Os pacientes estão insatisfeitos com o tratamento que recebem do setor de saúde da Embaixada de Angola. A situação é a mesma desde a avaliação feita por uma missão do Ministério da Saúde angolano, em 2016.
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Pelo menos cem doentes angolanos em Portugal lamentam as péssimas condições de alojamento e a qualidade da alimentação no abrigo oferecido pela Comissão da Junta Médica do Ministério da Saúde de Angola, em Lisboa, além do valor irrisório dos subsídios mensais.
Entre os pacientes queixosos está Paixão da Fonseca, que é doente renal há onze anos. Em Portugal há três anos, ele agora vive provisoriamente numa pensão, na capital portuguesa, que diz ter péssimas condições. O custo de alojamento é suportado pela Embaixada de Angola em Portugal.
Doentes angolanos em Portugal vivem em condições precárias
"O problema é que eu acho que eles gastam muito dinheiro nessas pensões. Não aceitam que o doente receba um x [valor] para que possa tratar da sua vida. E é um x [valor] que seria muito inferior àquilo que eles pagam nas pensões", protesta Fonseca.
Apesar de tudo, o paciente angolano diz que tem sido bem tratado pelo sistema de saúde português. "O único problema", pondera Paixão da Fonseca, "é só a forma como somos atendidos pelo nosso setor de saúde, que não é a mais satisfatória". Ainda de acordo com ele, "eles não cumprem com o que deviam cumprir como uma instituição que tem que tomar conta dos doentes".
Alimentação e subsídios
Além das condições precárias dos alojamentos, os doentes dizem que a dieta alimentar nas pensões é péssima. Os acompanhantes dos doentes não beneficiam de assistência médica e medicamentosa. Os subsídios, respetivamente de sete euros diários nalguns casos e de 12 euros mensais noutros, que já são insuficientes, agora são pagos também com atraso.
E também há casos de doentes que recebem altas compulsivas do setor da saúde da Embaixada de Angola para regressar a Luanda sem ter o tratamento concluído.
Paixão da Fonseca discorda, "porque o doente, quando lhe é dada a esperança de vir para cá se tratar, tem que cumprir os trâmites todos de tratamento". "Agora, quando o doente vai para a pensão, eles [os funcionários do setor da saúde] vão atrás dos médicos dizer que a este doente tem que ser dada alta porque tem que ir [voltar] para Angola. Portanto, é uma coisa também que não é nada das melhores", denuncia.
Silêncio sobre a situação dos doentes
Estas são algumas das queixas dos cerca de cem doentes angolanos que recebem tratamento em Portugal, ao abrigo da cooperação com o Ministério da Saúde de Angola. Recentemente veio a Lisboa uma missão multidisciplinar da Junta Nacional de Saúde, encabeçada pelo seu diretor, Augusto Lourenço, com o objetivo de avaliar, caso a caso, qual a real situação dos doentes e daí propor soluções.
Depois de várias tentativas feitas pela DW África, os serviços da Embaixada de Angola e do consulado negaram comentar a situação dos doentes. A DW tentou, por escrito, obter mais informações junto do responsável da Comissão da Junta Médica, mas o pedido não teve qualquer resposta até à data. Alguns doentes dizem ter sido coagidos a não falar com a imprensa.
De acordo com Gabriel Tchimuko, presidente da Associação dos Doentes Angolanos em Portugal, a missão concluiu que os pacientes, sobretudo os insuficientes renais, não deveriam regressar a Luanda por "estarem numa situação gravosa". "Só o facto de virem para Lisboa significa que a situação deles é crítica. Sendo crítica, portanto, não têm condições para voltar para Angola".
Associação pede "transparência"
Tchimuko insiste na elaboração e aprovação de um regulamento estatutário, que ajude a gerir a real situação dos doentes em Portugal com transparência.
Associação espera que a Comissão da Junta Médica reflita num documento todos os problemas registados em Portugal, incluindo a necessidade de um regulamento estatutário, para que os doentes se sintam confortados, reforça Gabriel Tchimuko.
"E que nesse documento venham espelhados todos os problemas que nós vivemos cá e quais são as medidas a serem tomadas por parte da Junta e do Ministério da Saúde para que, de facto, os problemas dos doentes sejam dirimidos aqui a nível de Lisboa".
Água potável em Angola, privilégio para poucos
Para quem tem água encanada em casa, a vida sem ela é inimaginável. Esta é, no entanto, a realidade para mais da metade da população angolana. Todos os dias, muitos angolanos fazem uma maratona para obter água.
Foto: DW/C. Vieira
Abastecimento, uma maratona diária
Para quem tem água encanada em casa, a vida sem ela é inimaginável. Esta é, no entanto, a realidade para mais da metade da população angolana, segundo a Universidade Católica de Angola (UCAN). Todos os dias, os angolanos fazem uma maratona que consume uma quantia considerável de tempo e dinheiro para obter água.
