Dinheiro corrupto para financiar luxos de líderes africanos
Isaac Mugabi | Maria João Pinto
6 de abril de 2017
É um recado da Transparência Internacional aos países com os maiores mercados de luxo: o dinheiro da corrupção pode estar a financiar a compra de iates, carros, diamantes e jóias. Teodorin Obiang está entre os exemplos.
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A Transparência Internacional fala num padrão de "falta de diligência" nas vendas de produtos de luxo. Segundo a organização não-governamental (ONG), os vendedores - desde joalheiros a imobiliários, passando por construtores de iates e negociantes de diamantes - pouco fazem para fiscalizar a origem dos pagamentos.
Entre vários exemplos, é apontado o caso do vice-Presidente da Guiné Equatorial, Teodorin Obiang. Apesar de enfrentar acusações de corrupção num tribunal francês, o filho do Presidente Teodoro Obiang continua a poder adquirir casas e carros de preços elevados.
Estes bens são regularmente confiscados em locais como Genebra, na Suíça, e Paris, em França, lembra a ONG.
E não são apenas líderes africanos: governantes de todas as regiões do mundo gastam constantemente o seu dinheiro nos Estados Unidos, no Reino Unido, em França, na Alemanha, explica Max Heywood, analista da Transparência Internacional.
"A questão que levantamos neste relatório é porque é que estes países, os países de destino, não fazem mais para deixarem de ser usados para lavagem de dinheiro", sublinha o investigador.
Mudar as leis
Por isso, a Transparência Internacional pede alterações às leis dos países com os maiores mercados de luxo. China, França, Alemanha, Itália, Japão, Reino Unido e Estados Unidos enfrentam os maiores riscos de lavagem de dinheiro nestas aquisições.
Dinheiro corrupto para financiar luxos de líderes africanos
Max Heywood defende uma "verificação mais profunda" dos antecedentes criminais das pessoas que compram estes bens de luxo. "Em países como os Estados Unidos, por exemplo, os vendedores, legalmente, não têm de fazer uma grande verificação dos antecedentes. Vendem os seus produtos a qualquer pessoa e não fazem perguntas. Isto não é aceitável", critica.
O analista considera que caso os antecedentes de algum cliente gere suspeitas, a indústria de luxo tem de fazer uma denúncia às autoridades. "Isto é muito importante para evitar que o dinheiro dos países em desenvolvimento, em particular, seja lavado nos países industrializados", sublinha.
Novas regras
No relatório "Tesouros contaminados: riscos de lavagem de dinheiro nos mercados de luxo", divulgado esta semana, a Transparência Internacional pede às autoridades dos países de alto risco que seja criada uma autoridade responsável por impor novas regras no sector dos bens de luxo. Segundo a ONG, a indústria tem o dever de prevenir que fundos públicos sejam gastos nos seus produtos, ainda que isso signifique uma quebra nas vendas.
"As provas mostram que, em parte, os cleptocratas roubam dinheiro para poderem comprar bens de luxo: super-iates, marcas famosas, carros. Por isso, esta é uma indústria-chave. Em alguns casos, está a facilitar este tipo de corrupção", salienta o analista Max Heywood.
Na Alemanha, lembra a Transparência Internacional, estima-se que 100 mil milhões de euros são lavados todos os anos. A maioria das transacções, segundo um estudo do Governo, envolve imobiliário, carros, obras de arte, iates e outros artigos de luxo.
Alertas vermelhos que, segundo Max Heywood, obrigam a relativizar preocupações com a privacidade que possam surgir com a introdução de novas regras na venda de bens de luxo. "A privacidade deve ser respeitada, mas é preciso ter em conta que cerca de três triliões de dólares saem dos países em desenvolvimento, todos os anos, entram nos países industrializados através de contas bancárias e são gastos em bens de luxo", afirma, lembrando que, noutros sectores, provou-se já que é possível verificar antecedentes sem invadir a privacidade das pessoas.
Sancionar os corruptos
Após a votação pública dos 15 casos "mais simbólicos de grande corrupção", a ONG Transparência Internacional selecionou e anunciou esta quarta-feira (10.02) os 9 casos que passaram para a "Fase de Sanção Social".
Foto: picture alliance / AP Photo
Isabel dos Santos
Depois da votação pública dos 15 casos "mais simbólicos de grande corrupção" da Transparência Internacional, 9 casos foram destacados pela organização. A filha mais velha do Presidente angolano não faz parte, apesar dos 1418 votos. Segundo a TI, a seleção dos 9 foi baseada não só nos votos, mas também no impacto nos direitos humanos e na necessidade de destacar o lado menos visível da corrupção.
Foto: Nélio dos Santos
Teodoro Nguema Obiang
Conhecido pelo seu estilo de vida luxuoso, o filho do Presidente da Guiné Equatorial é, desde 2012, o segundo Vice-Presidente da República. A Guiné Equatorial é o país mais rico de África, per capita, apesar do Banco Mundial alegar que mais de 75% da população vive na pobreza. Teodoro somou apenas 82 votos e - como Isabel dos Santos - não foi nomeado para a fase de sanção social.
