Dez anos de Learning by Ear
30 de março de 2018As gravações do Learning by Ear (LbE) arrancaram em 2008 com a participação de atores experientes de companhias de teatro conhecidas, como o Mutumbela Gogo, do Teatro Avenida, a Associação Cultural Nkaringanarte e o Teatro Gungu. "A maior parte dos atores foram selecionados na altura em que comecei a fazer a produção, graças ao apoio de atores bastante experientes, que trouxeram os seus colegas", recorda Nádia Issufo, a voz do programa educativo da DW África há já dez anos.
Foi também ela que aceitou o desafio de partir para Maputo, a sua terra natal, para reunir um elenco de atores que pudesse dar voz às personagens das radionovelas. "O grupo foi crescendo a cada ano. Agora é uma família e todos eles são muitos dedicados e profissionais, com um espírito de entrega muito grande", afirma a jornalista.
Alguns atores deram os primeiros passos profissionais com o Learning by Ear, nos estúdios da Rádio Capital. "Desde o início que estou aqui. Agora sou mãe e posso dizer que criei as minhas filhas aqui. Estas radionovelas fazem parte da minha formação como atriz", conta a atriz Angelina Chavango.
Quem também faz parte do elenco desde sempre é Lucrécia Noronha. "Desde a primeira radionovela até agora, já fiz personagens incríveis. Até já fiz de menina de 7 anos!", recorda a atriz, que atualmente dá aulas de representação na Universidade Eduardo Mondlane, em Maputo.
Elenco de luxo
Dez anos depois, o resultado está à vista: a formação de um elenco de luxo, sublinha o chefe de redação do departamento Português para África, Johannes Beck, que esteve nos estúdios na capital moçambicana a acompanhar as primeiras gravações. "Temos um grande elenco de atores. Já trabalhamos com mais de cem atores e atrizes", destaca.
Nas primeiras radionovelas, a direção de atores estava a cargo de Lucrécia Paco e Jorge Vaz, dois nomes de peso na cena teatral moçambicana. Os atores do Mutumbela Gogo, do Teatro Avenida, em Maputo, o grupo de teatro mais antigo de Moçambique, também deram voz a várias personagens do LbE.
"É positivo fazer parte deste projeto desde o primeiro minuto. Dez anos é uma geração, é uma vida, é uma criança que já vai à escola e já aprendeu muito. E nós também queremos continuar a aprender com este projeto da DW", elogia Jorge Vaz, que espera que o projeto continue por muitos mais anos, apesar das dificuldades. "Mas as dificuldades é que nos fazem crescer", lembra o ator.
O adeus a Graça Silva
Momento particularmente difícil para a equipa foi a morte da atriz Graça Silva, em 2017. A encenadora, que foi uma das fundadoras do Mutumbela Gogo, deu voz a várias radionovelas do Learning by Ear.
Na última entrevista que deu à DW, de passagem pela Alemanha, numa altura em que o grupo comemorava 30 anos de existência, a atriz falou com a jornalista Nádia Issufo sobre os momentos mais marcantes da sua carreira. "O teatro é a nossa casa. Formámos uma família e são 30 anos de derrotas, de vitórias, de desafios, de conquistas. Foi gratificante ter aprendido ao longo desses anos muito sobre teatro, ter feito muitas co-produções com países de fora", disse na altura.
Nádia Issufo recorda também as primeiras dificuldades vividas no terreno. "O mais difícil era gerir, chamar essas pessoas para fazerem as gravações, tê-los ao mesmo tempo na altura necessária. Exigia alguma paciência, mas no final funcionava bem", conta.
Do que tem mais saudades é da boa disposição dos atores. "São pessoas muito alegres, muito simpáticas, mesmo com os atrasos dos colegas, mesmo com os problemas da própria produção, eles sempre se mantiveram bem dispostos, simpáticos e sempre colaboraram."
Saúde com sucesso
Para a "apresentadora de serviço" do LbE, as primeiras radionovelas foram, sem dúvida, as melhores. "Havia uma sobre a malária e outra sobre diarreia. Eram comédias engraçadas, mas também muito educativas, que é o objetivo do Learning by Ear", lembra Nádia Issufo.
As séries da saúde foram as que até hoje tiveram mais sucesso, confirma o chefe de redação. "É incrível em termos de interpretação. Alguns papéis são interpretados com um rigor muito bom em termos artísticos", sublinha Johannes Beck.
