Crise económica angolana agravou ocupação ilegal de terras
Cristiane Vieira Teixeira (Berlim)
9 de dezembro de 2017
A Federação Luterana Mundial aposta na capacitação da população rural em matéria de legislação, para que possa defender as suas propriedades.
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Em Berlim, onde participou na conferência de dois dias sobre Angola, que terminou esta sexta-feira (08.12), Malungo Germano, oficial de advocacia da Federação Luterana Mundial (FLM), revelou casos de usurpação de terra na província do Moxico e o que a organização tem feito para combater o problema.
Em 2016, numa tentativa de superar a crise e ganhar independência da cotação internacional do petróleo, o Governo angolano apontou a agricultura como um dos principais setores para a diversificação da economia.
Malungo Germano diz que a decisão do Executivo angolano é positiva para o país, mas resultou em consequências graves para a população rural de Angola.
"As pessoas estão a ocupar os terrenos para poder investir na agricultura. Então, foram observadas ocupações ilegais de terrenos. [As pessoas apresentam] um documento, obrigando o chefe tradicional a assinar ou dizem: Esta parte, a partir de hoje, é para mim. Você, a população, deve sair", explica.
Usurpação de terras
A Federação Luterana Mundial (FLM) é uma organização não-governamental (ONG) que se ocupa de questões relacionadas com a terra, presente há mais de 25 anos em Angola.
Angola Terra OL - MP3-Stereo
Na província do Moxico, a organização acompanha as populações dos municípios de Léua, Lumeje/Cameia e Camanongue. Neste último, o projeto agrícola estatal Camaiangala deixou cerca de 250 famílias sem terra e sem moradia, descreve Malungo Germano.
"As pessoas foram obrigadas a sair de lá para eles ocuparem e começarem a trabalhar. O problema é que os produtos agrícolas produzidos lá não aparecem no mercado local e não estão a honrar as promessas que fizeram, construir casas e melhorar a vida da população local. O interesse é só para eles. É isso que está a criar problemas naquelas populações", revela o oficial da FLM.
Malungo Germano considera como "agravante" que, no caso da província do Moxico, a maioria dos casos de usurpação de terra tem como atores os próprios "filhos do país".
"Um diretor, um ministro, família que tem peso no país, um general, ou o próprio Estado [são os responsáveis] pela maior parte das ocupações ilegais que se verificam lá", critica Malungo Germano.
Aposta na capacitação
Para tentar mudar a situação, a Federação Luterana Mundial está a capacitar as populações em direitos humanos, Lei da Terra e advocacia para que consigam defender as suas propriedades por meios legais.
"Para eles [os populares] saberem como advogar os seus direitos. Estamos também a ensinar as pessoas a saber quais são os critérios para se receber um terreno, para elas terem uma ideia de como as coisas funcionam e conseguirem reivindicar, quando há uma violação", considera.
Além do apoio às vítimas, a organização faz também a mediação junto às instituições estatais responsáveis e conseguiu que as famílias de Camanongue recebessem a atenção da justiça angolana.
"O Procurador-Geral da República recebeu o caso, encaminhou ao procurador-provincial. Ele próprio falou face a face com a população e, depois, disse que deve haver uma indemnização. Encaminhou o caso para a Provedoria da Justiça. Agora estamos à espera", explica Malungo Germano.
Que esperar do novo Presidente?
O trabalho da Federação Luterana Mundial no Moxico é apoiado pela ONG alemã Brot für die Welt ou, em português, Pão para o Mundo.
Petra Aschoff, responsável da ONG, regressou recentemente de Angola e está otimista. Para ela, a postura do novo Presidente angolano já está a resultar para as populações rurais.
"Com o novo discurso do Presidente, muita gente dentro das administrações municipais está a apoiar mais a população e, só agora, os primeiros processos de delimitação das terras comunitárias estão a ser realizados", descreve Aschoff.
"Significa que você precisa claramente ter conhecimento das leis, mas também de uma situação política que aceita que as pessoas dentro das administrações, que realizem o que é possível na base da lei", conclui.
Mesmo sem a Sonangol, Isabel dos Santos ainda tem um império empresarial
A mulher mais rica de África, filha do ex-Presidente José Eduardo dos Santos, foi exonerada da liderança da petrolífera estatal angolana. Mas continua a ter uma grande influência económica em Angola e Portugal.
