Dia Mundial da Alimentação: Covid-19 agrava fome no mundo
Lusa
16 de outubro de 2020
Cerca de 132 milhões de pessoas podem juntar-se este ano aos quase 690 milhões que já passavam fome em 2019. Um aumento motivado pela Covid-19, anunciou a ONU esta sexta-feira, Dia Mundial da Alimentação.
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A situação levou as Nações Unidas a lançarem um apelo, sob o lema "Cultivar, nutrir, preservar. Juntos. As nossas ações são o nosso futuro", para pedir solidariedade e cooperação face à ameaça que a pandemia representa para a segurança alimentar.
De acordo com a ONU, o coronavírus pode empurrar, este ano, mais 83 a 132 milhões de pessoas - consoante o cenário económico- para situações de fome.
Em 2019, após uma revisão em baixa dos números da China, foram contabilizadas quase 690 milhões de pessoas subnutridas (8,9% da população mundial), mais 10 milhões do que em 2018.
A Ásia registou o maior número de pessoas com fome (381 milhões), seguida de África (250 milhões) e da América Latina e Caraíbas (48 milhões).
O número de pessoas que passam fome em todo o mundo tem vindo a aumentar continuamente desde 2014.
Violência causa as maiores crises alimentares
O Programa Alimentar Mundial (PAM), que recebeu este mês o Prémio Nobel da Paz, não hesita em culpar a violência pelas maiores crises alimentares. "O conflito tem um preço: um simples prato de arroz com feijão, por exemplo, custa quase o triplo (mais 186%) do rendimento diário de uma pessoa no Sudão do Sul", exemplificou a organização.
Segundo a porta-voz do PMA, Norha Restrepo, muitas das pessoas às quais o programa presta assistência alimentar "foram forçadas a abandonar as suas terras, casas e empregos" para "fugirem de conflitos".
No final de 2020, o número de pessoas com fome aguda poderá chegar a 270 milhões, quase o dobro dos 149 milhões registados em 2019, devido ao impacto da covid-19.
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O PAM, que ajudou quase 100 milhões de pessoas em mais de 80 países em 2019, tentou, durante muitos anos, salvar vidas em situações de desastres, mas agora está a tentar também "mudar vidas através da ligação entre segurança alimentar e desenvolvimento", ajudando as comunidades a serem "resilientes", disse Norha Restrepo.
A pandemia está "a reduzir a capacidade das pessoas de comprar alimentos, já que muitas perderam o seu rendimento e forma de subsistência, e a interromper as cadeias de abastecimento de alimentos causando uma recessão económica", secundou o vice-diretor de Economia do Desenvolvimento Agrícola da Organização para a Alimentação e Agricultura da ONU, Marco Sánchez Cantillo.
Atualmente, não se trata apenas de erradicar a fome extrema, mas também outras formas de insegurança alimentar, "diretamente ligadas a todas as formas de má nutrição, inclusive peso a mais e obesidade", explicou.
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Reduzir a fome dos mais vulneráveis
O responsável destacou que as dietas saudáveis são cinco vezes mais caras do que as que apenas cobrem as necessidades energéticas e recomenda que os governos tomem medidas para reduzir a fome dos mais vulneráveis e garantir que tenham acesso a alimentos nutritivos na atual crise, aumentando a ajuda alimentar de emergência e os programas de proteção social.
Além da resposta de emergência, a pandemia expôs as falhas do sistema alimentar, um sistema que está "estragado", sublinhou a vice-presidente adjunta do Fundo Internacional para o Desenvolvimento Agrícola, Marie Haga.
"A maior parte das pessoas que passam fome e estão em situação de pobreza vive no campo e a maioria trabalha na agricultura", lembrou a responsável, adiantando considerar imprescindível dotar os produtores de conhecimentos e ferramentas adequadas para produzir alimentos de forma mais sustentável e investir mais no combate à pobreza.
De acordo com um relatório recente da organização, era preciso que os doadores internacionais duplicassem os seus investimentos, atingindo 50 mil milhões de dólares (quase 42,7 mil milhões de euros) por ano, para erradicar a fome até 2030.
África exige justiça ambiental
Cientistas dizem que a Terra poderá aquecer até quatro graus até ao fim do século. A África já sofre com o aquecimento global. Caso não se combata a alteração do clima, as consequências serão desastrosas.
Foto: Getty Images/AFP/S. Maina
Há cada vez menos água em África
Segundo o Banco Mundial, basta um aquecimento do clima de dois graus centígrados para que caia menos um terço de chuva em África. O que terá como consequência um aumento das secas. Na seca extrema de meados de 1990, os pastores etíopes perderam cerca de metade do seu gado.
