A Argélia foi acusada de ter abandonado no deserto, durante meses, dezenas de milhares de refugiados. Sobreviventes dizem que muitas pessoas morreram. Autoridades negam violação dos direitos humanos.
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Dezenas de milhares de emigrantes e refugiados terão sido alegadamente transportados pelas forças de segurança argelinas para o deserto do Ténéré e abandonados à sua sorte no meio do nada, sem água, nem alimentos.
Os refugiados contam que os soldados argelinos lhes roubaram os telemóveis e dinheiro. Ju Dennis é um dos sobreviventes. Teve sorte: a sua marcha pelo deserto terminou na pequena aldeia nigerina de Assamaka, onde recebeu assistência.
Daqui, muitos africanos tentam chegar à Europa com a ajuda de passadores. Mas houve quem não resistisse às condições do deserto, diz Dennis. "Tivemos que andar seis ou sete horas. Já nem sentia as minhas pernas. Cheguei ao fim das minhas forças".
"Condições terríveis", diz OIM
Embora a imprensa internacional só agora se tenha apercebido da situação, a prática é conhecida da Organização Internacional de Migrações (OIM) há muito, segundo a porta-voz Florence Kim: "Refiro-me a pessoas que foram abandonadas no deserto a 30 quilómetros de qualquer civilização. Desde setembro, contabilizámos 10 mil nigerianos nesta situação".
Não são apenas homens, acrescenta: "Também mulheres grávidas, crianças, menores não acompanhados, refugiados. As condições são terríveis. Muitos morrem".
O seu colega no local, Alhoussan Adouwal, percorre frequentemente a fronteira com a Argélia à procura de pessoas que precisem de ajuda. Adouwal aponta para o horizonte e abana a cabeça. Diz que há bebés e grávidas entre os refugiados Chegam aos milhares, acrescenta, é uma verdadeira catástrofe.
Jante Kamara é uma sobrevivente. O filho que levava na barriga não. "O meu bebé morreu, foi assassinado. Tantos homens e mulheres morreram no caminho. Não tínhamos água. Morreram à sede. Alguns perderam-se".
Autoridades negam violações
Crise migratória na Argélia: Morrer no deserto
As autoridades argelinas negam ter violado direitos humanos. Dizem que a Argélia age em conformidade com as leis e que respeita a dignidade humana. A deportação de migrantes é feita de comum acordo com os países vizinhos.
No entanto, organizações de defesa dos direitos humanos criticam com muita frequência a forma como a Argélia lida com refugiados e migrantes.
A mão pesada de Argel é uma reacção ao número crescente de refugiados no país. Desde o encerramento quase completo da fronteira líbia, há mais pessoas que vêm par a Argélia onde ficam retidas. Para as autoridades argelinas, elas são uma ameaça à ordem pública.
Mas, se a indignação é grande na imprensa, a elite política na Europa praticamente não se manifesta. Bruxelas admite que está ciente do procedimento da Argélia. Mas estados soberanos têm o direito de expulsar migrantes, desde que cumpram a lei internacional, afirma-se na capital da União Europeia. Ao mesmo tempo, a União Europeia quer abrir centros para refugiados e requerentes a asilo nos estados do Magreb.
Milhares de migrantes atravessam Níger rumo à Europa
São jovens oriundos da África Ocidental e fazem tudo para chegar à Europa. Estão mesmo dispostos a arriscar a vida, atravessando o deserto, rumo ao Mediterrâneo. Mas nem todos são bem sucedidos.
Foto: DW/A. Cascais
Apoio aos "menos bem sucedidos"
Em Niamey existe um centro de acolhimento da Organização Internacional para as Migrações (OIM). Aqui são acolhidos os jovens "revenants", que não conseguiram atravessar o deserto e se veem obrigados a regressar aos seus países de origem. A OIM, que faz parte do sistema das Nações Unidas, dá-lhes abrigo provisório, alimentação e apoio na obtenção de passaportes e outros documentos.
