Crescente repressão está a causar o êxodo dos africanos
AFP | tms
6 de maio de 2017
Aumento da repressão estatal e falta de oportunidades para os cidadãos são os principais motivos para crescente êxodo do continente africano, segundo organização britânica.
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Os países africanos estão se tornando cada vez mais repressivos e fazendo com que mais pessoas deixem suas casas, afirmou a organização britânica Oxfam esta semana, enquanto a Alemanha alertou sobre o efeito desestabilizador que a migração está a causar em África.
A liberdade política e o problema da evasão de talentos de África estavam entre os principais temas da agenda do Fórum Económico Mundial sobre África, realizado em Durban, na África do Sul, e que terminou esta sexta-feira (05.05).
A diretora-executiva da Oxfam, Winnie Byanyima, disse que "as leis repressivas sobre liberdade de associação e expressão" foram "um motor da migração".
O ministro das Finanças da Alemanha, Wolfgang Schaeuble, alertou que "se não conseguirmos estabilizar o continente africano nos próximos anos e décadas, enfrentaremos riscos geopolíticos cada vez maiores", incluindo mais migrantes na Europa.
O Presidente da África do Sul, Jacob Zuma, que organizou o fórum, descreveu o tratamento da migração como um dos "desafios críticos que o mundo enfrenta".
Falta oportunidades para os africanos
O número total de migrantes em todo o mundo atingiu 244 milhões em 2015, e entre eles um recorde de 63 milhões foram forçados a deixar suas casas, incluindo refugiados, pessoas deslocadas dentro de seus próprios países e requerentes de asilo, alertou esta sexta-feira o Programa Mundial de Alimentos.
Byanyima disse que as saídas maciças de África são uma realidade que diz muito sobre o desempenho da classe política do continente. "Essa é a avaliação que fazemos sobre a liderança política que temos em África, que falha ao não criar oportunidades económicas para seu povo", disse ela à agência de notícias AFP.
"Em muitos desses países você tem regimes ilegítimos repressivos que gastam o dinheiro que deve ir para capacitar seus povos em sistemas de segurança, em monitorar seus cidadãos, em oposições e em silenciar meios de comunicação", ressaltou a diretora-executiva da Oxfam.
Uma pesquisa recente da CIVICUS, que monitora as liberdades em todo o mundo, descobriu que apenas dois países africanos estavam totalmente abertos – as nações insulares de Cabo Verde e São Tomé e Príncipe. Nenhum país do continente africano foi considerado livre.
Cooperação dos países ricos
Byanyima também criticou os governos ricos que desviaram seus orçamentos de ajuda para cobrir os custos das chegadas de refugiados.
Níger: país de trânsito
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"Os países ricos devem parar de reorientar a ajuda, devem manter a ajuda para os países afetados pelo conflito e não devem desviá-la para atender os custos dos refugiados em seus países ou suas necessidades de segurança".
"Se eles ajudam a tornar os países estáveis, para alcançar um crescimento inclusivo, então as pessoas não vão querer deixar suas casas. A cooperação para o desenvolvimento é uma ferramenta para a paz e a estabilidade", acrescentou.
O risco da migração
Só este ano, mais de mil migrantes morreram fazendo a perigosa passagem da Líbia para a Itália, pelo Mar Mediterrâneo, segundo a agência da ONU para os refugiados. No ano passado, houve cerca de 5 mil mortes.
Mais de 36.700 pessoas foram resgatadas e levadas para a Itália este ano, de acordo com a Organização Internacional para as Migrações, um aumento de quase 45% em comparação com o mesmo período do ano passado.
Pelo menos 150 dos mortos eram crianças, embora a cifra seja provavelmente maior, já que muitos migrantes menores de idade viajam desacompanhados, de modo que suas mortes frequentemente não são reportadas, de acordo com a UNICEF.
Milhares de migrantes atravessam Níger rumo à Europa
São jovens oriundos da África Ocidental e fazem tudo para chegar à Europa. Estão mesmo dispostos a arriscar a vida, atravessando o deserto, rumo ao Mediterrâneo. Mas nem todos são bem sucedidos.
Foto: DW/A. Cascais
Apoio aos "menos bem sucedidos"
Em Niamey existe um centro de acolhimento da Organização Internacional para as Migrações (OIM). Aqui são acolhidos os jovens "revenants", que não conseguiram atravessar o deserto e se veem obrigados a regressar aos seus países de origem. A OIM, que faz parte do sistema das Nações Unidas, dá-lhes abrigo provisório, alimentação e apoio na obtenção de passaportes e outros documentos.
