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CPLP: As promessas por cumprir da Guiné Equatorial

Glória Sousa
31 de outubro de 2016

Advogado equato-guineense critica regime de Teodoro Obiang. Adesão do país à CPLP, cuja XI Cimeira arranca hoje em Brasília, previa a abolição da pena de morte e a introdução da língua portuguesa no país.

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Foto: Alexander Joe/AFP/Getty Images

A introdução da língua portuguesa e a abolição da pena de morte na Guiné Equatorial eram pré-requisitos para adesão do país à Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). O país passou a integrar a comunidade de países lusófonos há dois anos, mas as promessas não foram postas em prática.

O Governo da Guiné Equatorial, por sua vez, diz que chega à XI Cimeira da CPLP, que começa esta segunda-feira (31.10) em Brasília, com os seus deveres cumpridos. Mas o advogado equato-guineense Tutu Alicante diz que é difícil acreditar em avanços. 

O regime de Teodoro Obiang continua a esquivar-se dos compromissos. As mudanças na lei que prevê pena de morte, por exemplo, não devem efetivar-se. "Até à cimeira de Brasília isso exigiria mudanças na constituição, o que é irrealista”, diz o diretor da organização não-governamental EG Justice em entrevista à DW.

Teodoro Obiang, no poder há 37 anosFoto: Getty Images/AFP

Segundo o advogado, a Constituição da Guiné-Equatorial apenas muda se Presidente o quiser e, por isso, o Parlamento não tem papel activo. "Se o Presidente quisesse a abolição da pena de morte teria emitido um decreto presidencial ou proposto ao Congresso uma emenda constitucional”, diz. 

Sob o olhar da comunidade internacional, a cidade de Malabo, capital da Guiné-Equatorial, não tem registos de condenações à pena morte, ao menos desde 2014. O facto não implica que o panorama dos direitos humanos no país seja mais animador, sublinha Tutu Alicante.

Para o advogado, o Governo da Guiné-Equatorial não precisa condenar pessoas à pena capital para matá-las, pois isso é o que faz agora. "Pessoas são mortas sem sentença formal. Há casos diários de detenções arbitrárias e tortura nos postos de polícia e nas cadeias”, relata.

O trabalho de ativistas de direitos humanos, como o de Alfredo Okenve, do Centro de Estudos e Iniciativas para o Desenvolvimento, pode ser perigoso num regime repressivo e fechado. Em entrevista à DW, Okenve diz que a Guiné Equatorial não é um país democrático e que até no seu trabalho está em risco. "Somos vulneráveis, quase não temos apoio nem campo de atuação. Podem fazer conosco o que quiserem”, diz o ativista.

Promessas vazias

O regime de Teodoro Obiang fez promessas vazias. Ratificou várias convenções e adoptou mais de duzentas recomendações das Nações Unidas, comprometeu-se a cumprir com as tarefas de adesão à CPLP, mas nunca aplicou o que prometeu e ninguém ousa pedir contas a Malabo.

Com a adesão à CPLP nada melhorou no país. O diretor da organização EG Justice não acredita que a comunidade lusófona traga benefícios em termos de direitos humanos. "É óbvio que a CPLP não quer saber de direitos humanos", diz.

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Segundo Tutu Alicante, já foi pedida até mesmo uma delegação para apurar violações e averiguar a democracia no seu país que, conforme relata, não existe. "Não há partidos da oposição nem liberdade. O Presidente ganhou as eleições com 94-95%. Se a CPLP realmente se importasse em defender os direitos humanos, talvez a admissão na comunidade pudesse ser uma oportunidade", complementa.

De acordo com Alicante, a população questiona se a CPLP estaria apenas interessada em benefícios económicos com a Guiné Equatorial. O advogado equato-guineense diz ainda que um filho do Presidente, Gabriel Obiang, investiu altos valores no Banco Espírito Santo quando a instituição tinha problemas financeiros. Para o advogado, trata-se de uma situação em que tentam proteger os negócios, sem se considerar os direitos humanos, a democracia e a corrupção.

Nem as escolas de samba são imunes às críticas do advogado, que relembra um caso de 2015, em que o vice-presidente e também filho do Presidente da Guiné Equatorial, Teodorin Obiangs, teria doado três milhões de dólares à Beija-Flor, uma escola de samba brasileira. Segundo relata, o facto teria sido revelado numa investigação jornalística que denunciou a entrada ilegal do dinheiro no Brasil através de uma empresa desse mesmo país a operar na Guiné Equatorial. "É óbvio que há lavagem de dinheiro”, diz Tutu Alicante.

Língua portuguesa

O ensino da língua portuguesa, a segunda promessa da Guiné-Equatorial para adesão à CPLP, também não avançou no país, que é o único em África com o idioma oficial espanhol.

Quanto às escolas privadas, Alicante diz não saber se há esforços para aprendizado do idioma, mas não se promove a língua portuguesa em escolas do Estado.

"A situação da educação na Guiné Equatorial no geral é deplorável. Se o Governo não promove sequer a educação básica e nega a educação a muitas raparigas, encorajando até mesmo o aborto, imagine-se o que se passa em relação às línguas estrangeiras", questiona o advogado.

O regime da Guiné Equatorial mantém as aparências pelos noticiários da televisão nacional em português, mas Tutu Alicante mantém críticas à entrada do país na comunidade de países lusófonos. "A adesão da Guiné-Equatorial põe em risco a reputação da CPLP", conclui.

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