Foto: Getty Images/AFP/S. Maina
Chuva a mais
Futuramente as chuvas poderão aumentar no leste da África. Mas serão chuvas torrenciais concentradas em poucos dias e não regulares e distribuídas pelo ano. Em 2011, a cidade portuária tanzaniana Dar-es-Salam foi surpreendida por fortes quedas de chuva, que submergiram bairros inteiros. Pelo menos 23 pessoas morreram, outras 10 000 tiveram que abandonar as suas casas.
Foto: cc-by-sa-Muddyb Blast Producer
Colheitas falhadas
Em África cerca de 90% dos produtos agrários são cultivados por pequenos agricultores. Caso não se reforce marcadamente a sua resistência contra o aumento de secas e enchentes, mais 20% pessoas do que hoje vão passar fome, alerta a Organização das Nações Unidas.
Foto: Getty Images/AFP/A. Joe
Riscos para a saúde
Já hoje a alimentação deficiente por causa de colheitas fracas representa um problema em muitos países. Muitas pessoas mudam-se para os bairros de lata das grandes cidades, onde doenças como a cólera se espalham rapidamente. Um aumento da temperatura poderá fazer disparar a incidência de doenças como a malária, inclusive nos planaltos africanos, onde, até agora, a maleita não existe.
Foto: Getty Images/S. Maina
Extinção das espécies
O aumento da temperatura influencia eco sistemas completos. Muitos animais e plantas não se conseguem adaptar suficientemente depressa. Segundo um relatório do Conselho Mundial do Clima, entre 20% a 30% de todas as espécies estão ameaçadas de extinção por causa da mudança do clima.
Foto: CC/by-sa-sentouno
O Kilimanjaro sem neve
A manta de neve do monte Kilimanjaro tem 12 000 anos. Nos últimos 100 anos derreteu mais de 80% do seu gelo. Caso prevaleçam as condições atuais, o gelo no Kilimanjaro desaparecerá entre 2022 e 2033, calcula uma equipa de cientistas do Estado federado do Ohio, nos Estados Unidos da América. A seca e a falta de chuva levam a que o gelo derreta rapidamente.
Foto: Jim Williams, NASA GSFC Scientific Visualization Studio, and the Landsat 7 Science Team
Só quando a última árvore for abatida ...
A mudança do clima deve-se, sobretudo, aos carros, centrais de energia e fábricas na Europa, América e Ásia. Mas o abate de árvores em muitas florestas africanas, por exemplo, para produzir carvão vegetal, aumenta o CO2 na atmosfera e contribui para o esgotamento dos solos. Em tempos, um terço da superfície do Quénia era floresta, hoje são apenas 2%.
Foto: Getty Images/AFP/T. Karumba
Muda a muda cresce a floresta
Hoje, muitas pessoas já se aperceberam da necessidade de medidas para contrariar este desenvolvimento nefasto. Há algumas décadas, cidadãos empenhados no Quénia começaram a plantar novas árvores, contribuindo para que a superfície florestal crescesse para 7%. As árvores impedem que a chuva leve a preciosa terra arável e retiram os gases de efeito de estufa da natureza.
Foto: DW/H. Fischer
Proteção através da diversidade
As monoculturas são vulneráveis a secas e animais daninhos. Se forem plantadas diversas frutas lado a lado, a colheita fica assegurada, mesmo que uma espécie falhe. Segundo o Programa Ambiental das Nações Unidas, a agricultura ecológica aumenta também bastante mais a resistência às consequências da mudança do clima do que a agricultura convencional.
Foto: Imago
Menos palavras, mais ação
Reservas subterrâneas de água da chuva, seguros contra o risco de colheitas falhadas: há muitas maneiras de, pelo menos, amenizar as consequências do aquecimento global. A assistência ao desenvolvimento e a protecção do clima não podem ser separadas, exigiram, recentemente, os delegados numa conferência das Nações Unidas. Mas não houve promessas concretas de assistência.
Foto: picture alliance/Philipp Ziser
Paris desperta expectativas
“Justiça ambiental, já!” exigiram os manifestantes na Conferência do Clima das Nações Unidas em Durban, na África do Sul, em 2011. Agora o mundo aguarda a conferência que se realiza em Paris no fim de 2015. Está planeada a assinatura de um acordo global sobre o clima, com o objetivo de limitar o aquecimento global a dois graus centígrados e reduzir as consequências nefastas da mudança do clima.