Interpretações que marcaram o ator Elliot Alex. "Na série da saúde, eu fiz o papel de Júlio, um jovem que para além de ser estudante vivia com amigos e que apanhava tudo o que era doença. Primeiro teve dores de estômago, depois tétano e malária. Foi muito difícil representar essas coisas. Saía do estúdio com dores de cabeça. Mas não digo que tenha sido mau, foi uma experiência muito positiva", recorda.
E o sucesso foi imediato. "Houve uma onda de reações positivas. Ficamos com a impressão que era realmente um formato que as pessoas queriam: entretenimento, por um lado, mas informação e educação, por outro lado", recorda o chefe de redação. "Funcionou tão bem que várias produtoras em Moçambique copiaram este modelo", diz Johannes Beck.
As radionovelas da DW têm uma "abordagem muito diferente" sobre os temas, afirma Elliot Alex. "E é muito importante que assim seja. Primeiro, porque é uma novela dirigida a jovens e adolescentes. Segundo, não aborda os temas diretamente como estamos habituados a ouvir e ver no nosso dia-a-dia. Por exemplo, a série do HIV/SIDA fala do tema, mas de uma forma muito súbtil e didática", destaca o ator.
Perspectiva africana
As séries são geralmente escritas por autores africanos, o que constitui uma mais-valia, frisa Nádia Issufo. "Faz toda a diferença, porque é uma perspetiva africana e é muito fácil os atores e os ouvintes da DW África identificarem-se não apenas com a história, mas com a abordagem das próprias histórias."
Johannes Beck acredita que as séries "realmente fizeram a diferença" na altura e foi um passo muito importante para a DW África atrair mais parcerias. "Tivemos muitas rádios que aderiram às retransmissões da DW também por causa das radionovelas", diz.
Para o chefe de redação, um dos momentos mais marcantes foi a radionovela sobre segurança rodoviária, que tem um final bastante dramático. "Fiz muitos milhares de quilómetros em estradas moçambicanas e noutros países e vi que é um tema que realmente é importante. Há muitas pessoas que morrem em acidentes de viação trágicos e totalmente desnecessários", lamenta.
Outro momento alto da história do Learning by Ear foi a entrega em Portugal, em 2009, do Prémio Paridade à radionovela "As Jovens". "Foi muito bom termos tido este reconhecimento pela parte da luta pelos direitos humanos. Fizemos várias radionovelas sobre os direitos das mulheres, das jovens e é um tema recorrente no Learning by Ear", salienta Beck.
Músicas originais
Depois veio a música composta de raiz, com "Dilemas de uma Geração na Encruzilhada", a segunda geração de radionovelas da DW África. Em vez dos tradicionais 10 episódios por série, a DW produziu 52 episódios para as duas temporadas. O jovem cantor moçambicano Jalente Zimba foi o escolhido para interpretar o tema musical da radionovela.
"Contra o Crime", a terceira geração de radionovelas, chegou em 2015. Desde então, o Learning by Ear tem o formato de séries policiais, com episódios curtos de 3 minutos. E também mudou de música. "Passamos a usar mais músicas que são compostas por Michael Springer, técnico da DW, e que combinam muito bem com o ambiente mais policial", explica o chefe de redação.
Dez anos depois, é tempo de olhar para o futuro. Johannes Beck e Nádia Issufo já pensam em formas de inovar o programa. "Vamos ter de reinventar um pouco as radionovelas. Já falamos de quase tudo, já tivemos várias séries sobre violência doméstica, meio ambiente, direitos humanos. Temos de pensar num formato que conserve esse elemento radiofónico que funciona muito bem e talvez introduzir algo que funcione melhor nas redes sociais", prevê o chefe de redação.
"É preciso fazer uma pausa ou repensar no formato", concorda a apresentadora. Nádia Issufo deixa uma sugestão: "Aqueles atores que gravam radionovelas há dez anos, fazem teatro e conhecem muito bem o Learning by Ear podiam ser chamados a dar uma opinião sobre os formatos. Quem sabe alguns deles podem até escrever radionovelas?"
E que venham agora pelo menos mais dez anos de Learning by Ear, como espera o ator Abdil Juma, veterano da representação em Moçambique. "Nós consideramo-nos a família da DW cá em Moçambique. Dez anos a fazermos radionovelas para a DW é uma honra. Parabéns à DW por estar a fazer 10 anos!"