O ex-Presidente de Moçambique, Joaquim Chissano, diz ser necessário encontrar as razões profundas da violência em Cabo Delgado para assegurar a paz no país.
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Para o antigo Presidente da República, Joaquim Chissano, é preciso fazer um diagnóstico claro sobre o que está a acontecer na região mais a norte de Moçambique. Chissano duvida que os motivos dos insurgentes sejam económicos. E lembra que existem países africanos com recursos naturais, como gás e petróleo, mas que vivem em paz.
"Deve-se cavar a razão desta guerra para encontrar os meios de a debelar. Não sei se é guerra quando temos terrorismo. Não sei. A guerra tem um adversário, em que nos batemos, a guerra é declarada. Mas esta aqui… que guerra é esta?", questionou Chissano estaquinta-feira (01.10) em Maputo, salientando assim as incógnitas em redor de uma insurgência, que já custou numerosas vidas.
Mesmo assim, o antigo chefe de Estado enfatiza o diálogo como a única via para seresolver esta guerra sem rosto e outras, sejam elas quais forem. "O diálogo nunca se deve pôr de parte. Agora, é preciso encontrar com quem dialogar e sobre o que dialogar. Fizemos assim com os portugueses e com a RENAMO", disse.
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Prioridade para a justiça social
Em relação aos ataques no centro de Moçambique, atribuídos à autoproclamada "Junta Militar" da RENAMO, Joaquim Chissano refere que se tentou evitar sempre o conflito com a oposição, desde 1975. Uma das ferramentas usadas foi dialogar com os regimes que mais tarde apoiaram a guerrilha da Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO). "E fazíamos coletivamente com os países da Linha da Frente. Dialogámos com Ian Smith, dialogámos com o primeiro-ministro do apartheid, Pik Botha, no contexto dos países da Linha da Frente."
O jurista Filipe Sitoe sugere que se resgate o que Moçambique conquistou em 1975 - a justiça social, que, segundo ele, nunca deve ser enfraquecida para manter a estabilidade no país. "Eu penso que a partilha de recursos naturais, a justa distribuição dos recursos escassos, deve constituir prioridade agora, no séc. XXI, face à globalização, face à exploração desenfreada de recursos naturais."
Interesses das grandes potências nacionais
Este especialista chama a atenção para outro aspeto do conflito em Cabo Delgado: "Temos que estar atentos aos interesses geoestratégicos das grandes potências nacionais."
Também o deputado da RENAMO, António Macuiane, aponta as desigualdades sociais como a principal causa de conflitos em Moçambique. E sugere como solução: "Não considerar que em Moçambique haja moçambicanos de segunda e de primeira. De segunda são aqueles que não pertencem ao partido dominante. Isso deve ser corrigido. É ali onde vamos encontrar, se isso for corrigido, a paz efetiva, a estabilidade efetiva."
Estas constatações foram feitas durante uma mesa redonda para analisar os fatores e correlação de forças internas no contexto da transição do monopartidarismo para o multipartidarismo em Moçambique.
Moçambique: Muita chuva e pouca água
Ao mesmo tempo que a cidade de Maputo enfrenta as consequências das fortes chuvas que caíram nos últimos dias, na cidade da Matola e na vila de Boane, as populações debatem-se com restrições no fornecimento de água.
Foto: DW/R. da Silva
Residências inundadas
Nos últimos três dias, a cidade de Maputo registou a queda de chuvas intermitentes que causaram inundações e cortes de estradas.
Foto: DW/R. da Silva
Famílias desalojadas
Esta é a situação em alguns bairros periféricos da capital moçambicana. A chuva desalojou 20 famílias, estando as autoridades municipais e o Instituto Nacional de Gestão de Calamidades (INGC) à procura de espaços para albergar as famílias afetadas.
Foto: DW/R. da Silva
Falta de água
Entretanto, falta água na cidade da Matola e vila de Boane. A recente queda de uma conduta em Boane provocou restrições no fornecimento de água nesta região. Para fazer frente à situação, carrinhos de tração humana, vulgo "tchovas", ajudam no carregamento de quantidades consideráveis de água tirada das valas de drenagem de algumas zonas da cidade de Maputo.
Foto: DW/R. da Silva
Reservatórios
Por causa da queda da conduta, o abastacecimento de água às cidades de Maputo e Matola e à vila de Boane está a ser feito em dias alternados. Pelo menos, um milhão e meio de cidadãos destes municípios estão a ser afetados. Apenas os residentes com reservatórios não sentem as restrições.
Foto: DW/R. da Silva
Risco de doenças
As restrições no fornecimento de água registam-se desde 8 de fevereiro, tendo a empresa Águas da Região de Maputo prometido resolver o problema em dez dias. Na zona de Nwankakana, a oeste da capital, as águas das valas de drenagem estão a minimizar o problema, apesar dos riscos de contrair doenças. Esta águas são usadas, por exemplo, para lavar roupa e loiça.
Foto: DW/R. da Silva
Uso racional
João Machatine, ministro das Obras Públicas, Habitação e Recursos Hídricos, apelou à população para tomar medidas de "austeridade e uso racional da água", de modo a "evitar o pior no que diz respeito à escassez de água".
Foto: DW/R. da Silva
Precaução
Preocupados com as restrições em vigor, alguns cidadãos optam por encher vários recipientes de água e carregá-los para as suas casas, de modo a terem água nos dias em que não estão contemplados pelo fornecimento.
Foto: DW/R. da Silva
Água imprópria
Também nos bairros periféricos, como são Maxaquene, Polana-Caniço, Urbanização e Mafalala, o cenário é este. As valas de drenagem continuam a escoar água de forma permanente e os residentes circundados por este canal continuam a aproveitar a água para vários afazeres, mesmo sabendo que esta água não é própria para consumo. Alguns cidadãos aproveitam para tomar banho ao escurecer.
Foto: DW/R. da Silva
Ruas alagadas
Apesar das campanhas de propaganda do Governo sobre a criação de reservatórios de água, que seriam usados em tempos de crise, o projeto não saiu do papel. As zonas baixas de alguns bairros acumulam água e criam cenários de desespero.
Foto: DW/R. da Silva
Mobilização geral
São sobretudo as mulheres que costumam carregar água logo pela manhã. No entanto, em cenários de crise no fornecimento de água, como acontece por estes dias, a procura de água mobiliza toda a população.
Foto: DW/R. da Silva
Crianças também ajudam
Pessoas de todas as idades são vistas no corre-corre em busca do precioso líquido. Nesta imagem, no bairro da Malanga, vemos um jovem e um menor a dirigirem-se à vala de drenagem em busca de água.