ao sistema nervoso central. Tais danos podem provocar psicose, paralisia e derrames.
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Há muitos indícios de que o novo coronavírus ataca não só os pulmões e o aparelho respiratório humano, como também outros órgãos, e em grande escala. Pode afetar gravemente o coração, os vasos sanguíneos, os nervos, os rins e a pele.
Neurologistas britânicos publicaram os pormenores da investigação na revista "Brain" e sugerem que o vírus SARS-CoV-2 possa causar graves danos cerebrais, mesmo em pacientes com sintomas leves ou em recuperação. Muitas vezes, esses danos não são sequer detetados ou são detetados muito tarde.
Os cientistas da University College London (UCL) diagnosticaram encefalomielite aguda disseminada (ADEM) em nove pacientes britânicos diagnosticados com Covid-19. Esta é uma doença inflamatória que provoca a destruição degenerativa do sistema nervoso central e afeta nervos no cérebro e na medula espinal.
Dimensão dos danos
Entre os 43 pacientes examinados, 12 sofriam de inflamação no sistema nervoso central, dez de encefalopatia transitória (doença cerebral), com sintomas de delírios ou psicose.
Além disso, oito sofreram um acidente vascular cerebral (AVC) e outros oito apresentavam problemas nos nervos periféricos, principalmente com o diagnóstico da Síndrome de Guillain-Barré (SGB) - uma reação imunológica que ataca os nervos e causa paralisia, sendo fatal em 5% dos casos. Uma mulher de 59 anos morreu devido a complicações.
Os cientistas nunca viram outro vírus atacar o cérebro da mesma forma que o vírus causador da Covid-19, comenta o médico Michael Zandi, o autor principal do estudo. Algo incomum são os danos cerebrais graves mesmo em pacientes com sintomas leves.
Danos raramente reconhecidos
Os casos agora publicados confirmam o medo de que a Covid-19 cause problemas de saúde a longo prazo em alguns pacientes. Muitos deles continuam sem fôlego e cansados muito tempo depois da sua recuperação. Outros pacientes em recuperação relatam dormência, fraqueza e problemas de memória.
Biologicamente, a encefalomielite aguda disseminada tem algumas semelhanças com a esclerose múltipla. Porém, é mais grave e geralmente ocorre apenas uma vez. Alguns pacientes ficam com uma incapacidades prolongada, enquanto outros recuperam bem, explica o médico Zandi.
Mas ainda não se conhece todo o espectro de doenças cerebrais e efeitos colaterais de longa duração causados pelo vírus SARS-CoV-2, disse Zandi. Isso porque muitos pacientes nos hospitais estão demasiado doentes para serem examinados com equipamentos cerebrais, ou mesmo outros métodos.
Devido à sobrecarga, os danos neurológicos ou efeitos tardios não são detetados, ou são detetados tarde demais.
Casos chocantes
"Gostaríamos de chamar a atenção dos médicos de todo o mundo para as complicações causadas pelo coronavírus", afirma Zandi. Os médicos e as suas equipas devem consultar sempre um neurologista para tratar os pacientes com sintomas cognitivos, problemas de memória, fadiga, dormência ou fraqueza.
No estudo, também foram publicadas histórias comoventes, como a de uma mulher de 47 anos que, de repente, sentiu dores de cabeça e dormência na mão direita após uma semana de tosse e febre. No hospital, ela cansou-se e deixou de reagir. Durante uma operação de emergência, parte do crânio teve que ser removida para aliviar a pressão no cérebro, já inchado.
Outra paciente de 55 anos, que nunca havia apresentado qualquer doença mental, começou a comportar-se estranhamente um dia depois de deixar o hospital. Vestiu e tirou o casaco repetidas vezes. Começou a ter alucinações - via macacos e leões na sua casa. De volta ao hospital, recebeu medicação antipsicótica.
Gripe espanhola
A gripe espanhola causou a morte de entre 20 e 50 milhões de pessoas, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), com casos de pessoas com danos cerebrais.
Agora, os neurologistas britânicos temem que a Covid-19 possa causar danos, ainda que sutis, no cérebro de alguns pacientes, algo que apenas se perceberá com o passar dos anos.
Segundo o estudo, houve efeitos colaterais duradouros semelhantes aos descobertos naqueles que se recuperaram da devastadora gripe espanhola de 1918 - pelo menos um milhão de pessoas terá ficado com danos cerebrais.
"É claro, esperamos que isso não aconteça, mas quando temos uma pandemia a afetar uma parte tão grande da população, temos de estar atentos", explicou o médico Dr. Michael Zandi.
Antigas crianças-soldado lutam agora contra o coronavírus
A guerra civil na República Centro-Africana (RCA) envolveu milhares de crianças em grupos armados. Aquelas que tiveram a sorte de escapar estão agora a ajudar vizinhos a protegerem-se da pandemia de Covid-19.
Foto: Jack Losh
Coronavírus: Um novo inimigo
Uma equipa de antigas crianças-soldados e crianças de rua cava um poço para beneficiar moradores de um bairro pobre na capital da República Centro-Africana, Bangui. Os jovens ajudam a melhorar a higiene em áreas onde moradores vivem amontoados. O projeto da UNICEF instalou poços para 25 mil pessoas e começou antes de o coronavírus chegar à região. Agora ajuda a RCA a lutar contra a pandemia.
