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Dez anos depois, o que o Níger aprendeu com o golpe militar?

Silja Fröhlich | António Cascais | cvt
18 de fevereiro de 2020

Apesar de um governo considerado autoritário, analistas dizem que o Níger mantém estabilidade graças a recursos ocidentais e a uma visão pragmática do Presidente. Sociedade civil e oposicionistas são pressionados.

Ankunft des nigerianischen Präsidenten Mamadou Issoufou in Kinshasa im Kongo.
Presidente Mamadou Issoufou mantém regime autoritário e pragmáticoFoto: Presidential Press/G. Kusema

Há dez anos, Niamey foi cenário do um golpe militar que depôs o Presidente Mamadou Tandja. Golpes militares não são novidade no Níger. Naquele dia 18 de fevereiro de 2010, o país vivia o quarto golpe de Estado desde 1974.

Tandja não aceitou pedir demissão após dois mandatos - conforme o previsto pela Constituição do país. Em 2009, após dez anos no cargo, o Presidente dissolveu o Parlamento e o Tribunal Constitucional e organizou um referendo que lhe permitiria cumprir um terceiro mandato.

A sociedade civil e a oposição, no entanto, consideraram as ações ilegais e boicotaram o referendo e as eleições parlamentares. "Este golpe de 2010 já era previsível naquela época. Esta extensão inconstitucional do mandato de Tandja Mamadou levou a um grande descontentamento e também a comunidade internacional foi claramente contra a manobra desde o início", conta Sebastian Elischer, analista do Instituto Alemão de Estudos Globais e Regionais (GIGA)

Com a atmosfera de repulsa a tentativa de Mamadou, houve uma intervenção militar e o Presidente foi derrubado.

Sem mudança política

Novas eleições foram realizadas no ano seguinte, em 2011. O pleito elegeu Mahamadou Issoufou, do Partido Nigerino para a Democracia e o Socialismo (PNDS).

Cidadãos que apoiaram o golpe militar de 2010Foto: AP

O professor do Centro de Estudos Africanos da Holanda, Klaas Walraven, lembra que Issoufou diz que respeitaria o limite de dois mandatos, estabelecido pela constituição. No entanto, ele não acredita que as eleições que elegeram Issoufou mudaram a cultura política do país, que teria continuado com reflexos autoritários.

"O comportamento tanto dele [Issoufou] como do seu regime em relação à oposição tem sido autoritário. A forma como ele lidou com o líder da oposição Hama Amadou caracteriza isso", explica Walraven.

Hama Amadou concorreu à presidência nas eleições de 2016. O líder oposicionista foi preso em novembro de 2015 por suspeita de tráfico de crianças. Amadou teve de conduzir a sua campanha eleitoral a partir da prisão.

A oposição decidiu boicotar a segunda volta, o que abriu caminho para Issoufou ganhar as eleições. O atual Presidente foi reconduzido ao cargo com 92% dos votos.

Acusações a líderes da oposição

A tentativa de criminalizar não somente Amadou, mas também outros atores políticos que criticam o Governo gera tumultos e protestos pelo país.

Ativistas dos direitos humanos e integrantes de ONGs foram detidos sob a acusação de trabalharem para o Boko Haram. "A frágil situação da política de segurança é deliberadamente utilizada pelo Governo para tomar medidas contra os críticos", diz Elischer.

Segundo Elischer, a maioria do Governo no Parlamento foi construída em parte "através de intimidações e da corrupção". Por outro lado, o pesquisador considera o regime de Issoufou é mais estável, porque os militares perderam a ambição política. 

Issoufou mantém relação próxima com o OcidenteFoto: Getty Images/AFP/J. Demarthon

Para o analista do GIGA, os golpes militares em 1996, 2000 e 2010 ocorreram durante períodos de grande instabilidade económica e política, o que hoje não acontece. Apesar de o país ter adquirido feito enorme quantidade de dívidas nos últimos anos, recebe bastante dinheiro do exterior.

"O Níger tornou-se um dos principais aliados da Europa na luta contra a imigração ilegal e o terrorismo na África Ocidental", explica.

O que mudou

Elischer destaca que o fracasso do Estado e as crises de segurança no Sahel eram uma rotina. No entanto, o Níger conseguiu manter-se estável graças aos recursos ocidentais e a uma visão pragmática do Presidente.

Para Klaas Walraven, o "apoio militar massivo do Ocidente" seria novo e o Presidente nigeriano estaria a explorar inteligentemente a localização geográfica do seu país como área de trânsito para terroristas, traficantes de pessoas e refugiados econômicos e climáticos da África Ocidental.

Walraven diz que Issoufou percebeu que o Níger tem um significado estratégico para as potências ocidentais e tem conseguido obter cada vez mais ajuda e dinheiro, especialmente de França e dos Estados Unidos.

"As forças armadas do Níger conseguiram conter os ataques do Boko Haram no sudeste e de outros grupos islamistas no noroeste, principalmente vindos do Mali. Têm sido batalhas duras, com a perda de inúmeras vidas nas forças armadas do Níger", diz o professor.

Dez anos depois, o que o Níger aprendeu com o golpe militar?

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Assim, o Governo conseguiu manter o controle militar sobre o imenso território nacional. Embora Issoufou tenha saído fortalecido desta crise, ele não irá bloquear a mudança política, avalia Walraven.

"No momento, eu apostaria que Issoufou simplesmente respeitará a constituição e deixará o poder. Mohamed Bazoum, ministro do Interior e presidente do PNDS, provavelmente irá concorrer à presidência. Se ele vencer, é claro que protegerá os interesses de Issoufou".

Embora Issoufou tenha saído fortalecido desta crise, observadores esperam que ele deixe o cargo ao fim do mandato e consideram que o atual ministro do Interior do Níger, Mohamed Bazoum, que também é presidente do partido no poder, tem uma boa chance de vencer as presidenciais se receber o apoio de Mahamadou Issoufou.

 

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