Democracia em Angola é "miopia", diz porta-voz de campanha da FNLA
1 de agosto de 2012 A Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA), juntamente com a UNITA (maior partido da oposição no país) e o partido governista MPLA, participou em 1975 nas negociações de Alvor que estabeleceram as condições para a independência de Angola.
A FNLA entra na campanha eleitoral na quinta-feira (02.08) quando apresentar, em Malange, o seu Programa de Governo e Manifesto eleitoral.
Em entrevista à DW África, Fernando Pedro Gomes, Coordenador e porta-voz da campanha eleitoral da FNLA, disse que o seu partido defende a "Esperança por uma Angola melhor com destaque para a dignidade humana e melhores perspectivas para os jovens e o mundo rural".
À imagem da UNITA e da CASA-CE, também a FNLA defende durante a atual campanha a realização de debates entre todos os candidatos, para que os eleitores tenham conhecimento dos programas e da credibilidade dos concorrentes aos vários cargos e para que as opções sejam tomadas em consciência e com conhecimento de causa.
DW África: A FNLA (Frente Nacional de Libertação de Angola) inicia a sua campanha na quinta-feira (02.08). Que mensagem leva ao eleitorado angolano?
Fernando Pedro Gomes: A esperança por uma Angola melhor, a esperança [de conseguir] para todos os que contribuíram para um processo de libertação de Angola uma vida mais condigna. E essa dignidade humana passa necessariamente por recompensar todos aqueles que deram a sua contribuição para que Angola fosse um Estado soberano.
E, sobretudo, uma esperança também para os jovens que não têm emprego, que não têm dignidade, que não têm condições de sobrevivência – porque o Estado praticamente relegou a eles, que podem ser a vida, o futuro, o amanhã, ao último plano. Nós pensamos que a FNLA poderá dar um maior contributo, maior atenção, maior dignidade e, sobretudo, criar condições de emprego para essa camada juvenil que é a maioria do nosso país.
DW África: Todos os partidos que estão na corrida eleitoral angolana oferecem essa perspetiva. De concreto, o que a FNLA propõe?
FPG: Nós queremos a separação do poder, conforme ditam as regras da democracia. A democracia, aqui, ainda é uma miopia, e nós pretendemos que, efetivamente, haja uma democracia que consagre a separação de poderes e faça com que as instituições de soberania ajam em cooperação, mas nunca em situação de subordinação uma à outra. E o que se tem estado a verificar é que a própria liberdade do homem não tem sido defendida tal como nós a conhecemos em termos de regime democrático.
Outra novidade é a promoção do empreendedorismo rural. O desenvolvimento do campo será uma inovação, como é óbvio, porque assistimos, a cada momento, jovens a fugir das suas áreas de nascimento, das aldeias, para a cidade, onde podem encontrar minimamente as condições de sobrevivência.
DW África: A FNLA é um dos repetentes na disputa eleitoral desde 1975. Como vê essa campanha que agora começa e como perspetiva o desfecho?
FPG: Nós estamos preocupados ainda com alguns indícios de vandalismo aqui e acolá. Mas nós professamos a democracia cristã, e a nossa ideologia política – para além do nacionalismo angolano e do patriotismo – pensamos claramente que os valores morais e culturais que a FNLA defende vão ser mantidos. E por isso, contamos com o apoio de toda a população e pensamos que essa campanha deverá ser inédita e poderá trazer surpresas em termos de resultados.
DW África: No parlamento [após as eleições legislativas] em 2008, a FNLA contou com três deputados. Então, pensa que será possível aumentar essa representação?
FPG: Não há dúvidas sobre isso. Nós iremos surpreender e nós até podemos garantir que podemos vir a ser o poder em Angola.
DW África: Mas o surgimento de alas na FNLA vai afetar o resultado final deste escrutínio ou não?
FPG: Pensamos que não. Há pessoas que, de fato, continuam a dizer que há uma FNLA desaparecida, uma FNLA fratricida, e essas pessoas infelizmente deixaram o partido e enterraram o partido à porta do Tribunal Constitucional. O voto deles na UNITA [maior partido da oposição em Angola] ou em qualquer outro partido da oposição, ou até no próprio MPLA [partido no poder] não significará grande coisa na FNLA.
DW África: Então a FNLA não está a contar, nesta corrida eleitoral, com os votos da outra ala da FNLA?
FPG: Já não há ala da FNLA.
DW África: E o senhor Ngola Kabango [deputado suspenso pelo partido após alegadamente causar dissidências na FNLA]?
FPG: Dizem que ele é uma pessoa muito madura e que conhece as vicissitudes da política angolana, a não ser que esteja a fazer um serviço que é contrário àquele do partido. Mas não acreditamos que, de acordo com a sua idoneidade política e a sua experiência, possa optar por uma outra FNLA que não seja a FNLA que existe hoje.
DW África: A FNLA está disponível para debates entre os cabeças de lista dos partidos e coligações concorrentes às eleições gerais de 31.08, como foi lançado no primeiro dia da campanha da UNITA?
FPG: A FNLA é a primeira que defende a liberdade, que defende o debate, inclusive aberto, franco, para dissipar dúvidas. Uns querem ver inimigos ali e acolá. Somos adversários políticos, e o debate só vem para enriquecer aquilo que, de fato, os cidadãos pretendem ver no nosso país, e ouvir as opiniões e [assim] até fazerem melhor avaliação de quem é quem no cenário político nacional. Agora, há pessoas que, parece-me, fogem a esse debate ou que ainda não entenderam o que é a democracia. Então, temos um déficit democrático em Angola. Se, por acaso, conseguirem convencer os outros, parece-nos uma boa idéia [debater].
DW África: Os fundos para a campanha são de 788,5 milhões de kwanzas, cerca de 6,7 milhões de euros; parece ser uma quantia irrisória para a extensão do país e para o número de partidos. Como a FNLA está a conseguir gerir a sua campanha, na medida em que muitas vezes tem[-se] dito que a FNLA não dispõe de grandes fundos?
FPG: Esses 788 milhões de kwanzas devem ser divididos pelas nove formações que vão participar no escrutínio. O que faz com que, efetivamente, cada partido fique apenas com cerca de apenas, mais ou menos, 800 mil dólares. Esse valor não representa, assim, efetivamente nada para o partido que quer concorrer aqui nesse país.
DW África: Mas existe um desequilíbrio com o partido no poder?
FPG: Abismal. Se hoje já gastaram ou vão gastar um valor superior a 2,5 mil milhões de dólares nessa campanha, já imaginou qual é a postura de um partido político nessa campanha eleitoral – para nós, da oposição, sobretudo?
DW África: Mas isso não desmobiliza a FNLA?
FPG: Para nós, o problema não é o dinheiro. O dinheiro, efetivamente, é necessário: pensamos que, pelas nossas contas, uma campanha digna, aqui, para um partido político, teria [de ter] no mínimo 20 a 30 milhões de dólares. Mas, mesmo assim, nós somos um partido de massas. Nós conhecemos a nossa população, o nosso povo, e tirando este ou aquele materialista, o povo angolano está saturado mesmo com a situação atual, e penso que não vá olhar por esses barões e que vai votar em consciência. Que façam uma avaliação objetiva da situação para que possamos corrigir este estado de coisas.
Autor: António Rocha
Edição: Renate Krieger