Deficientes enfrentam obstáculos na Guiné-Bissau
12 de agosto de 2013 Braima Sanhá levanta-se, todos os dias, às seis hora da manhã para encarar a dura realidade, comum à vida quotidiana da maioria dos guineenses. O apresentador do programa radiofónico "A voz dos deficientes", também ele deficiente visual, lamenta o facto de ser considerado, muitas vezes, pela sociedade como um mendigo.
O apresentador de rádio conta: “eu ou qualquer deficiente pode ir junto de uma outra pessoa para tratar de uma assunto público, mas “a priori” é encarado como se fosse uma pessoa que quer pedir esmola. Isto é extremamente difícil”. Pelo que para Braima Sanhá, de uma maneira geral, “as pessoas não sabem o que é uma pessoa com deficiência”.
Opinião partilhada por Spencer Gomes, membro da Federação de Pessoas Portadoras de Deficiência da Guiné-Bissau: “as pessoas com deficiência são mal vistas, segregadas, abandonadas, não recebem apoios nem do Governo nem de outra entidade”, relata.
“Parece que a deficência é uma doença contagiosa porque uma pessoa não pode comunicar nem conviver com outras pessoas pelo facto de ser deficiente. Isto é um preconceito que existe ainda na comunidade guineense", lamenta Spencer Gomes.
Para Federação de Pessoas Portadoras de Deficiência é fundamental que a sociedade guineense interiorize a convivência com os deficientes e que acabe com os tabus que ainda existem.
Causas históricas e recentes da deficiência na Guiné
Na Guiné-Bissau é frequente ouvir falar de deficientes visuais com carreiras profissionais de sucesso, nomeadamente nas áreas de comunicação social, atendimento e recursos humanos, informática, assim como no meio artístico e musical.
Segundo dados do último recenseamento geral da população (realizado em 2009) e publicados pela Liga Guineense dos Direitos Humanos (LGDH), existem no país cerca de 13.500 pessoas portadoras de algum tipo de deficiência.
Todavia, a Federação de Pessoas Portadoras de Deficiência estima que hoje existam muito mais deficientes, apontando acidentes de viação, diabetes, os levantamentos militares e a tuberculose como as principais causas.
Segundo Spencer Gomes, membro da Federação, “devido à guerra da independência [desde 1963 até à independência em 1973] muitas pessoas ficaram deficientes e depois do 7 de junho de 1998 [quando começou a guerra civil guineense] muitas pessoas ficaram também deficientes por causa de balas perdidas, por exemplo”.
No entanto, atualmente existem outras causas: “hoje em dia vêem-se pessoas deficientes por causa de ataques de AVC (Acidente Vascular Cerebral) e também por causa da diabetes. São pessoas que não nasceram com deficiência mas agora são deficientes. E essas pessoas têm mais problemas de inclusão do que nós”, aponta Spencer Gomes.
Obstáculos nas infraestruturas públicas
Como paradigma da discriminação, a Federação de Pessoas Portadoras de Deficiência aponta as obras públicas, principalmente a estrada principal da capital que liga o aeroporto de Bissau ao centro da cidade.
“Eu nunca tive coragem de atravessar essa avenida principal do Mercado de Bandim, através daquela travessia. Mas eu tenho assuntos para tratar. Mas não vou porque não colocar em perigo a minha vida só para subir ali”, diz Spencer Gomes, da Federação de Pessoas Portadoras de Deficiência.
Spencer Gomes lembra ainda as infraestruturas no país devem ser inclusivas: “o financiamento para a construção daquela estrada foi dado em nome da Guiné-Bissau. Nós como pessoas com deficiência somos guineenses, exercemos os nossos direitos através dos nossos votos e somos cidadãos tais como os outros. Portanto deveria haver mais atenção para com os deficientes”.
No passado mês de julho, o Parlamento guineense aprovou a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas Portadoras de Deficiência. É mais um passo que poderá mudar a realidade no país, acreditam as pessoas portadoras de deficiências que decidiram desencadear uma série que atividades para a divulgação da lei.
O presidente da Federação de Pessoas Portadoras de Deficiência na Guiné-Bissau, Fransual Dias, diz que o objectivo é fazer com que as autoridades passem a ter na agenda as preocupações das pessoas com deficiência.