Foto: DW/
À espera do regresso a casa
Os jovens que procuram apoio no centro da OIM vêm dos mais diferentes países: Guiné-Conacri, Mali, Senegal, Gâmbia ou Guiné-Bissau, movidos sobretudo por objetivos económicos. Muitos tiraram cursos superiores, mas não arranjam trabalho. Muitas famílias apostam na emigração de pelo menos um filho. Caso esse filho seja bem sucedido poderá eventualmente apoiar economicamente o resto da família.
Foto: DW/A. Cascais
Frustrados por terem falhado a Europa
Muitos investiram todas as suas economias, pediram dinheiro a familiares e perderam tudo. Agora esperam pelo regresso aos seus países com a sensação de terem sofrido grandes derrotas pessoais. Os assistentes sociais falam de casos em que os jovens não se atrevem a voltar ao seio das suas famílias, "por sentirem vergonha". Precisam de apoio psicológico, mas esse apoio não existe.
Foto: DW/A. Cascais
Otimismo apesar das derrotas
Alguns dos migrantes sofrem lesões e contraem doenças durante a travessia do deserto, mas mesmo assim não perdem o ânimo. Em muitos casos, os jovens tentam várias vezes, ao longo da vida, atingir a terra prometida: a Europa. Muitos nunca o conseguem, mas não perdem o otimismo. Em 2016, a OIM prestou apoio a mais de 6 mil "revenants" - migrantes que não foram bem sucedidos no Níger.
Foto: DW/A. Cascais
Espancado na Líbia
Dumbya Mamadou, de 26 anos de idade, oriundo do Senegal, conseguiu atingir a Líbia, depois de uma "odisseia de 5 dias e 5 noites" pelo deserto do Níger. Mas na Líbia foi maltratado. "Os líbios apontaram-me armas e espancaram-me, não têm respeito pelo ser humano", afirma o jovem. Dumbya volta ao seu país de origem com um sentimento de derrota: "Queria estudar na Europa, agora não sei o que fazer".
Foto: DW/
Roubado no Burkina Faso
Mamadou Barry, de 21 anos, oriundo da Guiné-Conacri, tinha um sonho: aplicar em França os seus conhecimentos de marketing e os seus talentos musicais. Mas a viagem rumo à Europa correu-lhe mal. "Fui roubado no Burkina Faso, o primeiro país pelo qual passei", conta. Mesmo assim, Mamadou aprendeu uma grande lição para a vida: "coisas que nunca teria aprendido se nunca tivesse saído de Conacri".
Foto: DW/A. Cascais
Rap contra a frustração
Mamadou Barry tenta digerir as suas derrotas e decepções através da música. Há três anos que o jovem canta e interpreta temas de rap e hiphop de sua autoria. O seu último tema foi escrito em Niamey, capital do Níger, e tem a seguinte letra: "A migração arrasou-me / e ninguém me pode consolar / O Mar Mediterrâneo já matou muitos / e nós cá continuamos: sem comida, sem cama, sem saúde".
Foto: DW/
Central de autocarros de Niamey: uma placa giratória
É da estação de autocarros de Niamey que partem diariamente centenas de furgonetas, muitas delas repletas de jovens migrantes, em direção ao norte. Os migrantes tornaram-se um fator relevante para a economia do Níger. Há muita gente que ganha a sua vida prestando diversos serviços aos migrantes: viagens pelo deserto, alimentação e mesmo cuidados médicos.
Foto: DW/A. Cascais
Mais migrantes tentam atravessar deserto do Níger
O número de migrantes que viajam através dos vastos territórios desérticos do Níger para chegar ao norte da África e à Europa não pára de aumentar, tendo alcançado os 200 mil em 2016, segundo estimativas do escritório da Organização Internacional para as Migrações. Outras fontes falam de 10 mil migrantes que atravessam o Níger por semana. A situacão geográfica do Níger é o fator determinante.
Foto: DW/A. Cascais
Agadez, o "olho da agulha"
Agadez, cidade desértica no Níger, é um dos principais pontos de trânsito no Saara para os imigrantes em fuga de nações empobrecidas do oeste da África. As "máfias" do tráfico humano têm beneficiado do caos na Líbia para transportar dezenas de milhares de pessoas para o continente europeu em embarcações precárias. Os migrantes muitas vezes sofrem abusos dos passadores.