"Desmobilização da última base não depende da RENAMO"
António Cascais
4 de abril de 2023
Enviado da ONU diz que a última base da RENAMO pode ser encerrada em abril. André Magibire assegura que maior partido da oposição moçambicana está a fazer a sua parte. Maior entrave neste momento é o atraso nas pensões.
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Mirko Manzoni, enviado pessoal do secretário-geral das Nações Unidas a Moçambique, disse que a última base da Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO) poderá ser encerrada neste mês, na sequência do acordo de paz de 2019.
O enviado especial de António Guterres falava a jornalistas na sede da ONU, em Nova Iorque, onde assegurou que estão criadas as condições para a pacificação do país, indica a imprensa moçambicana.
Em causa está o adiamento, em dezembro, do encerramento da base central do braço armado da RENAMO na serra da Gorongosa, no âmbito do processo de Desarmamento, Desmobilização e Reintegração (DDR) previsto no acordo de paz assinado com o Governo da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) em 2019.
Entre as reclamações do principal partido de oposição destacam-se os atrasos nas pensões que deviam ser pagas aos guerrilheiros desmobilizados, confirma em entrevista à DW André Magibire, deputado da RENAMO e chefe do Grupo de Diálogo sobre Assuntos Militares do "partido da perdiz".
"Desmobilização da última base não depende da RENAMO"
DW África: Confirma que estão criadas as condições para encerrar a base militar da RENAMO este mês?
André Magibire (AM): A nossa expectativa era que essa base já tivesse sido encerrada há bastante tempo, mas existem alguns pormenores que têm de ser regularizados. Sabemos que foi aprovado o decreto sobre pensões pelo conselho de ministros, mas eu, pessoalmente, ainda não vi esse decreto.
DW África: Portanto, o maior entrave, nas suas palavras, são os atrasos no pagamento das pensões dos desmobilizados da RENAMO?
AM: É exatamente isso. Nós temos estado a trabalhar nesse assunto do pagamento de pensões, porque depois da desmobilização dos combatentes, fizeram aquilo que se chama de subsídio de reintegração. E esse subsídio o combatente recebe durante um ano, findo o qual já não recebe mais nada. Aliás, quando estávamos a tratar desse assunto, ficou acordado que os combatentes receberiam o subsídio de reintegração durante um ano e que esse período de um ano era o período durante o qual estariam a ser regularizadas as suas pensões. Infelizmente isso até aqui ainda não aconteceu.
Secretário-geral da RENAMO diz que DDR está no bom caminho
02:11
DW África: Mas, senhor deputado, gostaria que confirmasse se a RENAMO está de facto preparada para desmantelar a sua última base?
AM: Nós, a RENAMO, estamos preparados. Sempre estivemos preparados. Só para ver que das 16 bases que existiam, nós já desmobilizamos 15. Estamos na ordem de mais ou menos 94% do cumprimento dos acordos. E esta parte é que está de facto a emperrar. Não faz sentido. Nós estamos a desmobilizar, as pessoas chegam às suas casas, não têm nem dinheiro para o hospital, não têm dinheiro para comprar alimentação básica. Isso é muito complicado. Nós estamos a agir de boa fé, como disse. Neste momento que estou a falar, já foram desmobilizados 4884 dos 5221 combatentes. Portanto, a desmobilização da última base, para ser franco, não depende da RENAMO.
DW África: Para além dos atrasos nas pensões, há outras reclamações da parte da RENAMO?
AM: Podemos ter tantas outras reclamações sim, mas agora a básica neste momento é a questão de pensões. Nós queremos que os nossos combatentes comecem a receber as pensões. Dizerem como o Conselho de Ministros aprovou o decreto, sim senhor, aprovou o decreto. Mas esse decreto começa a entrar em vigor após a sua publicação. Como eu disse, não tenho conhecimento ainda que o decreto tenha sido aprovado ou não. Se já começou o pagamento de tais pensões, eu não tenho conhecimento.