Foto: DW/C. Vieira
O dia começa no chafariz púlico
Nas regiões periféricas da capital de Angola, Luanda, o dia começa cedo a caminho do chafariz público. No município de Cazenga, esta é uma cena comum. Mulheres e crianças são as principais responsáveis pelo abstecimento de água das famílias angolanas. O consumo diário é geralmente limitado pela capacidade de aquisição e transporte da água.
Foto: DW/C. Vieira
Preço alto e falta d'água
Segundo um estudo do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), as fontes mais comuns para o abastecimento de água segura em Angola são: chafarizes (16%), furos protegidos (12%) e cacimbas (6%). Em Luanda, um galão de 20 litros de água custa 10 kwanzas no chafariz – o equivalente a 0,10 dólares. As famílias chegam cedo. Mas, muitas vezes, o chafariz está fechado por falha no abastecimento.
Foto: DW/C. Vieira
O sonho de ter água em casa
Aqueles que têm condições constroem tanques para armazenar a água em casa. O custo da obra supera os 1.500 dólares – uma despesa pesada com a qual poucos podem arcar. A água é entregue por um caminhão pipa privado e cada fornecimento de 20 mil litros custa 20 mil kwanzas – o equivalente a 0,20 dólares por 20 litros de água.
Foto: DW/C. Vieira
Água, um bom negócio?
Apesar de custar o dobro do preço pago no chafariz público, o tanque pode se tornar um bom negócio. Muitas pessoas vendem parte de sua água a 50 kwanzas por galão – o equivalente a 0,50 dólares por 20 litros. Uma margem de revenda de 150%. Esta mulher de Luanda compra água de sua vizinha e armazena em tonéis em casa.
Foto: DW/C. Vieira
Situação difícil também nas províncias
A falta de abastecimento de água leva a população a enfrentar muitas dificuldades para o transporte. Mulheres transportam a água até suas casas. Na foto: a cidade do Lobito, na província de Benguela. Além de ter que suportar o peso da bacia cheia, é preciso muito equilíbrio para não deixar a água pelo caminho.
Foto: DW/C. Vieira
Armazenar para garantir o abastecimento
As residências onde há encanamento são um privilégio para poucos angolanos. Ainda assim, não há garantia de que haverá sempre água. O abastecimento falha com frequência. No Lobito, muitos moradores investem em tanques para a armazenagem. Este comporta 3.000 litros de água e é a garantia para uma família de oito pessoas. O investimento foi de 560 dólares.
Foto: DW/C. Vieira
Criatividade para vencer a dificuldade
O transporte da água depende da criatividade e das possibilidades de cada um. Depois de adquirir a água, será preciso prepará-la para o consumo. Apesar da transparência, a água precisa ser tratada ou fervida para ser considerada potável - ou seja, livre de impurezas e que não oferece o risco de se contrair uma doença.
Foto: DW/C. Vieira
Água potável é saúde
A população de Luanda enfrenta muitas dificuldades para o transporte da água. Além disso, muitas crianças morrem de diarreia ou de outras doenças relacionadas com a água e o saneamento em Angola. Em 2006, um surto de cólera afectou mais de 85.000 pessoas e ceifou cerca de 3.000 vidas em 16 das 18 províncias angolanas.
Foto: DW/C. Vieira
Cobertura sanitária pouco abrangente
Segundo a Organização Mundial de Saúde, cerca de 2,6 mil milhões de pessoas no mundo não têm acesso a condições sanitárias adequadas. Na África sub-saariana, a cobertura sanitária abrange apenas 31% da população. Em Angola, apenas cerca de 25% da população têm acesso ao saneamento básico, segundo a Universidade Católica de Angola. Em Luanda, é preciso conviver com esgotos a céu aberto.
Foto: DW/C. Vieira
Saneamento básico para combater doenças
A falta de saneamento básico é um pesadelo também para os moradores do município de Cazenga, em Luanda. Não há como escoar a água das ruas e enormes poças se formam. A água parada é o paraíso para a reprodução dos mosquitos transmissores da dengue e da malária – esta última ainda é a principal causa de mortes em Angola.
Foto: DW/C. Vieira
Higiene, uma questão de saúde
A falta de saneamento básico aumenta o risco da transmissão de doenças como a diarreia, a cólera e o tifo. Em toda a África, 115 pessoas morrem a cada hora de doenças ligadas à falta de saneamento, empobrecida higiene e água contaminada. Lavar as mãos após defecar, antes de cozinhar e antes das refeições ajuda a evitar doenças e pode reduzir em até 45% a incidência da diarreia.