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Anúncios de vitória podem levar a "convulsão social"

12 de outubro de 2024

Analista diz que anúncio antecipado de vitória de Mondlane pode ter "riscos enormes". E que críticas dos observadores internacionais são sinal de "evolução" e não vão ter impacto na relação com Estado moçambicano.

Venâncio Mondlane, candidato presidencial do PODEMOS
Um dia depois das eleições gerais em Moçambique, Venâncio Mondlane autoproclamou-se vencedor das presidenciaisFoto: Romeu da Silva/DW

Um dia depois das eleições gerais em Moçambique, o candidato presidencial apoiado pelo PODEMOS, Venâncio Mondlane, anunciou a sua vitória, com base na contagem paralela que a sua campanha está a levar a cabo. O anúncio foi criticado, no dia seguinte, pela Comissão Nacional de Eleições (CNE).

Em reação, esta sexta-feira (11.10), também o candidato presidencial da FRELIMO, Daniel Chapo, pediu "calma e serenidade" no processo de apuramento dos resultados, recordando que compete apenas aos órgãos eleitorais o anúncio.

Em entrevista à DW, o analista político Jaime Guiliche diz que o anúncio de Venâncio Mondlane pode trazer "riscos enormes, eventualmente até mesmo de eclosão de alguma convulsão social, porque os resultados eleitorais anunciados criam ou geram um conjunto de expetativas no seio da sociedade”.

Jaime Guiliche diz também que o posicionamento "crítico" das missões internacionais de observação eleitoral, nomeadamente a União Europeia, são sinal de "evolução" e "não vão ter impacto nas relações com o Estado moçambicano".

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DW África: Como avalia as críticas dos observadores eleitorais internacionais sobre as eleições gerais em Moçambique?

Jaime Guiliche (JG): Pela primeira vez, na história dos 30 anos de realização de processos eleitorais, os observadores eleitorais posicionaram-se de uma forma firme e reportaram um conjunto de irregularidades, assim como partilharam recomendações. Penso que é um processo de evolução do ponto de vista de como também os observadores eleitorais podem contribuir para a melhoria da transparência dos processos eleitorais e para o fortalecimento das democracias ao nível mundial.

Por exemplo, o ponto que foi colocado pelos observadores, que diz respeito à possibilidade dos órgãos de gestão eleitoral divulgarem os editais online. Eu penso que essa questão iria contribuir muito para a melhoria da transparência do processo eleitoral, porque ao haver alguma demora na divulgação dos resultados, ainda que eventualmente não exista nenhuma manipulação, o ceticismo que se desenvolve no seio da sociedade é muito grande. [A divulgação dos resultados online] certamente contribuiria para aumentar a legitimidade do processo e fortaleceria a democracia.

DW África: A União Europeia posiciona-se de uma forma diferente, depois de muitas críticas em relação às avaliações de outras eleições. É como se a União Europeia também tivesse que ir um pouco na onda da opinião pública?

JG: Eu penso que sim. Há um princípio da observação eleitoral, que é o da não ingerência ou não interferência na dinâmica dos Estados no seu próprio processo eleitoral. Penso que os observadores internacionais sempre se pautaram por este princípio, mas penso que era uma justificação também para legitimar alguma superficialidade no tipo de relatórios que eles iam apresentando. Nessa perspetiva, penso que a União Europeia também reage desta forma como um mecanismo de dar resposta crítica social, que já era bastante forte, relativamente aos observadores eleitorais. No campo do debate político e social no país.

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Desta vez os próprios observadores eleitorais acabaram dando uma Mensagem muito forte, aquilo que foi o seu trabalho, o que é que observaram e quais são as recomendações que deixam para a melhoria do processo. A pressão social, das organizações, da sociedade civil, da imprensa, da sociedade no geral, também contribuiu para este posicionamento um bocado mais forte.

DW África: Que impacto isso poderá ter politicamente? Porque, por exemplo, a União Europeia fala de algumas mesas onde foram encontrados boletins pré-votados.

JG: Eu penso que as relações diplomáticas entre, por exemplo, o Estado de Moçambique e a União Europeia não vai esfriar, mas vai ser uma relação talvez baseada numa perspetiva de maior frontalidade na forma como os assuntos são tratados. Mas também é importante perceber qual será o posicionamento final dos órgãos que gerem o processo eleitoral – da Comissão Nacional de Eleições e, em última instância, do Conselho Constitucional, porque por vezes o que tem sido apresentado é que, apesar da existência de irregularidades ou ilícitos eleitorais, não são suficientes para alterar a vontade popular. Esta é uma questão recorrente na nossa história democrática em que se reconhece efetivamente que houve irregularidades ou ilícitos, mas há quase sempre a mensagem de que estas irregularidades não são suficientes para alterar os resultados. Muito provavelmente é o que vai acontecer neste processo eleitoral.

DW África:  Para já, começamos por ouvir o Venâncio Mondlane que se declara vencedor das eleições. Que riscos isso pode ter amanhã se, eventualmente, os órgãos eleitorais anunciarem dados contrários?

JG: Os riscos são enormes, eventualmente até mesmo de eclosão de alguma convulsão social, porque os resultados eleitorais anunciados criam ou geram um conjunto de expetativas no seio da sociedade, quer seja dos apoiantes de Venâncio Mondlane ou do PODEMOS, quer seja dos apoiantes de outras forças políticas. Obviamente que estas situações podem ser minimizadas ou resolvidas se os órgãos de gestão eleitoral também partilharem os seus resultados com alguma tempestividade.

E há outro ponto que é fundamental, que é da credibilidade dos órgãos que gerem os processos eleitorais. Estes órgãos estão completamente desacreditados pela sociedade e o descrédito que existe é resultante da forma como estes mesmos órgãos são compostos. Nós temos comissões eleitorais que são comissões de acomodação de partidos políticos com assento parlamentar, portanto, nós temos representantes que vêm de um e do outro lado do partido do Partidos Políticos. Nós temos supostos representantes da sociedade civil, mas é como se fosse uma sociedade civil partidarizada. Então nós temos uma situação de ter órgãos que gerem o processo eleitoral, que são atores do processo. Mais do que serem árbitros, eles são atores do processo eleitoral e isto cria descrédito.

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