O Credit Suisse respondeu ao pedido de Moçambique para considerar ilegal a dívida de 561 milhões de euros da ProIndicus defendendo que o empréstimo é válido e que tem direito a indemnização por falta de pagamento.
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Na documentação entregue pelo Credit Suisse, na terça-feira (21.01), no tribunal de Londres que está a julgar o processo colocado por Moçambique contra o Credit Suisse, em agosto dE 2019, os banqueiros defendem que o tribunal deve declarar a garantia estatal ao empréstimos como vinculativa e argumenta que tem direito a buscar reparação e danos, nomeadamente o dinheiro em falta.
Em causa estão os empréstimos contraídos pelas empresas ProIndicus e Mozambique Asset Management (MAM) em 2013 e 2014, à margem das contas públicas, mas com garantia estatal assinada pelo ministro das Finanças de então, Manuel Chang.
Na semana passada, o juiz tinha dado até terça-feira (21.01) ao banco suíço para responder às questões em falta, sob pena de atrasar ainda mais o processo judicial.
Tentativa da PGR moçambicana
Moçambique, através da sua Procuradoria-Geral da República (PGR), está a tentar em tribunal que os empréstimos avalizados pelo ex-ministro da Finanças, Manuel Chang, sejam considerados nulos, mas também que o banco seja responsabilizado pelas consequências da chamada "crise da dívida oculta".
A situação precipitou o país para o incumprimento financeiro pelas agências de "rating", depreciou fortemente o metical, abrandou o crescimento económico para níveis históricos deste século e afastou as doações dos parceiros internacionais, essenciais para o equilíbrio orçamental do país.
Este caso está a ser investigado em várias jurisdições, nomeadamente em Londres e em Nova Iorque, envolvendo não só o Credit Suisse, mas também os banqueiros que participaram no esquema fraudulento de financiamento de uma empresa marítima de pesca de atum, a Ematum, e de um sistema de vigilância da costa moçambicana.
Além do Credit Suisse, o processo indicou como arguidos os antigos executivos do banco de investimento, Surjan Singh, Andrew James Pearse e Detelina Subeva, e várias empresas ligadas ao grupo naval Privinvest.
Moçambique: medidas de austeridade seriam "injustas"
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Dívidas ocultas
Em causa estão as dívidas ocultas do Estado moçambicano de mais de 2 mil milhões de euros contraídas entre 2013 a 2014 em forma de crédito junto das filiais britânicas dos bancos de investimentos Credit Suisse e VTB pelas empresas estatais moçambicanas ProIndicus, EMATUM e MAM, acentuando uma crise financeira que levou Moçambique a entrar em incumprimento no pagamento aos credores internacionais (default) e consequente afastamento dos mercados financeiros internacionais.
De acordo com a acusação, os empréstimos foram avalizados pelo então ministro das Finanças, Manuel Chang, mas o Governo de Moçambique afirma que ele "não tinha autoridade" para assinar as garantias soberanas, que eram inconstitucionais e ilegais porque o parlamento de Moçambique não aprovou os empréstimos.
A denúncia apresentada pelo Governo de Moçambique alega que as três transações envolveram o pagamento de subornos a funcionários do Executivo, incluindo Chang, que está detido na África do Sul desde 29 de dezembro de 2018, a pedido da justiça dos Estados Unidos para julgá-lo em Nova Iorque por fraude, corrupção e lavagem de dinheiro. O ex-ministro das Finanças enfrenta também um pedido de extradição para Moçambique.
Moçambique: O abecedário das dívidas ocultas
A auditoria independente de 2017 às dívidas ocultas não revela nomes. As letras do abecedário foram usadas para os substituir. Mas pelas funções chega-se aos possíveis nomes. Apresentamos parte deles e as suas ações.
Foto: Fotolia/Africa Studio
Indivíduo "A"
Supõe-se que Carlos Rosário seja o indivíduo "A" do relatório da Kroll. Na altura um alto quadro da secreta moçambicana que se teria recusado a fornecer as informações solicitadas pelos auditores da Kroll alegando que eram "confidenciais" e não estavam disponíveis. Rosário foi detido em meados de fevereiro no âmbito das dívidas ocultas. Há inconsistências nas informações fornecidas pelo indivíduo.