Guerrilheiras da RENAMO aguardam paz e reintegração
A desmilitarização também se faz no feminino. As mulheres estão prontas para entregar as armas, assegura a Liga Feminina da RENAMO, e aguardam com expetativa a reintegração nas forças governamentais.
Foto: DW/M. Mueia
Na expetativa do acordo
Muitas mulheres na RENAMO são guerrilheiras e aguardam a sua reintegração social. Estão interessadas em entregar as armas e exercerem outras atividades profissionais. Esperam pelo acordo final entre as principais partes envolvidas no processo de deliberação, neste caso as bancadas parlamentares da RENAMO e A FRELIMO.
Foto: DW/Marcelino Mueia
O aguardado regresso à vida civil
Teresa Abdul, da província do Niassa, começou a combater quando tinha apenas 14 anos. Aguarda o desarmamento e o regresso à vida civil com muita expectativa. “Este processo é muito melhor. Temos muitas pessoas que passaram pela guerra, lutaram, mas até agora não estão a ser reintegradas nos seus lugares, é triste. Caso este processo ocorra, estaremos agradecidos porque todos estarão na linha”.
Foto: DW/Marcelino Mueia
Luta de quase quatro décadas
As mulheres do maior partido da oposição comemoraram o 38º aniversário da criação da Liga Feminina a 5 de Julho de 2018. As celebrações a nível nacional tiveram lugar na província moçambicana da Zambézia, juntando representantes do partido oriundos maioritariamente das províncias.
Foto: DW/Marcelino Mueia
Que se cumpra o acordo feito com Dhlakama
Albertina Naene, ex-guerrilheira, ingressou nas fileiras militares da RENAMO com apenas 13 anos. Hoje, com 46, apela ao Presidente para prosseguir com os acordos de cessação definitiva das hostilidades militares."O Governo da FRELIMO está a atrasar o processo. Deveria cumprir o que ficou acordado com o presidente Dhlakama. Queremos que aqueles nossos irmãos saiam para virem conviver connosco”.
Foto: DW/Marcelino Mueia
Encontros para motivar e mobilizar apoiantes
A morte do líder da RENAMO não significa o fim do regime partidário. As autoridades políticas da RENAMO na província da Zambézia, têm mantido encontros constantes depois da morte de Afonso Dhlakama. Os encontros não visam apenas traçar planos de atividade para as delegações distritais e membros do partido, também servem para motivar os seus simpatizantes e eleitores.
Foto: DW/Marcelino Mueia
Maria Inês Martins - presidente da Liga da Mulher da RENAMO
Para a presidente da Liga da Mulher da RENAMO, a integração dos guerrilheiros nas forças governamentais podia começar pelos que, depois dos acordos de paz de 1992, foram integrados e depois afastados “sem justa causa”. “Foram desmobilizados e despromovidos, a outros foram dadas reformas compulsivas. Esta seria uma prova de que o Presidente Nyusi está disponível para cumprir o que acordaram".
Foto: DW/M. Mueia
O desejo de uma vida em paz
Populares querem paz, para continuar a produzir comida, dizem as vendedeiras ao longo da estrada EN1 em Malei, distrito de Namacurra, na Zambézia. Apesar da zona não ter sido afetada pelo conflito no ano passado, algumas vendedeiras dizem que
temiam a situação. Dormiam em prontidão, com malas preparadas para abandonarem as suas casas, em caso de conflito.
Foto: DW/Marcelino Mueia
Partido "envelhecido"
A RENAMO, continua a ser um partido político com muitos membros idosos. De acordo com o politólogo Ricardo Raboco, a derrota da RENAMO nos pleitos eleitorais está também associada a este fator. Mas o politólogo também opina que, em Moçambique, os mais velhos são mais fiéis à RENAMO e poucos emigram para outras formações políticas. E há cada vez mais idosos a filiar-se pela RENAMO.