Cafunfo: UNITA fala em "ditadura sem precedentes"
8 de fevereiro de 2021A missão constituída por cinco deputados da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) deixou, na noite de domingo (07.02), a região de Cafunfo, palco há pouco mais uma semana dos violentos incidentes que resultaram em várias vítimas mortais.
Foram quatro dias ao relento, a 5 km da vila diamantífera da província da Lunda Norte, sem autorização para circularem e barrados pelas forças de segurança.
Segundo o deputado da UNITA, Joaquim Nafoia, não foi em vão que permaneceram no local, apesar das adversidades, e deixam a região com o sentimento de missão cumprida. Em entrevista à DW África esta segunda-feira (08.02), Nafoia garantiu que os deputados fizeram constatações e recolheram um leque de elementos que contrapõem dados até então divulgados pelas autoridades estatais.
"Conseguimos conversar com algumas vítimas, conseguimos conversar com a igreja e até mesmo com aqueles que estiveram, digamos, no teatro da operações a fustigarem as populações. Posso dizer que nós conseguimos determinar o número de mortos, que em conferência de imprensa diremos. Há um outro elemento que podemos desmentir desde já. As autoridades avançam que o número de manifestantes era de mais de 300, que é falso. O número era muito reduzido e não passava de 100", começa por explicar.
"Ditadura sem precedentes"
Para Nafoia, o impedimento de que foram alvo nos últimos dias é um sinal claro de uma "ditadura sem precedentes" no país.
"A cada dia que passa a ditadura vai perpetuando mais os métodos de repressão. Nós passamos por situações muito difíceis. Uma tortura sem precedentes", denuncia o deputado à DW.
O deputado da oposição não compreende os argumentos do presidente da Assembleia Nacional de Angola, Fernando dos Santos, em como os deputados "não se podem deslocar sem autorização do presidente da Assembleia Nacional".
"Um deputado não precisa de ser autorização para visitar o seu povo. Não consta em nenhuma parte do regimento, muito menos na Constituição. A única parte do regimento da Assembleia Nacional que fala em o Presidente passar uma autorização aos deputados é quando esses se deslocam em missão privada ou de serviço no exterior do país. A Lunda Norte não é Congo. A Lunda Norte é Angola. Portanto, eu não preciso de ser autorizado pelo presidente da Assembleia Nacional", argumenta em declarações à DW África.
Para o analista angolano Manuel Pinheiro, os deputados gozam do privilégio de circularem pelo país livremente não obstante as especificidades do caso em questão.
"Houve aí um conjunto de situações não típicas que não tem nada a ver com exercício de direitos dos deputados. Os deputados nesta situação concreta não estavam mandatados para cumprir uma missão de inquérito naquela região. Cumprir uma missão desta natureza tinha de ser uma comissão parlamentar de inquérito mas não foi no caso. A legalidade ou ilegalidade do ato só dependia da prudência e da razoabilidade", defende o analista.
Interesses partidários do MPLA
Joaquim Nafoia considera "infelizes" as alegações do Presidente da Assembleia Nacional, Fernando dos Santos, que desaprovou a deslocação dos deputados a Cafunfo. O deputado lamenta ainda que "não se distinga as tarefas do Estado com os interesses partidários" e lança farpas ao Presidente João Lourenço.
"O presidente da Assembleia nacional é membro do MPLA, obviamente que a sua atitude não seria diferente à do seu partido. Acho que o Presidente da República, sendo uma figura da alta esfera do Estado, o que devia fazer seria no mínimo solidarizar-se com os seus colegas deputados porque ele também é deputado. Mas entendemos, ele entendeu privilegiar os interesses partidários do MPLA então o povo que tire as suas ilações", diz.
Os deputados da UNITA, segunda maior força da oposição angolana, prometem nos próximos dias apresentar, em conferência de imprensa em Luanda, um balanço oficial da missão com os números atualizados de feridos, vítimas mortais e desaparecidos.
A manifestação de 30 de janeiro em Cafunfo foi convocada pelo Movimento do Protetorado Lunda Tchokwe, que reivindicava a autonomia para a região das Lundas. O protesto foi fortemente reprimido pelas forças de segurança.