Foto: DW/P. Borralho
Bilionária angolana diz adeus à Sonangol
A 15 de novembro, Isabel dos Santos teve de renunciar à presidência do conselho de administração da Sonangol. Em meados de 2016, o seu pai, o então Presidente José Eduardo dos Santos, nomeou-a para liderar a companhia petrolífera estatal. A nomeação era ilegal aos olhos da lei angolana. O novo Presidente angolano, João Lourenço, estava, por isso, sob pressão para demitir Isabel dos Santos.
Foto: picture-alliance/dpa
Carreira brilhante à sombra do pai
Isabel dos Santos, filha de José Eduardo dos Santos e da sua primeira mulher, a jogadora de xadrez russa Tatiana Kunakova, nasceu em 1973, em Baku. Durante o regime do seu pai, no poder entre 1979 e 2017, Isabel dos Santos conseguiu construir um império empresarial. Em meados de 2016, a liderança da Sonangol, a maior empresa de Angola, entrou para o seu currículo.
Foto: picture-alliance/dpa
Conversão aos princípios "dos Santos"
Isabel dos Santos converteu o grupo Sonangol, sediado em Luanda (foto), às suas ideias. Nomeou cidadãos portugueses da sua confiança para importantes cargos de gestão e foi muito criticada pela ausência de angolanos em posições-chave na empresa.
Foto: DW/N. Sul d'Angola
Presença firme nas telecomunicações
Mesmo após o fim da sua carreira na Sonangol, Isabel dos Santos continua forte no meio empresarial: possui 25% da UNITEL desde o seu lançamento, em 2001, a empresa tornou-se a principal fornecedora de serviços móveis e de internet em Angola. Através da UNITEL, dos Santos conseguiu estabelecer vários contactos comerciais e parcerias com outras empresas internacionais, como a Portugal Telecom.
Foto: DW/P. Borralho
Redes móveis em Portugal e Cabo Verde
Isabel dos Santos detém a participação maioritária na ZON, a terceira maior empresa de telecomunicações de Portugal, através de uma sociedade com o grupo português Sonae. Também em Cabo Verde, dos Santos - com uma fortuna estimada em 3,1 mil milhões de dólares, segundo a revista Forbes - está presente nas telecomunicações com a subsidiária UNITEL T+.
Foto: DW/J. Carlos
Expansão com a televisão por satélite
Lançada em 2010 por Isabel dos Santos, a ZAP Angola apresenta-se como o maior fornecedor de televisão por satélite no país. Desde 2011, a ZAP está presente também em Moçambique, onde conquistou uma parcela importante do setor. Em Moçambique, a empresa compete com o antigo líder de mercado, a Multichoice (DSTV), da África do Sul.
Foto: DW/P. Borralho
Bancos: o segundo pilar do império
Atrás das telecomunicações, o setor financeiro é o segundo pilar do império empresarial de Isabel dos Santos. A empresária detém o banco BIC juntamente com o grupo português Américo Amorim - o empresário português conhecido como "o rei da cortiça" que morreu em julho de 2017. É um dos maiores bancos de Angola, com cerca de 200 agências. É também o único banco angolano com agências em Portugal.
Foto: DW/P. Borralho
Com a GALP no negócio do petróleo
Também no petróleo, dos Santos fez parceria com Américo Amorim. Através da empresa Esperanza Holding B.V., sedeada em Amesterdão, a empresária angolana está envolvida na Amorim Energia que, por sua vez, é a maior acionista da petrolífera portuguesa GALP. A GALP também administra os postos de gasolina em Moçambique (na foto) e em Angola onde, curiosamente, compete com a Sonangol.
Foto: DW/B.Jequete
Supermercado em Luanda
Em 2016, abriu em Luanda o Avennida Shopping, um dos maiores centros comerciais da capital angolana. Várias empresas do império dos Santos operam neste centro comercial, como o Banco BIC, a ZAP e a UNITEL. Assim, a empresária beneficia em várias frentes do crescente mercado de bens de consumo em Luanda.
Foto: DW/P. Borralho
350 milhões de dólares em supermercados
Uma das maiores lojas do Avennida Shopping é o hipermercado Candando. É operado pelo grupo Contidis, controlado por Isabel dos Santos. Nos próximos anos, deverão ser construídos em Angola vários Candando. No total, a Contidis quer investir mais de 350 milhões de dólares nas filiais.