Crianças de rua de Kinshasa no Festival de Cinema de Berlim
Annabelle Steffes-Halmer | ck
23 de fevereiro de 2018
"Maki'La" é o primeiro filme da realizadora Machérie Ekwa Bahango. Retrata a vida difícil das crianças de rua na capital da República Democrática do Congo. A estreia foi no Festival de Cinema de Berlim, a Berlinale.
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Machérie Ekwa Bahango é um nome a reter. Com apenas 24 anos, a realizadora veio à capital alemã assistir à estreia mundial do seu primeiro filme, "Maki'La" no Festival de Cinema de Berlim. Na sala esgotada da Academia das Artes, o público acolheu calorosamente a longa-metragem que retrata a vida difícil das crianças de rua de Kinshasa, na República Democrática do Congo.
Bahango conta a história de Maki, de 19 anos, que abandona o seu marido por causa da violência e das eternas discussões. Mas quando desenvolve uma relação de amizade com a jovem Aicha, o marido ciumento persegue as duas pelas ruas de Kinshasa.
200 mil crianças de rua
"Queria fazer um filme sobre um tema que tem impacto na sociedade", afirma a realizadora em entrevista à DW. "Conheci um grupo de crianças de rua de quem me tornei muito amiga, e aprendi que temos os mesmos sonhos. O meu filme rende-lhes homenagem."
"Maki'La" não retrata apenas o lado duro e violento da vida na rua, mas também do amor e da amizade. No entanto, não esconde a realidade, que torna os 200 mil jovens e crianças que vivem nas ruas da capital congolesa vítimas e perpetradores de violência, violações roubos e droga.
Autodidata
A realizadora Machérie Ekwa Bahango é uma autodidata. Aprendeu a fazer filmes na Internet e foi também aqui que conseguiu os primeiros contactos com potenciais colaboradores. Levou três anos para concluir a sua primeira obra com a ajuda do pai, que lhe emprestou o capital inicial. Aos poucos conseguiu convencer produtores a investir no projeto. A estreia mundial em Berlim foi um alívio.
Crianças de rua de Kinshasa na Berlinale
"Mas não me teria sentido tão aliviada sem a receção calorosa do público alemão", diz. "Estava muito nervosa quando vi tanta gente. A sala estava cheia, não havia um lugar. Fiquei à espera de ver pessoas sair a meio do filme, mas todos ficaram até ao fim."
O despertar do cinema congolês?
A história de Bahango parece mais algo que acontece em Hollywood do que no Congo, que praticamente não tem uma indústria cinematográfica. Mas Bahango acredita no seu país e nos jovens que, como ela, têm a paixão pelos filmes e considera que, juntos, serão capazes de fazer produções congolesas sobretudo para um público congolês. A jovem realizadora diz que ficou profundamente marcada pela experiência dos últimos três anos.
"Nem sei como dizer obrigada à minha equipa", comenta. "Os técnicos e os atores trataram-me com um carinho enorme. Apesar do filme ter demorado três anos a realizar, todos estiveram sempre à minha disposição. Faria qualquer coisa por eles."
Nota-se que fica comovida quando pensa na sua equipa. Mas também é evidente o orgulho de ter provado que vale a pena lutar pelos seus sonhos.
Cinemas únicos em Angola
São obras únicas vistas pela lente do fotógrafo angolano Walter Fernandes - cinemas e cine-esplanadas desconhecidos de muitos. As fotos foram reunidas em livro e estão em exposição em Lisboa, a partir desta semana.
Foto: Walter Fernandes/Goethe-Institut Angola
"Uma ficção da liberdade"
O Cine Estúdio do Namibe inspira-se nas obras do arquiteto Oscar Niemeyer. É um dos edifícios únicos de Angola destacados no livro "Angola Cinemas - Uma Ficção da Liberdade" e fotografados por Walter Fernandes. Esta é uma das imagens em exposição no Goethe-Institut de Lisboa que revelam uma arquitetura desconhecida por muitos de cinemas construídos antes do fim do domínio colonial português.
