Ex-diretor da secreta recusou-se a esclarecer questões no tribunal, alegando segredo de Estado. Gregório Leão disse não saber como Teófilo Nhangumele integrou o projeto da Zona Económica Exclusiva sem ser quadro do SISE.
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O antigo diretor da secreta moçambicana negou, esta segunda-feira (27.09), em tribunal, responder a algumas perguntas alegadamente por correr risco de revelar segredos do Estado.
Gregório Leão é tido como o esteio da concepção e materialização do Sistema Integrado de Monitoria e Proteção que visava a preservação da Zona Económica Exclusiva (ZEE).
Leão, chamado a explicar por que os valores envolvidos no projeto da ZEE subiram de 302 milhões de dólares para 622 milhões de dólares, explicou: "O que eu sei de forma genérica e sem pormenores, e como eu disse, o próprio diretor da Inteligência Económica podia dar, mas eu sei que há questões operacionais que era preciso tomar em consideração, então foi nessa base que o orçamento teve que subir. As questões operacionais a que me refiro estão estritamente em segredo de Estado e não é neste fórum que vou falar".
FMI recomenda:"Não escondam as dívidas como Moçambique"
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O Ministério Público confrontou o réu com factos que constam do relatório da Kroll, uma empresa que fez auditoria às dívidas ocultas.
No entanto, Leão respondeu que não podia dar informação a estranhos. "Nós. no SISE. não somos interrogados por estrangeiros, por instituições internas. Porque aquela informação é classificada e confidencial. Porque vou entregar à Kroll informação nossa, se este assunto foi discutido em reuniões fechadas? Não seria eu a dar informação à Kroll", argumentou.
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Presença de Nhangumele
O réu Gregório Leão negou em sede de tribunal ter autorizado a presença de outro réu, Teófilo Nhangumele, no encontro do Comando Conjunto que era liderado pelo ex-ministro da Defesa Filipe Nyusi, hoje Presidente da República.
Leão disse que foi um engano a presença do réu Nhangumele na reunião do comando que estava sob a égide do Ministério da Defesa de Moçambique, e não sabe quem o convidou.
"Foi um erro, foi um engano, eu não sabia, ninguém sabia, pensávamos que fosse um quadro daquelas empresas ou então da nossa instituição, mas depois de apurarmos que não era foi convidado... falei com [o ex-diretor do Gabinete de Estudos da secreta Cipriano] Mutota para sair. Percebi depois que tinham relações de trabalho durante muito tempo", esclareceu.
Recorde-se que Nhangumele, durante o seu interrogatório, identificou-se como sendo o ponto de contato entre a Privinvest e a parte moçambicana que estava interessada no projeto, mas Gregório Leão disse que nunca abordou esse assunto com Nhangumele.
"Em nenhum momento. Desde que fiquei diretor geral do SISE, nunca me encontrei com Teófilo. Em que momento eu teria abordado assuntos delicados sobre o comando conjunto com Teófilo, se no Comando Conjunto tínhamos uma hierarquia?", alegou.
Até ao fecho desta reportagem, o interrogatório ao antigo homem forte do SISE prosseguia e, o próprio juiz teria alertado que a sessão deste dia iria levar mais tempo.
Julgamento das dívidas Ocultas: "Outras coisas..."
O julgamento do caso das dívidas ocultas revela aos poucos mais informações sobre o que muitos consideram o maior escândalo de corrupção de Moçambique. Conheça as peculiaridades do caso e dos seus personagens.
Foto: Fotolia/Carlson
O caso
O escândalo das dívidas ocultas veio ao de cima entre 2013 e 2014. É a maior fraude financeira de Moçambique e prejudicou a nação e a imagem do país. Em causa estão cerca de 2 mil milhões de euros. O esquema tem como "cabeças" altos funcionários do Estado e trabalhadores de bancos como o Credit Suisse. O julgamento começou a 23 de agosto e conta com 19 arguidos, 70 testemunhas e 69 declarantes.
Foto: Roberto Paquete/DW
Julgamento nas instalações de uma cadeia
A falta de capacidade para albergar muita gente terá levado o Tribunal Judicial da Cidade de Maputo a optar pelo Estabelecimento Penitenciário Especial de Máxima Segurança da Machava para o julgamento. E é na B.O., como é conhecida a cadeia, onde estão detidos a maioria dos envolvidos no caso. Alguns dos julgamentos mais mediatizados do país costumam acontecer aqui.
Foto: Romeu da Silva/DW
Juiz da causa é de índole duvidosa?