Foto: DW/
À espera do regresso a casa
Os jovens que procuram apoio no centro da OIM vêm dos mais diferentes países: Guiné-Conacri, Mali, Senegal, Gâmbia ou Guiné-Bissau, movidos sobretudo por objetivos económicos. Muitos tiraram cursos superiores, mas não arranjam trabalho. Muitas famílias apostam na emigração de pelo menos um filho. Caso esse filho seja bem sucedido poderá eventualmente apoiar economicamente o resto da família.
Foto: DW/A. Cascais
Frustrados por terem falhado a Europa
Muitos investiram todas as suas economias, pediram dinheiro a familiares e perderam tudo. Agora esperam pelo regresso aos seus países com a sensação de terem sofrido grandes derrotas pessoais. Os assistentes sociais falam de casos em que os jovens não se atrevem a voltar ao seio das suas famílias, "por sentirem vergonha". Precisam de apoio psicológico, mas esse apoio não existe.
Foto: DW/A. Cascais
Otimismo apesar das derrotas
Alguns dos migrantes sofrem lesões e contraem doenças durante a travessia do deserto, mas mesmo assim não perdem o ânimo. Em muitos casos, os jovens tentam várias vezes, ao longo da vida, atingir a terra prometida: a Europa. Muitos nunca o conseguem, mas não perdem o otimismo. Em 2016, a OIM prestou apoio a mais de 6 mil "revenants" - migrantes que não foram bem sucedidos no Níger.
Foto: DW/A. Cascais
Espancado na Líbia
Dumbya Mamadou, de 26 anos de idade, oriundo do Senegal, conseguiu atingir a Líbia, depois de uma "odisseia de 5 dias e 5 noites" pelo deserto do Níger. Mas na Líbia foi maltratado. "Os líbios apontaram-me armas e espancaram-me, não têm respeito pelo ser humano", afirma o jovem. Dumbya volta ao seu país de origem com um sentimento de derrota: "Queria estudar na Europa, agora não sei o que fazer".
Foto: DW/
Roubado no Burkina Faso
Mamadou Barry, de 21 anos, oriundo da Guiné-Conacri, tinha um sonho: aplicar em França os seus conhecimentos de marketing e os seus talentos musicais. Mas a viagem rumo à Europa correu-lhe mal. "Fui roubado no Burkina Faso, o primeiro país pelo qual passei", conta. Mesmo assim, Mamadou aprendeu uma grande lição para a vida: "coisas que nunca teria aprendido se nunca tivesse saído de Conacri".
Foto: DW/A. Cascais
Rap contra a frustração
Mamadou Barry tenta digerir as suas derrotas e decepções através da música. Há três anos que o jovem canta e interpreta temas de rap e hiphop de sua autoria. O seu último tema foi escrito em Niamey, capital do Níger, e tem a seguinte letra: "A migração arrasou-me / e ninguém me pode consolar / O Mar Mediterrâneo já matou muitos / e nós cá continuamos: sem comida, sem cama, sem saúde".
Foto: DW/
Central de autocarros de Niamey: uma placa giratória
É da estação de autocarros de Niamey que partem diariamente centenas de furgonetas, muitas delas repletas de jovens migrantes, em direção ao norte. Os migrantes tornaram-se um fator relevante para a economia do Níger. Há muita gente que ganha a sua vida prestando diversos serviços aos migrantes: viagens pelo deserto, alimentação e mesmo cuidados médicos.
Foto: DW/A. Cascais
Mais migrantes tentam atravessar deserto do Níger
O número de migrantes que viajam através dos vastos territórios desérticos do Níger para chegar ao norte da África e à Europa não pára de aumentar, tendo alcançado os 200 mil em 2016, segundo estimativas do escritório da Organização Internacional para as Migrações. Outras fontes falam de 10 mil migrantes que atravessam o Níger por semana. A situacão geográfica do Níger é o fator determinante.
Foto: DW/A. Cascais
Agadez, o "olho da agulha"
Agadez, cidade desértica no Níger, é um dos principais pontos de trânsito no Saara para os imigrantes em fuga de nações empobrecidas do oeste da África. As "máfias" do tráfico humano têm beneficiado do caos na Líbia para transportar dezenas de milhares de pessoas para o continente europeu em embarcações precárias. Os migrantes muitas vezes sofrem abusos dos passadores.