Dia da Mulher Guineense: Ainda longe da igualdade de género
Iancuba Dansó (Bissau)
30 de janeiro de 2021
Celebra-se este sábado o Dia da Mulher Guineense, em homenagem à heroína da luta de libertação Titina Silá, morta a 30 de janeiro de 1973. Igualdade de género ainda está longe de ser realidade, apesar dos esforços.
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Na Guiné-Bissau, a desigualdade entre homens e mulheres é notória e reconhecida pelas autoridades, que depois de várias pressões das organizações feministas, decidiram sobmeter ao Parlamento do país a aprovação de uma lei para reverter a situação.
A lei da paridade foi promulgada em dezembro de 2018, pelo então Presidente guineense, José Mário Vaz, e o documento visa aumentar a participação das mulheres guineenses na política e nas esferas de tomada de decisões. A legislação prevê a taxa de participação mínima de 36% por cento das mulheres nos lugares cimeiros para decisões sobre os assuntos da vida pública do país.
Tânia Pereira, dirigente da organização feminina "MIGUILAN" e uma das promotoras da lei da paridade, realça a importância de serem observadas as legislações a favor das mulheres, frisando que "o desenvolvimento sustentável do país só será possível com a garantia dos direitos das mulheres a todos os níveis".
"É importante que as leis existentes que protegem as mulheres, tais como a lei da paridade, da violência baseada no género, da terra e outros, sejam compreendidas, respeitadas e implementadas para o bem das mulheres e para o bem das comunidades", considera.
Afastadas da política
A participação das mulheres na política guineense é considerada longe do desejado. Ouvido pela DW África, o professor universitário Pinto Chico Nancassa afirma que "não é por falta de capacidade que as mulheres não se envolvem na política ativa guineense, mas talvez por uma questão de sensibilidade, se considerarmos aquilo que é a realidade política do país, os posicionamentos ou tendências dos homens, os discursos não propriamente ricos ou construtivos, as acusações ou insultos de algum modo baixos".
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Este ano, devido à pandemia da COVID-19, e ao estado de calamidade que se observa no país, várias atividades de celebração de 30 de janeiro foram suspensas.
Na sua mensagem alusiva à data, a ministra da Mulher, Maria da Conceição Évora, frisou que "nenhum problema social como a discriminação com base no género, relativo à participação nos órgãos de decisão, a violência feita em todas as suas formas contra mulheres e crianças, o casamento forçado e precoce, a mutilação genital feminina, o assédio, a impunidade, a injustiça social, o acesso limitado ao crédito e à terra, a elevada taxa de analfabetismo e a mortalidade materno infantil, poderão ser superados sem políticas públicas e estratégias claras".
Carmen Pereira, a combatente guineense
10:06
Nas últimas eleições legislativas de 2019,14 mulheres foram eleitas deputadas, enquanto o atual Governo da Guiné-Bissau, com 32 pastas, conta com sete mulheres - três ministras e quatro secretárias de Estado. O número não atinge a participação mínima de 36% previstos na lei da paridade.
A receita para a afirmação
Pinto Chico Nancassa passa a "receita" para as mulheres guineenses superarem as barreiras e se afirmarem na política e na vida social do país: "Só lutando, vencendo a sensibilidade de ser mulher e arriscando a honra é que as mulheres podem superar-se e desafiar-se com os homens, tal como acontece noutros países, como Cabo Verde, Portugal, Brasil, Estados Unidos de América (EUA) ou Alemanha".
Atualmente, as mulheres guineenses têm uma "ampla contribuição" para a sociedade e as famílias, desenvolvendo atividades de vária ordem, principalmente na horticultura e no comércio informal, levantando todos os dias, nas primeiras horas da manhã, à procura dos produtos de venda. Contudo, ainda se queixam de falta de espaço para a sua afirmação política e na sociedade.
"A meu ver, a questão já não está em homens nos darem espaço, mas sim em mulheres ocuparem o espaço que é delas com afinco e competência, como têm feito nos outros setores de atividade", considera Tânia Pereira. "A existência de um dia dedicado à Mulher Guineense já demonstra essa abertura. Portanto, agora é só as mulheres quererem mais e fazerem mais".
Ser mulher na Guiné-Bissau significa vida dura
A maioria das mulheres guineenses tem uma vida difícil. Têm de percorrer dezenas de quilómetros para ir buscar lenha. Muitas morrem ainda jovens. A taxa guineense de mortalidade materna é uma das mais altas do mundo.
Foto: DW/B. Darame
Primeira a acordar, última a ir dormir
No campo, uma mulher trabalha a dobrar. Costuma acordar antes dos restantes membros da família e é a última a deitar-se no final do dia. São as mulheres que têm de caminhar até à mata para procurar lenha e água, às vezes em zonas de difícil acesso, a vários quilómetros da aldeia, como nesta fotografia na vila de Quinhamel, na região de Biombo, no norte da Guiné-Bissau.
Foto: DW/B. Darame
Vender para sustentar a família
Com um pano estendido no chão, as vendedoras vão expondo os seus legumes, malaguetas verdes, pepinos, cenouras, alfaces. São cultivados em quintais ou em pequenos campos. "Vender para sustentar a família" é o lema das mulheres guineenses. Mais de metade vende em feiras improvisadas, como aqui no Mercado de Bandim, o maior mercado de céu aberto da cidade de Bissau.
