O ativista angolano Francisco Mapanda, libertado na segunda-feira, diz que tratamento na cadeia foi "aterrorizante". Mas não teme novas detenções. E vai ao protesto contra a nomeação de Isabel dos Santos para a Sonangol.
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De regresso a casa, o ativista não escondeu a alegria de voltar a ver a família e os amigos. "É uma mistura de sentimentos", respondeu Francisco Mapanda quando a DW África lhe perguntou como se sentia depois de ter cumprido uma pena de oito meses de prisão na Cadeia de Viana.
"Dago Nível Intelecto", como também é conhecido, foi condenado a 28 março por ter gritado em tribunal que era "uma palhaçada" o julgamento dos 17 ativistas angolanos, condenados a penas entre dois a oito anos de prisão por crimes de rebelião e associação de malfeitores.
Segundo o mandado de soltura do Tribunal Provincial de Luanda, o ativista já deveria ter saído da prisão a 29 de outubro. Mas só foi libertado esta segunda-feira(21.11), quase um mês depois.
22.11.16 Dago Nível libertado - MP3-Stereo
O ativista diz que há muitos presos nas cadeias angolanas na mesma condição. "Muita gente fica por mais tempo que devia", diz, lembrando que ele próprio foi sujeito a "praticamente quase um mês de prisão ilegal" no estabelecimento de Kakila.
"Eu entendo isso como burocracia do próprio sistema prisional porque isto acontece regularmente", critica.
Desde o momento em que foi preso até ao dia da libertação, "Dago Nível" diz só ter tido contacto com os advogados uma vez. "A própria maneira de lidar comigo na cadeia de Viana foi aterrorizante. Já em Kakila passaram a olhar para mim com mais respeito e dignidade", conta.
Manifestação em Luanda
Apesar da condenação e do cumprimento da pena que considera injusta, o ativista afirma que vai continuar a lutar pelos direitos humanos em Angola. E também não teme novas detenções.
À semelhança de outros ativistas, Francisco Mapanda vai participar no protesto cívico agendado para o próximo sábado (26.11), na capital angolana, Luanda, para repudiar a nomeação de Isabel dos Santos para a administração da petrolífera estatal Sonangol.
"O primeiro post que fiz no meu perfil do Facebook foi mesmo em relação a isso", sublinha. "Está confirmada a minha presença na manifestação. Vejo-me na obrigação de lutar para que seja reposta a legalidade e que Isabel dos Santos seja destituída do cargo de PCA da Sonangol".
Julgamento dos 15+2 em imagens
Foi um julgamento envolto em polémica. 17 ativistas angolanos foram condenados a entre 2 e 8 anos de prisão por atos preparatórios de rebelião. Os críticos falam em "farsa judicial". Veja aqui momentos-chave do processo.
Foto: picture-alliance/dpa/W. Kumm
Julgamento polémico
Os 15+2 ativistas angolanos, acusados de atos preparatórios de rebelião, foram condenados a entre 2 e 8 anos de prisão efetiva. A defesa e ativistas de direitos humanos denunciam que o processo foi marcado por várias irregularidades. O julgamento começou logo com protestos, a 16 de novembro. Um ativista escreveu na farda prisional "Recluso do Zédu". Observadores internacionais ficaram à porta.
Foto: DW/P.B. Ndomba
#LiberdadeJa
Antes e durante o julgamento, foram muitos os pedidos de "liberdade já!" para os ativistas angolanos. Essas foram também as palavras de ordem de uma campanha nas redes sociais pela libertação dos jovens a que se associaram músicos, escritores, ativistas e muitos outros cidadãos de dentro e fora de Angola.
Foto: Reuters/H. Corarado
"Justiça sem pressão"
Fora do tribunal, um grupo de manifestantes jurou acompanhar o julgamento dos 15+2 até ao fim. Vestiram-se a rigor com t-shirts brancas de apoio ao sistema judicial angolano, com os dizeres "Justiça sem Pressão" - "Estamos aqui a favor da Justiça, visto que Angola é um Estado soberano e que os tribunais têm o seu papel, com o qual nós estamos solidários", disse um dos manifestantes.
