De Angola para a Alemanha: O plano do hidrogénio verde
6 de junho de 2023O engenheiro alemão Lars Schneider caminha pela beira da barragem de Laúca. Ao lado dele, há um precipício de 156 metros. As últimas chuvas foram tão abundantes que o caudal do rio Cuanza aumentou consideravelmente, lançando uma enorme porção de água no vale, aos pés da barragem.
"Assim, o meu coração de engenheiro bate mais rápido", diz Schneider, que visita a barragem de Laúca em representação da Gauff, uma empresa alemã de engenharia e fiscalização de empreendimentos, que se juntou a outra empresa de consultadoria alemã, a Conjuncta, para desenvolver projetos com a Sonangol, a petrolífera estatal angolana.
As três empresas pretendem converter parte da energia aqui produzida em hidrogénio e depois exportá-lo para a Alemanha.
O hidrogénio verde poderá começar a ser exportado já em 2025. O projeto tem um custo estimado de mil milhões de euros. A procura da indústria alemã por energia sustentável é enorme.
Angola é teste para a Alemanha
A Gauff está há mais de 20 anos em Angola, onde realizou vários projetos de infraestrutura. As equipas da empresa conhecem bem o país e a sua geografia.
"Angola tem um perfil ideal para a construção de barragens. Sendo assim, pensamos em examinar mais de perto as possibilidades no país", diz Schneider, que afirma ter encontrado o que procurava na central hidroelétrica de Laúca.
O projeto em Angola é um importante teste para a Alemanha. O Ministério dos Negócios Estrangeiros está a abrir, a todo o vapor, gabinetes para promover a produção de hidrogénio em países como a Nigéria e Arábia Saudita. Há ainda projetos privados que estão a ser planeados na Namíbia e Marrocos. No entanto, Schneider e sua equipa têm uma vantagem em Angola: a energia já está disponível. Isso significa que a produção de hidrogénio pode começar antes do que em outros lugares.
Procura fraca devido à falta de indústria
A partir da barragem, a água é conduzida por tubos subterrâneos até à central hidroelétrica, a dois quilómetros de distância. E é encaminhada para quatro turbinas. Duas outras não estão a funcionar.
O diretor do Aproveitamento Hidroelétrico de Laúca, Moisés Jaime, olha para os monitores, onde se indica a produção atual. A capacidade total atual é de 856,9 megawatts, mas poderia ser aumentada para 2070 megawatts.
"A procura de energia ainda é reduzida", diz o diretor, lembrando que se esperava um crescimento maior da indústria. Este e outros projetos ambiciosos de energia hidroelétrica ao longo do rio Cuanza estão atualmente com poucos clientes comerciais.
É aqui que se encaixa o projeto com a Alemanha: A Gauff e os seus parceiros pretendem converter 400 megawatts em hidrogénio - o suficiente para fornecer energia a cerca de 450 mil residências alemãs.
"É uma boa iniciativa que recebemos com satisfação", conclui o diretor da central, Moisés Jaime. "Acima de tudo, as máquinas ficarão também 'felizes' porque poderão trabalhar no limite e produzir na capacidade máxima. Sem indústria, não podemos fazer absolutamente nada aqui".
Projetos como este podem abrir um novo mercado para a economia angolana. Até agora, 85% das receitas de exportação do país são provenientes de petróleo e gás. O hidrogénio representa uma fonte de receita promissora.
População de Angola continua com falta de energia
Sérgio Calundungo, coordenador do Observatório Político e Social de Angola, trabalhou durante muitos anos em projetos de desenvolvimento rural. E mostra-se preocupado com a iniciativa de exportação de energia verde.
Apenas 42% das pessoas em Angola têm acesso a eletricidade, salienta Calundungo. Alguns lugares nem sequer estão ligados à rede elétrica. Por isso, rejeita o argumento de que não há procura de energia: "Não existe falta de procura", diz categoricamente.
"Os cidadãos precisam de energia mais do que nunca. Mas é verdade que os particulares podem não contribuir com tanto dinheiro quanto as empresas industriais. O país deveria investir na distribuição."
Calundungo admite, no entanto, que o país possui recursos energéticos enormes e que, por isso, no futuro poderia fornecer hidrogénio para o exterior.
"Mas isso deve ocorrer em paralelo com a melhoria do fornecimento de energia para a própria população", afirma. "Temos de fazer as duas coisas ao mesmo tempo."
Transporte de hidrogénio por navio
Junto a uma estrada nos arredores de Luanda, o engenheiro alemão Lars Schneider observa um estaleiro de obras a algumas centenas de metros de distância, num novo porto. É aqui que a empresa Gauff quer construir a fábrica de hidrogénio. O local é perfeito, pois está conectado à central de Laúca através de cerca de 210 quilómetros de linhas de transmissão de alta tensão. O rio fornece água para produzir hidrogénio pelo processo de eletrólise.
O hidrogénio será convertido em amónia líquida, que poderá ser transportada em barcos para a Alemanha. Ao chegar à Alemanha, será necessário fazer a reconversão para abastecer as centrais elétricas.
A Gauff e os seus parceiros em Angola também já estão a pensar no mercado angolano. O hidrogénio poderá possivelmente ajudar a resolver o problema da falta de eletricidade dos próprios angolanos.
"Naturalmente, o maior desejo é usar energias sustentáveis para fornecer energia a angolanos que residem em áreas remotas. O hidrogénio pode ser uma ótima solução também para os angolanos", afirma Schneider.