Moçambique: “Economia está a dar sinais de recuperação"
Leonel Matias (Maputo)
2 de agosto de 2017
No documento divulgado esta quarta-feira (02.08), o Banco Mundial alerta, no entanto, para a dependência do país do setor extractivo. Analista constata impotência do país na "fixação do preço" das matérias-primas.
Publicidade
O relatório do Banco Mundial sobre Moçambique, divulgado esta quarta-feira (02.08), considera que, "depois de um ano difícil em 2016, a economia do país está a dar sinais de recuperação". Segundo este documento, a moeda local, o metical, está mais estável, a inflação começa a abrandar e as reservas internacionais estão a recuperar. Contudo, lembra o Banco Mundial, as flutuações nos preços das matérias-primas vão continuar a colocar grandes perigos para a economia, uma vez que o futuro do país esta dependente do setor extrativo.
O Primeiro-ministro moçambicano, Carlos Agostinho do Rosário, confirmou também, esta terça-feira, as melhorias da economia do país. "Temos divisas suficientes para seis meses de importações. Em novembro do ano passado, tínhamos uma inflação de 26% e, neste momento, temos 18%”, afirmou. Os números foram também sublinhados pelo Banco Mundial que lembrou que o crescimento do primeiro trimestre em Moçambique foi mais do dobro do registado no último trimestre do ano passado.
Dependência do setor extractivo
Em entrevista à DW África, o analista Fernando Gonçalves abordou o alerta do Banco Mundial em relação à forte dependência da economia de Moçambique da indústria extractiva. O analista lembra que, o ano passado, "o preço do carvão estava a um nível muito mais baixo do que está agora”. "Dependemos muito dessas matérias-primas, cuja fixação do preço tem muito pouco a ver connosco. Corremos o perigo de, à semelhança do que está a acontecer com países que dependem muito do petróleo, enfrentar situações de solavancos na economia e que nós próprios não podemos controlar”, constata.O governo elegeu já quatro áreas para dinamizar o crescimento económico e diversificar a base produtiva, nomeadamente, agricultura, turismo, energia e infraestruturas. Um ponto que, aos olhos de Fernando Gonçalves, é positivo: "penso que não há melhor saída para qualquer economia do mundo que não seja a diversificação das fontes de riqueza”, dá conta. O analista acrescenta ainda que Moçambique tem um potencial agrícola "sem fim”, o turismo é uma área muito importante para o desenvolvimento do país, a energia tem vantagens comparativas e competitivas na região, e as infraestruturas condicionam o desenvolvimento.
02.08.2017 Moçambique/Banco Mundial - MP3-Mono
Neste documento, o Banco Mundial alerta ainda para o facto do "fundo de salários da função pública continuar a ser uma fonte de pressão significativa sobre o orçamento do país”, e acrescenta que os recentes cortes no investimento público estão a afetar os setores sociais e económicos. Sobre este ponto, Fernando Gonçalves afirma estar de acordo com "aqueles que dizem que Moçambique não tem ainda recursos humanos para ter uma administração pública consentânea com aquilo que são as necessidades do país”. Contudo, acrescenta, "toda a mão-de-obra do setor público deve ser usada até ao seu maior potencial”.
Dívida insustentável
Relativamente ao peso da dívida pública de Moçambique , o Banco Mundial considera que "continua a ser insustentável". Os peritos do conta ainda que o ajustamento orçamental "tem sido limitado", e defendem que reestruturar a dívida é fundamental para reestabelecer a estabilidade financeira.
O Banco Mundial estima que a economia de Moçambique cresça, este ano, 4,6%, acelerando para 6,4% no próximo ano e 5,3% em 2019.
Maxixe: Obras sem qualidade são adjudicadas por milhões
Em Maxixe, Moçambique, somam-se os casos de obras públicas sobrefaturadas. A DW África juntou exemplos de obras cujo processo de adjudicação não foi transparente e nas quais os orçamentos foram inflacionados.
Foto: DW/L. da Conceição
Favorecimento na seleção das empresas
Em Maxixe, parte das obras de construção civil têm sido adjudicadas à empresa SGI Construções Lda. que não se encontra registada no Boletim da República e que apenas tem escritórios em Maputo. A empresa, com laços fortes com o Presidente do município, Simão Rafael, faturou, nos últimos dois anos, mais de 30 milhões de meticais (cerca de 427 mil euros) em obras que até hoje ainda não terminaram.