Foto: Jack Losh
Perfuração pela paz
Um jovem pressiona um mecanismo que os seus companheiros giram manualmente para perfurar um poço. O projeto da UNICEF é também uma forma de reabilitação social, porque oferece aos adolescentes um trabalho remunerado enquanto superam o passado violento. Também encoraja a comunidade a aceitá-los de volta. O programa foi criado em 2015, e agora integra o plano de resposta ao coronavírus.
Foto: Jack Losh
Trabalho sujo
Crianças-soldados agacham-se para retirar a terra à mão. Existem mais de 3,9 mil casos confirmados de coronavírus na RCA, embora a limitação de testes no país leve a crer que o número real seja maior. O grupo de trabalho de escavação de poços acelera a instalação de novos tubos e furos a nível nacional. Quase 80% dos lares na RCA não dispõem de instalações para lavagem das mãos.
Foto: Jack Losh
Corações e mentes vencedoras
Crianças reúnem-se para observar a escavação dos poços. As antigas crianças-soldados enfrentam rejeição - o que pode aumentar as suas hipóteses de serem novamente recrutadas. As intervenções que promovem a aceitação são cruciais. Como explicou uma delas: "Este trabalho pode mudar a minha vida. Finalmente tenho algum dinheiro. E estou a ajudar estas comunidades e o meu país".
Foto: Jack Losh
Terra marcada
Sepulturas não marcadas na periferia de Bossangoa, no noroeste da RCA. Civis massacrados no conflito foram enterrados aqui. Após décadas de instabilidade, a guerra eclodiu em 2013, quando uma aliança principalmente muçulmana de grupos rebeldes, a Séléka, varreu o país e derrubou o Presidente. Em resposta, comunidades cristãs e animistas mobilizaram-se para formar as milícias "anti-balaka".
Foto: Jack Losh
Acordo de paz desgastado
Um soldado rebelde da "FPRC" fica de guarda num posto de controlo no norte da RCA. Os rebeldes controlam grande parte do país e - apesar da assinatura de um acordo de paz em fevereiro passado entre o governo e 14 grupos armados - a instabilidade persiste. Nos últimos meses, intensificaram-se confrontos entre grupos armados rivais pelo controlo da zona rica em minerais.
Foto: Jack Losh
"Crianças, não soldados"
Uma placa de sinalização da UNICEF em Bossangoa alerta contra o recrutamento de crianças em conflitos armados. Entre 2014 e 2019, mais de 14,5 mil crianças-soldado foram libertadas das milícias da RCA. No entanto, estima-se que 5,550 crianças permaneçam nas mãos de grupos armados. Muitas são vítimas de abuso sexual, outras são combatentes e outras servem como cozinheiras, guardas ou mensageiras.
Foto: Jack Losh
Educação contra estatísticas
Crianças reúnem-se dentro de uma sala de aula improvisada debaixo de lonas, num acampamento para famílias deslocadas pelo conflito em Kaga Bandoro. Mais de 1,3 milhões de pessoas foram forçadas a deixar suas casas. Em média, uma em cada cinco crianças não frequenta a escola. Mas nas áreas mais afetadas, o número chega a quatro em cada cinco.
Foto: Jack Losh
Civis sitiados
Uma força de manutenção da paz da ONU dirige-se em patrulha por um campo de deslocados na cidade de Bria, no leste, capturada por rebeldes. Uma placa à entrada adverte guerrilheiros sobre a entrada de armas. As condições apertadas e insalubres de campos como estes também aumentam o risco de propagação do coronavírus.
Foto: Jack Losh
Resiliência face à guerra
Os civis sentam-se na parte de trás de um camião enquanto conduzem através do território detido pela facção FPRC no nordeste da RCA. A ONU adverte que o país está muito mal preparado para fazer face a um surto de coronavírus. O conflito complexo e sectário devastou o fraco sistema de saúde da RCA e forçou o pessoal médico a fugir. Atualmente, metade da população depende do apoio humanitário.
Foto: Jack Losh
Uma luta penosa
Uma criança leva água e passa por um soldado das forças de manutenção da paz perto de um campo de deslocados em Bria, uma área controlada por rebeldes. O ACNUR está a instalar pontos de água nos campos e explica aos residentes a importância da lavagem das mãos. Encarregados pela ajuda humanitária advertiram que há pouco recurso para satisfazer as necessidades da população.
Foto: Jack Losh
Tentar manter a paz
Mulheres passam por um veículo blindado da ONU, que foi retido por rebeldes em Kaga Bandoro. Há receios de que a Covid-19 intensifique as tensões entre as comunidades, gerando aumento de preços e paralisando o fornecimento de ajuda. Com as eleições presidenciais marcadas para dezembro, este é um ano crucial para a RCA. Observadores temem que as hostilidades aumentem na campanha eleitoral.
Foto: Jack Losh
Atacar violadores
Os adolescentes jogam futebol num campo de terra, numa área para deslocados em Kaga Bandoro. Embora os números possam ser muito mais elevados, mais de 500 violações graves dos direitos da criança foram relatadas no ano passado. Estão em curso esforços para levar os senhores da guerra à justiça, mas a corrupção generalizada torna tudo mais difícil.
Foto: Jack Losh
Um lampejo de esperança
Antigas crianças-soldados terminam a perfuração do seu novo poço em Bangui. A terapia profissional está fora do alcance de muitos por aqui. Mas projetos como este ajudam a lidar com sentimentos de vergonha e de culpa e a criar uma sensação de normalidade. Embora não seja de modo algum uma solução perfeita, iniciativas de base como esta oferecem às crianças da RCA um pouco mais de esperança.