Efigénio Baptista não tem percurso profissional imaculado, foi julgado e condenado duas vezes por ameaças e ofensas corporais num caso de abuso de poder em Manica. Também terá sido alvo de contestação popular em Sofala, que culminou com a queima da sua casa. Alguns setores questionam a escolha do juiz, defendem que deveria ter sido escolhido um juiz sénior para o caso. O "juiz júnior" tem 42 anos.
Foto: Romeu da Silva/DW
"Alérgico a corrupção" e sujeito a pressão
Sobre as condenações, o juiz Efigénio Baptista, numa entrevista ao "O País" esclareceu: "Mas eu recorri da decisão e o Tribunal de Recurso da Beira anulou-a. Por isso, eu não tenho cadastro criminal". Baptista terá estado ainda sob pressão por ser o juiz do caso mais "cabeludo" do momento. A imprensa moçambicana chegou a noticiar sobre possíveis ameaças ao juiz.
Foto: Romeu da Silva/DW
Ordem dos Advogados em representação do povo
A Ordem dos Advoagados de Moçambique (AOM) intervém no julgamento na qualidade de assistente e pretende auxiliar o Ministério Público. O objetivo é assegurar que o povo moçambicano seja informado, atualizado e esclarecido sobre os contornos do processo. São sete representantes, entre eles os ex-bastonários Gilberto Correia e Flávio Menete.
Foto: Romeu da Silva/DW
Bendita seja a mulher entre os homens...
Ana Sheila Marrengula é representante do Ministério Público no julgamento. É a única mulher entre o jurado, o que desencadeou queixas de falta de inclusão. É apreciada pelas suas questões consideradas pertinentes, mas igualmente criticada pelos seus modos pouco profissionais de questionar os réus. Pede indemnização civil ao Estado de cerca de três mil milhões de dólares acrescidos de juros.
Foto: Christoph Hardt/picture-alliance/Geisler-Fotopress
O uniforme da discórdia
No primeiro dia do julgamento os réus não se apresentaram de uniforme prisional, como é prática no país e conforme solicitação do juiz. A defesa contestou a exigência, alegando que a lei não obriga a isso, mas no final valeu a ordem de Efigénio Baptista que defende "tratamento igual" entre os presos. Na terça-feira (24.08) a cor laranja dominava a sala de audiências na B.O.
Foto: Romeu da Silva/DW
Alexandre Chivale, um advogado (in)suspeito?
Advogado da família Guebuza é a "sensação" entre os causídicos. Para além da sua postura destemida, e até entendida como de afronta, Chivale marcou o primeiro dia do julgamento. É que é administrador da Txopela, empresa suspeita do seu constituinte, Carlos do Rosário. E mais: ocupa uma das casas supostamente adquiridas com o dinheiro do calote. Tribunal deu-lhe 72 horas para deixar o imóvel.
Foto: privat
A memória curta de Cipriano Mutota
Foi a estreia do banco dos réus. Mutota revela que foi traído pelos seus parceiros do negócio na partilha dos "lucros" e não ficou contente. E não se lembra do destino dado a cerca de 656 milhões de euros que terá recebido como "luvas". O ex-diretor do Gabinete de Estudos da secreta praticamente confirmou a acusação do Ministério Público. Diz que Nyusi e Guebuza aprovaram o projeto.
Foto: Romeu da Silva/DW
Manuel Chang regressa no momento "H"
Justamente no dia do arranque do julgamento, a África do Sul anunciou a tão esperada extradição de uma das peças chave do crime, Manuel Chang. O juiz decidiu que o ex-ministro das Finanças será ouvido "na qualidade de declarante, quando estiver no território nacional", em resposta ao pedido da Ordem dos Advogados de Moçambique e reafirmado pelo Ministério Público e pelos advogados dos 19 arguidos.
Foto: Getty Images/AFP/W. de Wet
O "massagista" do sistema
Foi o lobista do negócio entre o Estado e a Privinvest, identifica-se como facilitador. Num dos emails trocado com a Privinvest mencionou uma "massagem ao sistema", mas no julgamento negou. Recebeu de Jean Boustani cerca de 8,5 milhões de dólares e recusa-se a devolver o valor, alegando que é resultante do seu trabalho. É visto como astuto, embora se tenha destacado por contradições no tribunal.
Foto: Romeu da Silva/DW
A amnésia da "cinderela"
É o terceiro réu a sentar-se no banco. Ndambi é filho do ex-Presidente Armando Guebuza é foi apelidado de cinderela pelos seus parceiros de negócios por ser lento a agir. Terá recebido 33 milhões de dólares de luvas de Jean Boustani, negociador da Privinvest. Não se recorda de quase nada que é questionado pelo juiz, diz que não tem memória de elefante. Foi um dos pivôs no tráfico de influência.