Economia: O grande desafio do próximo Presidente do Zimbabué
Columbus Mavhunga (Harare) | cvt
24 de julho de 2018
A economia do Zimbabué está mal. A taxa de desemprego é extremamente elevada e o país precisa de investimentos. A uma semana das eleições gerais, candidatos prometem melhorias - mas não dizem como.
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O Zimbabué realiza, na próxima segunda-feira (30.08), as primeiras eleições gerais sem Robert Mugabe, que deixou a Presidência em novembro passado. E Emmerson Mnangagwa, que o substituiu interinamente, ainda não conseguiu revitalizar a economia em colapso.
Nas ruas do centro de Harare, a maioria dos negócios gira em torno da venda de roupas, alimentos e de câmbios. Esta é a pequena economia que muitos zimbabuanos conhecem, após 37 anos de governação do ex-Presidente Mugabe. Analistas estimam que a taxa de desemprego no país atinja os 85%.
O grande desafio do próximo Presidente do Zimbabué
Esperança em dias melhores
Violet Mharapara, ex-funcionária de uma empresa de computadores que fechou, vende agora roupas em segunda mão, que importa do vizinho Moçambique. A sua esperança é que, depois das eleições gerais, a vida melhore.
"Queremos ter lugares construídos para nós, para que possamos vender livremente e fazer negócios", afirma.
No Zimbabué, há falta de dinheiro. Muitos cidadãos passam as noites em filas à porta dos bancos na esperança de obter dinheiro na manhã seguinte.
"O que queremos mudar depois das eleições são as questões monetárias", diz Collins Chigwagwa, proprietário de uma barbearia. "Neste momento, estamos a usar três formas de pagamento: temos dólares, títulos de dívida e transferências pelo telemóvel. Num dia, podemos ter 30 clientes, mas só dez pagam com dinheiro. Os restantes transferem o dinheiro pelo telemóvel."
Promessas de melhorias
Durante a campanha eleitoral, tanto Nelson Chamisa, do Movimento para a Mudança Democrática, como o Presidente em exercício, Emmerson Mnangagwa, da União Nacional Africana do Zimbabué - Frente Patriótica (ZANU-PF), no poder, têm prometido alterar a situação económica e financeira do país. Mas não entram em detalhes.
"O Zimbábue tornar-se-á uma nova jóia em África", anunciou Mnangagwa recentemente.
Chamisa traçou metas ambiciosas: "Até 2023, teremos um crescimento económico de dois dígitos, e, em 2039, a economia será de 100 mil milhões de dólares."
Como financiar?
O empresário Tangwara Chahwanda espera que a legalização recente da produção agrícola de cannabis pelo Governo do Presidente Mnangagwa ajude o país a conseguir divisas.
"É o negócio do momento", afirma. "É medicinal, dá para fazer roupas, dá para fazer cimento, pode-se fazer materiais para telhados… Se o Governo produzir cannabis, acho que gerará muito emprego e muitas receitas."
Já o economista Daniel Dhlela diz que é preciso melhorar o ambiente de negócios no Zimbabué, para que os investidores se sintam seguros.
"Os investidores internacionais apostam em países onde vêem que o Governo é transparente. Na verdade, não precisamos de os convidar para que batam à nossa porta. O Governo tem de ser transparente e certificar-se de que cria espaço fiscal para o investimento pelos setores privado e público. Se fala de corrupção, essa é uma área em que o Governo falhou."
Além disso, os economistas acusam o Executivo de gastos excessivos para apaziguar a sua base de apoiantes, especialmente neste ano eleitoral. Tanto Mnangagwa quanto Chamisa têm feito promessas que aumentarão os gastos do Estado caso algum deles vença as eleições.
De herói a vilão: a vida de Robert Mugabe
Depois de 37 anos no poder, chega ao fim a governação do humilde camponês que se tornou, aos olhos de muitos, um ditador. Robert Mugabe renunciou à Presidência do Zimbabué.
Foto: picture-alliance/abaca/G. Buthaud
Origens humildes
Nascido, em Harare, no seio de uma família humilde – o seu pai era carpinteiro e a sua mãe professora – Robert Gabriel Mugabe foi educado numa escola jesuíta até se tornar professor primário. Entre os anos de 1942 e 1960, exerceu na antiga Rodésia, Zâmbia e no Gana. Estudou Inglês, História, Educação e tirou uma licenciatura em Economia, na Universidade de Londres.
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Uma década detido
Aos 36 anos, Mugabe dá inicio à sua luta política focada na independência da Rodésia do Sul do Reino Unido. Funda a União Nacional Africana do Zimbabué – Frente Patriótica (ZANU-PF) em 1963 e, um ano depois, é preso. Em 1974, altura em foi libertado, Mugabe vai para Moçambique, onde liderou uma guerrilha contra o Governo de minoria branca de Ian Smith. Em 1979, Mugabe voltou ao seu país.
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Mugabe torna-se primeiro-ministro
Em 1980, Robert Mugabe é eleito primeiro-ministro da ex-Rodésia do Sul. Em abril deste ano, é declarada a independência do país que passa a chamar-se “Zimbabué”. Na altura, Mugabe afirmou: "O facto de os brancos nos terem oprimido no passado quando detinham o poder jamais poderá justificar que, hoje, os negros os oprimam só porque agora detêm o poder".