Foto: DW/L. da Conceição
Falta de transparência
Como se vê na imagem, para além de não se saber a data do início desta obra, não se conhece o fiscal nem a distância exata para a colocação de pavés. Sabe-se apenas que tem um prazo de execução de 90 dias.
Foto: DW/L. da Conceição
Figuras ligadas à FRELIMO criam empresa
Esta obra, orçada em mais de sete milhões de meticais, foi adjudicada à MACROLHO Lda, uma empresa com sede em Inhambane e que tem, segundo a imprensa local, participações de sócios ligados ao partido FRELIMO, como o ex-governador de Inhambane, Agostinho Trinta. Faturou, nos últimos dois anos, mais de 40 milhões de meticais em obras que, até agora, ainda não foram entregues. O prazo já expirou.
Foto: DW/L. da Conceição
Obras faturadas e abandonadas
Esta via é a entrada do bairro Eduardo Mondlane. Desde 2016, o munícipio já gastou na reparação desta estrada - com cerca de 200 metros -, mais de quatro milhões de meticais. Até à data, apenas foram executados 150 metros. Ao que a DW África apurou, o empreiteiro apenas trabalha nos dias de fiscalização dos membros da assembleia municipal. O dinheiro faturado dava para pavimentar mais de 1 km.
Foto: DW/L. da Conceição
Obras sobrefaturadas
Este é o estado atual de várias obras na cidade de Maxixe. Na imagem, a via do prolongamento da padaria Chambone, foi faturada em mais de cinco milhões de meticais (cerca de 71 mil euros) no ano de 2016. No entanto, esta mesma obra voltou a ser faturada este ano, não tendo o valor sido tornado público.
Foto: DW/L. da Conceição
Obras sem qualidade
Desde o ano de 2015, o conselho municipal da cidade de Maxixe já gastou mais de 10 milhões de meticais (cerca de 142 mil euros) com as obras de reparação de buracos nas avenidas e ruas do centro da cidade. No entanto, o trabalho não tem qualidade e os buracos continuam a danificar carros ligeiros. O empreiteiro desta obra é também a SGI Construções Lda.
Foto: DW/L. da Conceição
MDM denuncia corrupção
A bancada do MDM na assembleia municipal de Maxixe denunciou que as viaturas adquiridas pela edilidade não estão a ser compradas em agências, mas no mercado negro em África do Sul. Diz a oposição que as últimas duas viaturas adquiridas custaram mais de sete milhões de meticais. Um preço quatro vezes superior, quando comparado ao valor das duas viaturas no mercado em Moçambique.
Foto: DW/L. da Conceição
“Não interessa qualidade, queremos faturar”
Jacinto Chaúque, ex-vereador do município de Maxixe, está a ser investigado pelo Gabinete de Combate à Corrupção de Moçambique. Da investigação consta, entre outros, uma gravação telefónica entre Chaúque e o empreiteiro desta obra, na avenida Ngungunhane, e em que o ex-vereador afirma que “não interessa a qualidade. Queremos faturar nestas obras”. Chaúque está a aguardar julgamento.
Foto: DW/L. da Conceição
Preços altos nas construções de edifícios
Em 2015, o conselho municipal de Maxixe construiu um posto policial no bairro de Mabil. Esta infraestrutura - com apenas dois quartos, uma sala comum e uma cela com capacidade para cinco pessoas – custou mais de 1,3 milhões de meticais, não contando com a aquisição de material como mesas ou cadeiras. Ao que a DW África apurou junto do mercado, esta obra não custaria mais de 300 mil meticais.
Foto: DW/L. da Conceição
Um milhão de meticais por cada sede do bairro
As sedes dos bairros são outro exemplo. Todas as sedes dos bairros construídas pelo conselho municipal contam com a mesma planta. Cada uma custou cerca de um milhão de meticais (cerca de 14 mil euros). O preço real de mercado para uma casa tipo dois, sem mobília de escritório, é de cerca de 300 meticais.
Foto: DW/L. da Conceição
Empreiteiro exige dinheiro de volta
O empreiteiro Ricardo António José reclamou, em 2015, a devolução do dinheiro que foi exigido pelo ex-chefe da Unidade Gestora Executora e Aquisições, Rodolfo Tambanjane. O montante pago por Ricardo José era referente ao valor da comissão de Tambanjane por ter selecionado esta empresa e não outra. Rodolfo Tambanjane foi preso, tendo saído depois de pagar caução. O caso continua em tribunal.