Foto: DW/R. Graça
Banco Espírito Santo
As suspeitas de corrupção do BES (Banco Espírito Santo) começaram quando o grupo financeiro português entrou em bancarrota em 2014. Foram descobertas fortes evidências de corrupção, fraude e lavagem de dinheiro. Ricardo Salgado, ex-presidente do BES, já esteve preso e foi recentemente libertado sob fiança. O BES somou 193 votos e também não passou aos 9 maiores casos de grande corrupção do mundo.
Foto: DW/J. Carlos
Mohamed Hosni Mubarak
Presidente do Egito entre 1981 e 2011, Mohamed Hosni Mubarak somou 207 votos e encontra-se agora preso. Mesmo assim, não aparece na lista dos casos de grande corrupção que a Transparência Internacional quer sancionar socialmente. Também o comércio de jade do Myanmar e a China Communication Construction Company ficaram de fora com 47 e 43 votos, respetivamente.
Foto: picture-alliance/AP
Transparência Internacional
"Unmask the Corrupt" é um projeto da Transparência Internacional que após receber 383 submissões, nomeou os 15 casos mais simbólicos de corrupção. Após receberem mais de 170 mil votos, reduziram os 15 para 9 casos. A Transparency International quer promover uma campanha mundial para aplicar sanções sociais e políticas nestes exemplos de corrupção. A DW África mostra-lhe os 9 casos nomeados.
Estado americano de Delaware
O Estado norte-americano de Delaware está entre os 9 casos mais simbólicos de corrupção. O jornal The New York Times chegou mesmo a apelidar o Estado como "paraíso fiscal corporativo" pela possibilidades que oferece às empresas. Somou 107 votos. "Está na hora da justiça e das pessoas mostrarem o poder das multidões", afirmou em comunicado de imprensa José Ugaz da Transparência Internacional.
Foto: Getty Images/M. Makela
Zine al-Abidine Ben Ali
Com 152 votos está o ex-Presidente da Tunísia, que governou entre 1987 e 2011. É acusado de roubar mais de dois mil milhões de euros à população tunisina e de beneficiar amigos e companheiros a escapar à justiça. É conhecido pelo seu estilo de vida extravagante e saiu do Governo em 2011, na sequência de protestos nas ruas da Tunísia conhecidos como a Revolução de Jasmim ou Primavera Árabe.
Foto: picture-alliance/dpa
Fundação Akhmad Kadyrov
A Fundação Akhmad Kadyrov tem como fim o desenvolvimento social e económico da Chechénia. Mas é acusada de gastar as verbas a entreter e oferecer presentes a estrelas de Hollywood e para o benefício de Ramzan Kadyrov (na foto), presidente da região russa da Chechénia e filho do falecido Akhmad Kadyrov. Segundo a TI, Ramzan Kadyrov usou as verbas para comprar jogadores de futebol. Reuniu 194 votos.
Foto: imago/ITAR-TASS/Y. Afonina
Sistema político do Líbano
Com 606 votos, o sistema político no Líbano, nomeadamante o Governo, as autoridades e as instituições, encontram-se também na lista da Transparência Internacional. Segundo a filial libanesa da TI, a corrupção encontra-se em todos setores sociais e governamentais, existindo "uma cultura de corrupção" no país. Considera o Líbano um país "muito fraco" em termos de integridade.
Foto: picture-alliance/dpa
FIFA - Federação Internacional de Futebol
A Federação Internacional de Futebol, mais conhecida como FIFA, é acusada de ultrajar milhões de fãs. Os respoonsáveis pelos cargos mais elevados são acusados de roubar milhões de euros e estão a ser analisados 81 casos suspeitos de branqueamento de capitais um pouco por todo o mundo. Há suspeitas que várias eleições de países anfitriões de mundiais de futebol foram manipuladaa. Conta 1844 votos.
O senador da República Dominicana conta 9786 votações. Foi acusado de branqueamento de capitais, abuso de poder, prevaricação e enriquecimento ilícito no valor de vários milhões de dólares. Bautista já esteve em tribunal, mas nunca foi considerado culpado, o que originou vários protestos por parte da população dominicana.
Foto: unmaskthecorrupt.org
Ricardo Martinelli e companheiros
É ex-Presidente do Panamá e empresário. Ricardo Martinelli terminou com 10166 votos e possui atualmente uma rede de supermercados no país, entre outras empresas. Está envolvido numa polémica de espionagem política durante o seu mandato entre 2009 e 2014, utilizando alegadamente dinheiros públicos. Tem outras acusações em tribunal, incluindo vários crimes financeiros e subornos e perdões ilegais.
Foto: Getty Images/AFP/J. Ordone
Petrobras
A petrolífera Petrobras, empresa semi-estatal brasileira, ficou em segundo lugar com 11900 votos. As acusações de subornos, comissões e lavagens de dinheiro de mais de dois mil milhões de euros, conduziram, alegadamente, o Brasil a uma profunda crise política. O caso envolve mais de 50 políticos e 18 empresas. A população brasileira já protestou várias vezes nas ruas para exigir justiça.
Foto: picture alliance/CITYPRESS 24
Viktor Yanukovych
O ex-Presidente da Ucrânia foi o mais votado. Acumulou 13210 acusações e é acusado de "deixar escapar" milhões de ativos estatais em mãos privadas e de ter fugido para a Rússia antes de ser acusado de peculato. Yanukovych começou o seu mandato em 2010, foi reeleito em 2012 e cessou as suas funções no ano de 2014, quando foi destituído após vários protestos populares.