Foto: Walter Fernandes/Goethe-Institut Angola
Património mal preservado
O Cine Tômbwa, também no Namibe, obedece a uma lógica de salas fechadas, mas já apresentava algumas linhas mais modernas. Segundo o fotógrafo Walter Fernandes, o edifício foi construído com materiais "sui generis". Mas o património herdado está muito mal preservado, lamenta o angolano.
Foto: Walter Fernandes/Goethe-Institut Angola
Moçâmedes: A pérola do Namibe
No Cine-Teatro Namibe (antigo Moçâmedes) nota-se bastante a influência da arquitetura do regime ditatorial português, o Estado Novo. Este é considerado um dos cinemas angolanos mais antigos e também aparece no livro "Angola Cinemas - Uma Ficção da Liberdade", apadrinhado pelo Goethe-Institut em Luanda e pela editora alemã Steidl.
Foto: Walter Fernandes/Goethe-Institut Angola
Conceito futurista
O arquiteto Botelho Pereira não só desenhou o Cine Estúdio do Namibe, como também o Cine Impala. Botelho Pereira inspirou-se no movimento deste antílope e planeou espaços abertos e arejados, de forma futurista. O livro "Angola Cinemas - Uma Ficção da Liberdade" também destaca estas cine-esplanadas, que ganharam popularidade a partir de 1960 por se adaptarem mais ao clima tropical do país.
Foto: Walter Fernandes/Goethe-Institut Angola
Cinema-esplanada para as elites
Este é um dos cinemas preferidos de Miguel Hurst, um dos editores do livro "Angola Cinemas". Foi aqui, no Cine Kalunga, em Benguela, que se pensou em fazer a obra. Cine-esplanadas como esta adequavam-se mais ao clima, mas serviam também um propósito do regime português - criar locais de convívio entre as populações locais e os colonos. A elite branca e a pequena burguesia negra vinham aqui.
Foto: Walter Fernandes/Goethe-Institut Angola
A "grande sala"
A "grande sala" de Benguela era o Monumental - pelo menos, ganhou essa reputação. Os colonizadores portugueses construíram o Cine-Teatro nesta cidade costeira pois evitavam o interior do país - normalmente, as companhias portuguesas só atuavam nas grandes cidades da costa angolana.
Foto: Walter Fernandes/Goethe-Institut Angola
Imperium: "Art decó" em Benguela
Aqui, são imediatamente visíveis traços da passagem da "art decó" (um estilo artístico de caráter decorativo que se popularizou na Europa nos anos 20) para o modernismo. O interior do Cine Imperium, fotografado por Walter Fernandes, representa bem essa mistura estética, com os cubos, retas, círculos e janelas. Benguela tinha várias salas, porque era das províncias mais populosas de Angola.
Foto: Walter Fernandes/Goethe-Institut Angola
O arquiteto que pensava as cidades
Este é o interior do Cine Flamingo: mais uma pérola da província de Benguela. A parte de trás é uma esplanada. Sentado, o espetador está em contacto com a natureza, mas não está exposto. Até hoje, a estrutura mantém-se, mas o espaço está um pouco vandalizado. Miguel Hurst sublinha a importância de manter obras como esta do arquiteto Francisco Castro Rodrigues, um homem que pensava cidades.
Foto: Walter Fernandes/Goethe-Institut Angola
Primeiro cine-teatro de Angola
"O Nacional" Cine-Teatro foi a primeira sala construída em Luanda, no início do Estado Novo, nos anos 40. Esta é uma das imagens patentes na exposição no Goethe-Institut em Lisboa. A mostra pretende ser "um testemunho do modo como estes edifícios constituíam um enquadramento elegante que sublinhava uma simples ida ao cinema, promovendo assim a reflexão sobre esta herança sociocultural e afetiva."
Foto: Walter Fernandes/Goethe-Institut Angola
Memória para gerações futuras
Os irmãos Castilho são os principais responsáveis pela introdução das cine-esplanadas em Angola. A primeira da sua autoria foi o Miramar, encostado a uma ribanceira virada para o mar em Luanda. Depois surgiu o Atlântico, na foto. Para os autores do livro "Angola Cinemas - Uma Ficção da Liberdade", este é um documento de memória que pode ser útil para as futuras gerações.