Moçambique: CIP defende recuperação de ativos ilícitos
Leonel Matias (Maputo)
14 de maio de 2019
Conferência internacional, em Maputo, defendeu esta terça-feira (14.05) a criação de uma lei para a recuperação de ativos ilícitos. Economista pediu "fim do secretismo" da PGR na investigação sobre as dívidas ocultas.
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A conferência foi promovida pelo Centro de Integridade Pública (CIP) de Moçambique para debater a questão da gestão dos ativos, incluindo formas conducentes a sua recuperação a nível nacional e internacional, bem como o seu repatriamento para o país.
O diretor do CIP, Edson Cortes, disse que este debate é importante porque a corrupção, acima de tudo, envolve sérios prejuízos, tanto para o Estado como para os moçambicanos.
"O principal objetivo foi falar sobre a recuperação de ativos, num contexto em que a corrupção em Moçambique atinge níveis preocupantes e, apesar de continuar a haver alguns sinais de detenção dos indivíduos nesses casos, o Estado continua a recuperar muito pouco dinheiro ou quase nenhum".
Dívidas ocultas: Conferência defende lei de recuperação de ativos ilícitos
Para o bastonário da Ordem dos Advogados, Flávio Menete, a prisão dos envolvidos nesses casos não resolve o problema. Segundo Menete, há uma tendência de "sofisticar" as estratégias do crime de corrupção "sempre que [o corrupto] sinta que há impunidade ou que é possível a posterior beneficiar do produto do crime".
"Acho que dói mais a quem comete um crime de corrupção ter que perder a totalidade dos bens e quiçá ter que trabalhar para assegurar uma indemnização a quem tiver sofrido danos em resultado da sua atuação", disse Flávio Menete.
Recuperação de ativos
O bastonário da Ordem dos Advogados de Moçambique defendeu ainda a criação urgente de uma unidade de recuperação de ativos dotada de pessoal e meios à altura, assim como com poderes e prerrogativas conferidos pelo Parlamento para identificar, localizar e recuperar ativos resultantes da atividade criminosa. A unidade deverá estar ainda habilitada para gerir os ativos, evitando que se depreciem.
Outro participante da conferência, o jurista Richard Messick sugeriu que Moçambique recorra às convenções das Nações Unidas para solicitar a outros Estados a recuperação dos seus ativos ou indemnizações pelos danos causados ao país.
Dívidas ocultas
Por seu turno, o economista Joseph Hanlon, sublinhou que a Procuradoria-Geral da República (PGR) deve abandonar o secretismo no tratamento do assunto das dívidas ocultas e trabalhar com a sociedade civil.
Hanlon citou como exemplo de sucesso nesse tipo de parceria o recente caso em que o Tribunal Superior de Londres decidiu a favor da indemnização da população de Nhamanhumbir, no norte de Moçambique, por violações de direitos humanos na região da extração de rubi. "O sucesso do caso de Gemfields foi por causa de uma cooperação bem cuidadosa e bem estreita com a sociedade civil".
Já a Presidente da Comissão Parlamentar do Plano e Orçamento, Esperança Bias, considera que o tema sobre a recuperação de ativos é atual e oportuno, tendo recordado que a procuradora-geral da República, Beatriz Buchili, anunciou há dias ter submetido já uma proposta de legislação ao Governo.
Para Esperança Bias, as dívidas ocultas são uma questão "que preocupa e todos nós moçambicanos estamos convictos e queremos que Moçambique seja ressarcido daquilo que são os danos sofridos por esta questão das dívidas".
Obras sobrefaturadas transformam Vilanculos em cidade-fantasma
Falta de transparência, obras inacabadas e a preços exorbitantes. Corrupção generalizada no Conselho Municipal de Vilanculos, em Inhambane, gera construções inacabadas, que não podem aproveitadas pela população.
Foto: DW/L. da Conceicao
O triplo do preço real
No Conselho Municipal de Vilanculos, na província moçambicana de Inhambane, os preços das obras estão a ser adulterados para beneficiar funcionários que recebem comissões ilegais de empreiteiros depois da adjudicação. Três balneários públicos ainda em construção custaram meio milhão de meticais aos cofres públicos, três vezes acima do preço normal.
