População teme que situação possa chegar aos níveis de 2008/2009 e já compara as filas atuais dos postos de gasolina às desses anos. A escassez de moeda estrangeira continua a ser o principal problema do país.
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A economia do Zimbabué continua a cair. Já há quem descreva a situação como a pior dos últimos dez anos, havendo no seio da população o medo de que, se nada melhorar, a economia possa chegar aos níveis observados em 2008 e 2009, quando o Zimbabué registou uma inflação de mais de um milhão por cento.
A escassez de moeda estrangeira tornou-se no principal problema do país. O governo não tem dinheiro e os bancos não estão a fornecer a tão necessária moeda estrangeira para financiar a enorme fatura da importação de bens essenciais. Os problemas económicos começaram em 2016, quando o país introduziu as "notas de obrigação", uma moeda local com um valor semelhante ao dólar americano, mas que não é considerada moeda corrente fora do país.
No entanto, estas "bond notes" emitidas pelo Banco do Zimbabué acabaram por fazer aumentar ainda mais a inflação.
Consequências na saúde
Para se conseguirem manter no mercado, alguns comerciantes insistem que os clientes paguem em dólares americanos ou em obrigações, mas com taxas altas. Uma realidade que tem estado a ter impacto na sociedade, nomeadamente, na vida dos doentes crónicos como é o caso de Ignatious Chari. "É muito frustrante. Fui à farmácia comprar a medicação. Antes costumava gastar dez dólares por semana. Agora são 44 dólares. Em outra farmácia foram 55 dólares. É rídiculo", diz.
A indústria farmacêutica foi duramente atingida pela escassez de moeda estrangeira no país. Portifa Mwendera, da Sociedade Farmacêutica do Zimbabué, explica que o setor necessita de quatro milhões de dólares por semana para importar medicamentos, no entanto o país não tem capacidade para tal.
"É muito mau que tenhamos esgotado medicamentos por causa de algumas doenças. Não temos medicamentos para mais do que apenas algumas semanas. Alguns fabricantes desaceleraram as operações para níveis pertos do zero", afirma.
Atualmente, existe no Zimbabué muita especulação, o que levou a uma subida nos preços duas a três vezes por dia. As filas nos postos de gasolina voltaram agora a ser como em 2009. Onismous Kufa é motorista e conta, em entrevista à DW, que tem enfrentado filas de várias horas para atestar. Afirmando que a situação é "dececionante”, este motorista conta que "tudo está parado". "Não podemos fazer negócio, não podemos fazer nada porque temos que passar o dia inteiro à espera do combustível. Estamos muito desapontados", diz.
Para angariar fundos, o novo ministro das Finanças, Mthuli Ncube, introduziu um imposto de dois por cento por dólar nas transações eletrónicas. Uma media que causou desconforto no seio da população. Mas, aos olhos deste governante, esta "dor" é um mal necessário.
"Estamos diante um doente com uma hemorragia e precisamos de parar o sangramento. Não conseguimos fazê-lo sem dor. A meu ver, sentimos a dor maior no início do primeiro e do segundo ano para depois estabilizar a nossa macro economia. Todos nós ficaremos felizes por termos sentido a dor juntos, como uma nação, e de termos seguido em frente", garante.
Confiança no governo
Analistas dizem que o governo precisa de rever as medidas monetárias e fiscais recém-introduzidas, sob pena destas prejudicarem ainda mais a economia, que está já em dificuldades. Para o economista John Robertson, o "governo tem que manter as suas promessas" para trazer de volta "a confiança das pessoas". "Há uma enorme falta de credibilidade neste momento. Temos que superar a falta de confiança que existe atualmente no governo".
De herói a vilão: a vida de Robert Mugabe
Depois de 37 anos no poder, chega ao fim a governação do humilde camponês que se tornou, aos olhos de muitos, um ditador. Robert Mugabe renunciou à Presidência do Zimbabué.
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Origens humildes
Nascido, em Harare, no seio de uma família humilde – o seu pai era carpinteiro e a sua mãe professora – Robert Gabriel Mugabe foi educado numa escola jesuíta até se tornar professor primário. Entre os anos de 1942 e 1960, exerceu na antiga Rodésia, Zâmbia e no Gana. Estudou Inglês, História, Educação e tirou uma licenciatura em Economia, na Universidade de Londres.
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Uma década detido
Aos 36 anos, Mugabe dá inicio à sua luta política focada na independência da Rodésia do Sul do Reino Unido. Funda a União Nacional Africana do Zimbabué – Frente Patriótica (ZANU-PF) em 1963 e, um ano depois, é preso. Em 1974, altura em foi libertado, Mugabe vai para Moçambique, onde liderou uma guerrilha contra o Governo de minoria branca de Ian Smith. Em 1979, Mugabe voltou ao seu país.
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Mugabe torna-se primeiro-ministro
Em 1980, Robert Mugabe é eleito primeiro-ministro da ex-Rodésia do Sul. Em abril deste ano, é declarada a independência do país que passa a chamar-se “Zimbabué”. Na altura, Mugabe afirmou: "O facto de os brancos nos terem oprimido no passado quando detinham o poder jamais poderá justificar que, hoje, os negros os oprimam só porque agora detêm o poder".