Foto: L. Meneses
Indivíduo "B"
Andrew Pearse é ex-diretor do banco Credit Suisse, um dos dois bancos que concedeu os empréstimos. No relatório da Kroll é apontado como um dos envolvidos nos contratos de empréstimos originais entre a ProIndicus e o Credit Suisse. De acordo com a justiça dos EUA, terá recebido, juntamente com outros dois ex-colegas, mais de 50 milhões de dólares em subornos e comissões irregulares.
Foto: dw
Indivíduo "C"
Manuel Chang, ex-ministro das Finanças, assinou as garantias de empréstimo em nome do Governo moçambicano. Admitiu à auditoria que violou conscientemente as leis do orçamento ao aprovar as garantias para as empresas moçambicanas. Alega que funcionários do SISE convenceram-no a fazê-lo, alegando razões de segurança nacional. Hoje é acusado pela justiça dos EUA de ter cometido crimes financeiros.
Foto: Getty Images/AFP/W. de Wet
Indivíduo "D"
Maria Isaltina de Sales Lucas, na altura diretora nacional do Tesouro, terá coadjuvado o ministro das Finanças Manuel Chang, ou indivíduo "C", na arquitetura das dívidas ocultas. No Governo de Filipe Nyusi foi vice-ministra da Economia e Finanças, mas exonerada em fevereiro de 2019. Segundo o relatório, terá recebido 95 mil dólares pelo seu papel entre agosto de 2013 e julho de 2014 pela Ematum.
Foto: P. Manjate
Indivíduo "E"
Gregório Leão foi o número um do SISE, os Serviços de Informação e Segurança do Estado. O seu nome é apontado no relatório da Kroll e foi detido em fevereiro passado em conexão com o caso das dívidas ocultas.
Foto: Ferhat Momad
Indivíduo "F"
Acredita-se que Lagos Lidimo, diretor do SISE, Serviços de Informação e Segurança do Estado, desde janeiro de 2017, seja o indivíduo "F". Substituiu Gregório Leão, o indivíduo "E". Na altura disse que não tinha recebido "qualquer registo relacionado as empresas de Moçambique desde que assumiu o cargo." A ONG CIP acredita que assumiu essa posição para proteger Filipe Nyusi, hoje chefe de Estado.
Foto: Ferhat Momad
Indivíduo "K"
Salvador Ntumuke é ministro da Defesa desde de 2015. Diz que não recebeu qualquer registo relacionado com as empresas moçambicanas desde que assumiu o cargo. O relatório da Kroll diz que informações fornecidas pelo Ministério da Defesa, Ematum e a fornecedores de material militar não coincidem. Em jogo estariam 500 milhões de dólares. O ministro garante que não recebeu dinheiro nem equipamento.
Foto: Ferhat Momad
Indivíduo "L"
Víctor Bernardo foi vice-ministro da Planificação e Desenvolvimento no Governo de Armando Guebuza. E na qualidade de presidente do conselho de administração da ProIndicus, terá assinado os termos e condições financeiras para a contratação do primeiro empréstimo da ProIndicus ao banco Credit Suisse, juntamente com Maria Isaltina de Sales Lucas.
Foto: Ferhat Momade
Indivíduo "R"
Alberto Ricardo Mondlane, ex-ministro do Interior, terá assinado em nome do Estado o contrato de concessão da ProIndicus, juntamente com Nyusi, Chang e Rosário. Um email citado pela justiça dos EUA deixa a entender que titulares de alguns ministérios moçambicanos envolvidos no caso, entre eles o do Interior, iriam querer a sua "fatia de bolo" enquanto estivessem no Governo.
Foto: DW/B . Jaquete
Indivíduo "Q"
Filipe Nyusi, na altura ministro da Defesa, seria identificado como indivíduo "Q" no relatório. Uma carta publicada em 2019 pela imprensa moçambicana revela que Nyusi terá instruído os responsáveis da Ematum, MAM e ProIndicus a fazerem o empréstimo. Afinal, parte dessas empresas estavam sob tutela do seu ministério. Hoje Presidente da República, Nyusi nunca esclareceu a sua participação no caso.
Foto: picture-alliance/Anadolu Agency/M. Yalcin
Indivíduo "U"
Supõe-se que Ernesto Gove, ex-governador do Banco de Moçambique, seja o indivíduo "U". Terá sido uma das entidades que autorizou a contração dos empréstimos. E neste contexto, em abril de 2019 foi constituído arguido no processo judicial sobre as dívidas ocultas. Entretanto, em 2016 Gove terá dito que não tinha conhecimento do caso das dívidas. (galeria em atualização)