Foto: DW/Luciano da Conceição
Construções desnecessárias
O Conselho Municipal de Vilanculos construiu um alpendre com mais de 50
bancas. O investimento foi de 1,5 milhões de meticais, mas, há dois anos, quase ninguém ocupa esta infraestrutura. Os vendedores negam-se a ocupar as
bancas alegando que "não querem servir de fatura de alguém". A obra
não corresponde ao preço real segundo empreiteiros ouvidos pela DW África.
Foto: DW/Luciano da Conceição
Obras continuam
As construções continuam em Vilanculos sem que ninguém ocupe as bancas. No mercado central, está a ser construído um novo mercado de peixes financiado pelo programa PROPESCA. O valor é de 9,6 milhões de meticais, quatro vezes acima do preço normal. A obra tem um prazo de 240 dias para ser executada e está a cargo da empresa Vilcon, cujo dono é investigado por fuga ao fisco.
Foto: DW/Luciano da Conceição
Areia vermelha nas ruas principais
Muitas ruas na vila turística de Vilanculos não têm pavimento, mas o Conselho Municipal gasta mais com a colocação de área vermelha do que com paves. Os munícipes reclamam da degradação dos seus automóveis e questionam: "Por que gastar dinheiro com areia enquanto pode-se colocar paves ou saibro com o mesmo valor?". A colocação da areia vermelha facilita o esquema de corrupção no município.
Foto: DW/Luciano da Conceição
Ruas em péssimo estado
Todos os anos, a Assembleia Municipal aprova o orçamento para a reabilitação desta rua do Mercado Novo. A via, no entanto, continua esburacada. O dinheiro sempre é dividido em comissões e resta pouco para a execução. A empreiteira selecionada é, há dois anos, a única empresa contratada para o efeito e não é sediada em Vilanculos, gerando o descontentamento de empresários locais.
Foto: DW/L. da Conceicao
Arrendamento caro
O sistema de corrupção no Conselho Municipal de Vilanculos tem foco na construção de novas bancas para facilitar a divisão do dinheiro entre os empreiteiros e os funcionários do órgão. É o caso concreto destas 12 bancas que foram construídas há dois anos no bairro 19 de Outubro, mas ninguém quer arrendar. Segundo os vendedores, o arrendamento está muito caro e não há rede elétrica.
Foto: DW/L. da Conceicao
Uma residência que custa milhões
As obras superfaturadas em Vilanculos também envolvem o governo da província de Inhambane. Este projeto prevê um investimento de quase 83 milhões de meticais para a construção de uma residência protocolar. Entretanto, falta transparência. A obra tem duração prevista de cinco anos, mas não se sabe quando começou.
Foto: DW/L. da Conceicao
Cadê o dinheiro?
O conselho empresarial de Vilanculos reclamou recentemente a reabilitação da Rua da Marginal para servir como cartão de visita aos turistas. Entretanto, anualmente tem se colocado areia vermelha para diminuir buracos de modo a permitir a circulação de viaturas, mas a rua continua em estado crítico. Os munícipes sempre questionam: Para onde vai o dinheiro da reabilitação desta via importante?
Foto: DW/L. da Conceicao
Corrupção de barba branca
A corrupção em Vilanculos vem desde há muito tempo. Em 2012, uma obra da reabilitação de uma avenida com quase três quilómetros custou quase 44 milhões de meticais aos cofres do município. A obra esteve a cargo da empresa chinesa Sinohydro e o financiamento veio do fundo de estrada. Até hoje, ninguém sabe
como tanto dinheiro foi gasto nesta obra.
Foto: DW/L. da Conceicao
Funcionários detidos por corrupção
Cerca de dez funcionários do Conselho Municipal de Vilanculos foram indiciados pelos crimes de corrupção e adjudicação de obras acima do preço normal. Dois foram detidos no ano passado por vender terrenos na zona da costa. Mangais foram destruídos para dar lugar à construção de um hotel residencial. Um flagrante desrespeito à lei ambiental.
Foto: DW/L. da Conceicao
Mangal vendido para dar lugar a hotéis
Boa parte da terra na costa foi adquirida por um empresário sul-africano que destruiu o mangal para construir condomínios. Alguns funcionários do Conselho Municipal de Vilanculos ainda estão sendo ouvidos no gabinete de combate à corrupção. A lei ambiental moçambicana proíbe a destruição de mangais e prevê punições.