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Povo esperançoso
A subida de Mugabe ao poder trouxe a esperança. O líder do ZANU-PF prometeu melhorias na vida dos cidadãos. Começou por introduzir o ensino primário gratuito, assim como o acesso a assistência médica básica para os mais desfavorecidos, ainda que estas medidas apenas tenham chegado a uma parte da população. Mugabe foi mesmo comparado a Nelson Mandela.
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Chegam os massacres
Dois anos mais tarde, em 1982, Mugabe rompe a coligação do seu partido (ZANU-PF) com a União Popular Africana do Zimbábue (ZAPU) de Joshua Nkomo. Nesta disputa pelo poder, Nkomo teve o apoio das etnias Ndebele. É nesta altura que tem lugar um dos piores massacres que o país tem memória. As forças armadas leais a Mugabe cometeram atrocidades, matando cerca de 20.000 civis.
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Mugabe a Presidente
Em 1987, Mugabe torna-se Presidente do Zimbabué. Já aqui se falava na deterioração do seu estado de saúde. No entanto, o sexagenário deixava claro que a reforma não estava para breve: “O partido irá encontrar um sucessor. Eu vim do povo. O povo na sua sabedoria irá selecionar alguém, assim que eu diga que me vou aposentar. Mas ainda não é altura. Nesta idade ainda posso seguir em frente”, disse.
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Um homem, várias perspetivas
Em 1994, enquanto milhares de cidadãos do Zimbabué continuavam dependentes de ajuda humanitária, não tendo acesso aos cuidados básicos, o presidente era distinguido pela Coroa britânica, em Londres. No Zimbabué, os primeiros protestos deixavam perceber que no país não havia motivo de orgulho no Presidente. No final dos mesmos anos 90, as manifestações contra o poder começaram a intensificar-se.
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A trágica reforma agrária
Em resposta ao descontentamento social, Mugabe lança a reforma agrária no início de 2000, uma medida que levou à nacionalização forçada das propriedades agrícolas que pertenciam à população branca para serem redistribuidas pelos negros. No entanto, os mais beneficiados foram a família de Mugabe e a elite partidária do ZANU-PF que ficaram com várias explorações. A produção agrícola caiu muito.
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"Deixem-me ser Hitler vezes dez"
Até aqui, Mugabe já tinha ganho as eleições de 1984, 1990 e 1996. A cada nova eleição sucediam-se as acusações de fraude, o que fez com que, em 2002, os Estados Unidos e a União Europeia aplicassem sanções ao país. Aos que o apelidavam de ditador, disse: "Sou o Hitler da nossa época. O Hitler que tem por objetivo a justiça para o povo. Se isso é ser um Hitler, deixem-me ser Hitler vezes dez".
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"Fatídico" 2008
Em 2008, Mugabe perdeu mesmo a maioria no Parlamento, tendo o Movimento para a Mudança Democrática (MDM) de Morgan Tsvangiari conseguido um maior número de lugares. As eleições ficaram marcadas pelo elevado número de mortes em consequência de confrontos. O ano de 2008 ficou ainda marcado pela inflação, que atingiu valores recorde, e pela epidemia de cólera que matou milhares de zimbabueanos.
Foto: dpa
Aniversários excêntricos
Do percurso do vilão não se esquecem também as famosas festas de aniversário. Enquanto grande parte do seu povo vivia na miséria, Mugabe exibia a sua excentricidade. No seu 93º aniversário, comemorado este ano, estima-se que Mugabe tenha gasto cerca de 1,9 milhões de euros numa festa que contou com cem mil convidados. Na mesma altura, cinco milhões de zimbabueanos dependem de ajuda internacional.
Foto: Getty Images/AFP/J. Njikizana
Grace, a não sucessora
Em 2015, começa a falar-se da possibilidade da primeira-dama, Grace - segunda mulher de Mugabe, 40 anos mais nova, e que já mantinha um caso com o Presidente enquanto era sua secretária - poder ser a sua sucessora. O que intensificou os conflitos dentro do ZANU-PF. Emmerson Mnangagwa, o vice de Mugabe, foi humilhado e demitido de funções e fugiu do país após um braço-de-ferro com Grace Mugabe.
Foto: Reuters/Philimon Bulawayo
15 de novembro de 2017 - o início do fim
Na festa dos seus 93 anos, em fevereiro, Mugabe nem sonhava o que 2017 tinha reservado para si. Em outubro, foi eleito embaixador da boa vontade da Organização Mundial da Saúde, mas uma chuva de críticas internacionais fez com que a nomeação fosse retirada. Cerca de um mês depois, militares próximos de Mnangagwa protagonizavam um aparente golpe de Estado que culminou com a detenção do Presidente.
Foto: Reuters/Zimpapers/J. Nyadzayo
Adeus Mugabe
A 19 de novembro esperava-se que Mugabe anunciasse a sua demissão depois de ter sido deposto da liderança do seu partido. Mas, num discurso à nação, rejeitou que a intervenção militar no país tenha sido "um desafio" à sua "autoridade como chefe de Estado". Dois dias mais tarde, foi anunciada a sua renúncia, ao mesmo tempo que o Parlamento debatia uma moção de censura contra o agora ex-governante.