Foto: DW/B. Darame
Economia dominada por homens
À beira das estradas, as mulheres sentam-se em bancos e mesas de madeira e vendem laranjas, mangas, bananas e outros frutos - como aqui em Bissack, bairro nos arredores de Bissau. As vendedoras têm uma receita que ronda os 10 euros diários. Em média, uma guineense consegue ganhar 907 dólares por ano, bastante menos que os homens que conseguem em média 1.275 dólares.
Foto: DW/B. Darame
Recolher areia para sobreviver
Tia Nhalá não sabe que idade tem, mas sabe que todos os dias deve acordar cedo, às 05h00, para recolher areia no bairro de Cuntum, em Bissau. Sem qualquer proteção no rosto, sem luvas e pés descalços, Nhalá, que aparenta ter 67 anos, trabalha duramente durante largas horas. Recolhe areia que depois vende a pessoas que a usam em obras de construção civil.
Foto: DW/B. Darame
Venda ambulante em condições perigosas
No Bairro de Belém, em Bissau, meninas deambulam de porta em porta para vender frutas. Organizações da sociedade civil denunciaram já várias vezes que as vendedoras ambulantes correm riscos, como o de serem violadas sexualmente, pois estão muito expostas e vulneráveis. Também há denúncias de que algumas mulheres são forçadas a fazer esse trabalho.
Foto: DW/B. Darame
Vender peixe é um bom negócio
As vendedoras de peixe geralmente possuem arcas velhas para a conservação do pescado. Colocam-nas nos portos - como aqui na Ilha de Bubaque (Bijagós) - para servir de local de armazenamento quando receberem peixe fresco dos pescadores. Nos últimos anos, a venda de peixe tornou-se num dos negócios mais rentáveis para as mulheres guineenses.
Foto: DW/B. Darame
Um dos piores países para ser mãe
As condições precárias nas zonas rurais da Guiné-Bissau têm reflexos nas estatísticas: em 126 partos morre uma mulher, segundo dados das Nações Unidas. Em comparação, no Japão, em 20.000 partos morre uma mulher. A taxa de mortalidade materna na Guiné-Bissau é uma das mais altas do mundo. Ainda assim, não existe no país uma estratégia política dirigida à mulher no meio rural.
Foto: DW/B. Darame
País difícil para as crianças
Cada mulher guineense tem em média cinco filhos. O país tem uma das taxas de fecundidade mais altas do mundo. Mas muitas crianças não chegam a celebrar o seu quinto aniversário. Segundo dados das Nações Unidas, 129 de 1.000 crianças morrem até aos cinco anos de idade, muitas durante no parto, o que torna a Guiné-Bissau um dos piores países do mundo para se nascer.
Foto: DW/B. Darame
Trabalhos domésticos no feminino
Em Mansoa, região de Oio, norte da Guiné-Bissau, as casas de adobe agrupadas debaixo de enormes árvores desenham intricados caminhos onde secam redes de pesca, peles de antílopes e roupas rasgadas de criança. A comida prepara-se num fogão improvisado a lenha, em frente da casa. Trabalhos domésticos como cozinhar, cuidar das crianças ou limpar cabem tradicionalmente às mulheres.
Foto: DW/B. Darame
Carregar à cabeça é a única solução
Nas zonas mais recônditas da Guiné-Bissau, como na aldeia de Suru, região de Biombo, a cerca de 20 quilómetros de Bissau, não há uma rede de estradas que facilite o transporte das mercadorias. Não há carros que façam as ligações entre as aldeias. Carregar à cabeça, por vezes mais de cinco quilos, é a única solução para que essas mulheres possam fazer chegar os produtos ao destino.
Foto: DW/B. Darame
Lenha e água a quilómetros de distância
Nas mais de 80 ilhas e ilhéus completamente isolados e sem grande presença do Estado guineense, as populações vivem no regime do "salva-se quem poder". As mulheres percorrem dezenas de quilómetros para ir buscar lenha e água potável. Em muitos casos - como aqui na Ilha de Bubaque (Bijagós) - atravessam rios caminhando, com os pés descalços, sem roupas adequadas e carregadas.
Foto: DW/B. Darame
Ultrapassando rios e braços de mar
Devido à falta de barcos nas aldeias insulares do arquipélago dos Bijagós, o fornecimento e o transporte de bens é extremamente difícil. É recorrente ver mulheres atravessando rios ou braços de mar bastante profundos. Estes caminhos para procurar lenha e água doce são bastante perigosos para quem não sabe nadar.
Foto: DW/B. Darame
Desigualdade começa na educação
A maioria das mulheres guineenses vive em situação de extrema pobreza. Em médias, as mulheres frequentaram a escola apenas 1,4 anos, menos de metade do que os homens guineenses, que têm em média 3,4 anos de escolaridade, segundo o Relatório de Desenvolvimento Humano das Nações Unidas. Só investindo na educação e na saúde será possível melhorar a situação das mulheres da Guiné-Bissau.