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Povo esperançoso
A subida de Mugabe ao poder trouxe a esperança. O líder do ZANU-PF prometeu melhorias na vida dos cidadãos. Começou por introduzir o ensino primário gratuito, assim como o acesso a assistência médica básica para os mais desfavorecidos, ainda que estas medidas apenas tenham chegado a uma parte da população. Mugabe foi mesmo comparado a Nelson Mandela.
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Chegam os massacres
Dois anos mais tarde, em 1982, Mugabe rompe a coligação do seu partido (ZANU-PF) com a União Popular Africana do Zimbábue (ZAPU) de Joshua Nkomo. Nesta disputa pelo poder, Nkomo teve o apoio das etnias Ndebele. É nesta altura que tem lugar um dos piores massacres que o país tem memória. As forças armadas leais a Mugabe cometeram atrocidades, matando cerca de 20.000 civis.
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Mugabe a Presidente
Em 1987, Mugabe torna-se Presidente do Zimbabué. Já aqui se falava na deterioração do seu estado de saúde. No entanto, o sexagenário deixava claro que a reforma não estava para breve: “O partido irá encontrar um sucessor. Eu vim do povo. O povo na sua sabedoria irá selecionar alguém, assim que eu diga que me vou aposentar. Mas ainda não é altura. Nesta idade ainda posso seguir em frente”, disse.
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Um homem, várias perspetivas
Em 1994, enquanto milhares de cidadãos do Zimbabué continuavam dependentes de ajuda humanitária, não tendo acesso aos cuidados básicos, o presidente era distinguido pela Coroa britânica, em Londres. No Zimbabué, os primeiros protestos deixavam perceber que no país não havia motivo de orgulho no Presidente. No final dos mesmos anos 90, as manifestações contra o poder começaram a intensificar-se.
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A trágica reforma agrária
Em resposta ao descontentamento social, Mugabe lança a reforma agrária no início de 2000, uma medida que levou à nacionalização forçada das propriedades agrícolas que pertenciam à população branca para serem redistribuidas pelos negros. No entanto, os mais beneficiados foram a família de Mugabe e a elite partidária do ZANU-PF que ficaram com várias explorações. A produção agrícola caiu muito.
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"Deixem-me ser Hitler vezes dez"
Até aqui, Mugabe já tinha ganho as eleições de 1984, 1990 e 1996. A cada nova eleição sucediam-se as acusações de fraude, o que fez com que, em 2002, os Estados Unidos e a União Europeia aplicassem sanções ao país. Aos que o apelidavam de ditador, disse: "Sou o Hitler da nossa época. O Hitler que tem por objetivo a justiça para o povo. Se isso é ser um Hitler, deixem-me ser Hitler vezes dez".
Foto: picture-alliance/dpa
"Fatídico" 2008
Em 2008, Mugabe perdeu mesmo a maioria no Parlamento, tendo o Movimento para a Mudança Democrática (MDM) de Morgan Tsvangiari conseguido um maior número de lugares. As eleições ficaram marcadas pelo elevado número de mortes em consequência de confrontos. O ano de 2008 ficou ainda marcado pela inflação, que atingiu valores recorde, e pela epidemia de cólera que matou milhares de zimbabueanos.
Foto: dpa
Aniversários excêntricos
Do percurso do vilão não se esquecem também as famosas festas de aniversário. Enquanto grande parte do seu povo vivia na miséria, Mugabe exibia a sua excentricidade. No seu 93º aniversário, comemorado este ano, estima-se que Mugabe tenha gasto cerca de 1,9 milhões de euros numa festa que contou com cem mil convidados. Na mesma altura, cinco milhões de zimbabueanos dependem de ajuda internacional.
Foto: Getty Images/AFP/J. Njikizana
Grace, a não sucessora
Em 2015, começa a falar-se da possibilidade da primeira-dama, Grace - segunda mulher de Mugabe, 40 anos mais nova, e que já mantinha um caso com o Presidente enquanto era sua secretária - poder ser a sua sucessora. O que intensificou os conflitos dentro do ZANU-PF. Emmerson Mnangagwa, o vice de Mugabe, foi humilhado e demitido de funções e fugiu do país após um braço-de-ferro com Grace Mugabe.
Foto: Reuters/Philimon Bulawayo
15 de novembro de 2017 - o início do fim
Na festa dos seus 93 anos, em fevereiro, Mugabe nem sonhava o que 2017 tinha reservado para si. Em outubro, foi eleito embaixador da boa vontade da Organização Mundial da Saúde, mas uma chuva de críticas internacionais fez com que a nomeação fosse retirada. Cerca de um mês depois, militares próximos de Mnangagwa protagonizavam um aparente golpe de Estado que culminou com a detenção do Presidente.
Foto: Reuters/Zimpapers/J. Nyadzayo
Adeus Mugabe
A 19 de novembro esperava-se que Mugabe anunciasse a sua demissão depois de ter sido deposto da liderança do seu partido. Mas, num discurso à nação, rejeitou que a intervenção militar no país tenha sido "um desafio" à sua "autoridade como chefe de Estado". Dois dias mais tarde, foi anunciada a sua renúncia, ao mesmo tempo que o Parlamento debatia uma moção de censura contra o agora ex-governante.