Foto: DW/P. Borralho
Irregularidades no processo
Em dezembro, os ativistas enviaram uma carta ao Presidente angolano onde apontavam irregularidades no processo. Os jovens queixavam-se, por exemplo, das demoras, da falta de acesso ao processo por parte da defesa antes do início do julgamento e da impossibilidade de manter contato visual com a procuradora Isabel Nicolau (na foto). Eram ainda denunciados casos de agressão física e psicológica.
Foto: Ampe Rogério/Rede Angola
Dois dias a ler o livro de Domingo da Cruz
"Ferramentas para Destruir o Ditador e Evitar Nova Ditadura". É este o título do livro escrito pelo ativista Domingos da Cruz, inspirado no livro "Da Ditadura à Democracia", do pacifista norte-americano Gene Sharp. Segundo a acusação, era este o manual dos ativistas para preparar uma rebelião. O livro foi lido na íntegra durante dois dias no Tribunal de Luanda.
Foto: DW/Nelson Sul D´Angola
"Governo de Salvação Nacional" é "embuste"
Dezenas de personalidades angolanas integram uma lista, divulgada online, de um "Governo de Salvação Nacional". Esse seria um Executivo que assumiria o poder em Angola após a rebelião pensada pelos ativistas, segundo a acusação. Vários declarantes faltaram à chamada e várias sessões tiveram de ser adiadas. Um dos declarantes, Carlos Rosado de Carvalho, disse que o suposto Governo era um "embuste".
Foto: DW/P. Borralho
Prisão domiciliária
A 18 de dezembro, 15 ativistas, detidos desde junho, passaram ao regime de prisão domiciliária. Laurinda Gouveia e Rosa Conde permaneceram em liberdade condicional. O tribunal autorizou os detidos a receber visitas de familiares e amigos. No entanto, não foi permitido qualquer contato com membros do "Movimento Revolucionário" e do "Governo de Salvação Nacional".
Foto: DW/P. Borralho Ndomba
"Este julgamento é uma palhaçada"
Numa das sessões do julgamento, os ativistas levaram vestidas t-shirts com autocaricaturas como palhaços. Nito Alves disse em tribunal que o julgamento era uma palhaçada. Foi julgado sumariamente por injúria e condenado a 6 meses de prisão efetiva. Ativistas alertam que o estado de saúde de Nito Alves é grave e que Nito foi transportado numa maca para o tribunal de Luanda para ouvir a sentença.
Foto: Central Angola 7311
Nuno Dala em greve de fome
Como forma de reinvindicar o acesso a contas bancárias e entrega de pertences, Nuno Dala entrou em greve de fome a 10 de março. Gertrudes Dala, irmã do ativista, lamentou a reação da sociedade civil e a defesa alertou para a situação financeiramente "delicada" da família. Outros ativistas também passaram por dificuldades durante a prisão domiciliária.
Foto: DW/P.B. Ndomba
Ativistas são condenados
O tribunal de Luanda condenou, a 28 de março, os 17 ativistas angolanos. Domingos da Cruz, tido como "líder", deverá cumprir 8 anos e 6 meses de prisão efetiva. Luaty Beirão foi condenado a 5 anos e 6 meses. Rosa Conde e Benedito Jeremias foram condenados a 2 anos e 3 meses de prisão. Os restantes foram condenados a 4 anos e 6 meses. A defesa e o Ministério Público vão recorrer da decisão.
Foto: picture-alliance/dpa/P. Juliao
"Dia triste para a liberdade de expressão"
"Este é um dia muito triste para a liberdade de expressão e de associação", disse Ana Monteiro, da Amnistia Internacional, reagindo às sentenças. "Não deveria ter existido sequer um julgamento. Estamos a falar de cidadãos angolanos que estavam reunidos a falar sobre liberdade e democracia". Zenaida Machado, investigadora da HRW, considerou a condenação ridícula.