Angola: Partidos exigem investigação a extravio de boletins
José Adalberto
22 de agosto de 2017
Comissão Nacional Eleitoral promete medidas para garantir que nenhum partido será prejudicado após o extravio de quase quatro mil boletins de voto, mas formações políticas pedem mais explicações.
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Um comunicado da Comissão Nacional Eleitoral (CNE) divulgado a 19 de agosto, confirma o incidente ocorrido a poucos dias das eleições gerais em Angola: foram extraviados no município de Catabola, na província do Bié, 39 blocos de 100 boletins de voto cada - um total de três mil e 900 boletins. No documento, a CNE afirma que se registou "um incidente" com uma viatura que transportava boletins, atas das operações e cadernos eleitorais na comuna do Chipeta. O comunicado refere que, "em consequência, resultou a queda de uma caixa que continha material eleitoral sensível das Assembleias de Voto".
A CNE promete acautelar medidas para que nenhum candidato eleitoral saia prejudicado. No entanto, a promessa e a explicação não são suficientes para os partidos ouvidos pela DW África na província. As formações políticas representadas no Bié querem que seja criada uma comissão de inquérito para esclarecer as reais circunstâncias do extravio dos boletins.
UNITA apela a fiscalização
Adérito Jaime Fernandes, Secretário Provincial da União para Independência Total de Angola (UNITA), considera estranha a forma como os boletins de eleitores foram encontrados, mais tarde, nos escombros de uma residência. O político da oposição já solicitou à CNE a divulgação dos números de série dos boletins encontrados pelos populares na zona.
Adérito Jaime Fernandes condena ainda a Comissão pelo facto de não ter notificado os representantes dos partidos políticos na província. "Até hoje, a Comissão Provincial não apareceu para esclarecer o comunicado que foi feito em Luanda. Pedimos que fosse criada uma comissão que incluísse também os partidos políticos para averiguarmos a situação e isso não se fez", explica.
Para o representante da UNITA no Bié, as medidas anunciadas pela CNE para impedir que o incidente prejudique os candidatos não chegam.
Jaime Fernandes garante, por isso, que o seu partido está preparado para fiscalizar o processo, destacando fiscais em todas as assembleias para evitar aquilo que classifica como "fraude eleitoral".
"O mais importante é colocarmos os delegados de lista, no sentido de acompanharmos até o próprio número de série, durante a contagem dos votos", frisa.
"Negligência grave", diz CASA-CE
Também para o secretário provincial da coligação CASA-CE no Bié, Ernesto Manuel Sozinho, as explicações dadas pela CNE são pouco convincentes. Sozinho acusa o órgão de agir de má fé e sublinha que "não há vontade política por parte de quem está a conduzir este processo".
"Fala-se de um acidente. O que nos preocupa são as caixas de boletins votos que se foram dispersando ao longo de comunas e aldeias", afirma. No entender do representante da CASA-CE, a viatura que transportava os boletins de voto deveria ter sido escoltada pela polícia. Ernesto Manuel Sozinho acusa, por isso, os responsáveis pelo processo na província de "negligência grave". "As caixas foram aparecendo nas aldeias", lembra o representante da CASA-CE, sublinhando a necessidade de se criar uma comissão de inquérito para apurar responsabilidades no incidente de Catabola.
PRS condena silêncio da comissão provincial
O secretário provincial do Partido de Renovação Social (PRS) na província, António Armando, diz ter sido "surpreendido" pelo comunicado da Comissão Nacional Eleitoral em Luanda sobre o incidente do Bié. No entender do político, deveria ter havido um pronunciamento ao nível da província. "Num momento como este, calaram-se. Não convocaram os nossos representantes para os informar", afirma.
À semelhança dos restantes partidos, António Armando questiona o facto de a Comissão Provincial Eleitoral não ter tomado as providências necessárias no transporte do material em causa, por todos considerado sensível: "Material como este não pode ser transportado sem escolta policial. O PRS não está de acordo que agora venham dizer que já estão a recuperar e a repor o material. Precisamos de um inquérito real para apurar responsabilidades".
Contactada pela DW África, a secretaria provincial do MPLA recusou prestar declarações sobre este caso. A DW África contactou igualmente o departamento de comunicação do Comando Provincial da Polícia Nacional no Bié para um pronunciamento sobre os incidentes, mas os responsáveis remeteram para o comunicado da CNE, alegando que não faz sentido a corporação tecer mais declarações enquanto se aguarda pela conclusão das investigações.
Angola: Os contrastes de um gigante petrolífero
O "boom" do petróleo ainda não é para todos. Ao mesmo tempo que Angola oferece oportunidades de investimento a empresas nacionais e estrangeiras, mais de um terço da população vive com menos de um dólar por dia.
Foto: DW/R. Krieger
Lama no cotidiano
O bairro Cazenga é o mais populoso de Luanda – ali, vivem mais de 400 mil pessoas numa área de 40 quilômetros quadrados. Em outubro de 2012, chuvas fortes obrigaram muitos habitantes a andar na lama. Do Cazenga saíram muitos políticos do partido governista angolano MPLA. "Uma das prioridades de políticos pobres é a riqueza rápida", diz o economista angolano Fernando Heitor.
Foto: DW/R. Krieger
Dominância do MPLA
Euricleurival Vasco, 27, votou no MPLA nas eleições gerais de agosto de 2012: "É o partido do presidente. Desde a guerra civil, ele tenta deixar o poder, mas a população não deixa". Críticos dizem que José Eduardo dos Santos não cumpriu nenhuma promessa eleitoral, como acesso à água e à eletricidade. Mas o governo lançou um plano de desenvolvimento em novembro para dar esses direitos à população.
Foto: DW/R. Krieger
Economia informal em Angola
Muitos angolanos esperam riqueza do chamado "boom" do petróleo. Mas grande parte da população é ativa na economia informal, como estas vendedoras de bolachas na capital, Luanda. Segundo a ONU, 37% da população vivem com menos de um dólar por dia. Elias Isaac, da organização de defesa dos direitos humanos Open Society, considera este um "contrassenso" entre "crescimento e desenvolvimento".
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Uma infraestrutura de fachada?
A capital angolana Luanda é considerada uma das cidades mais caras do mundo. Um prato de sopa pode custar cerca de 10 dólares num restaurante, o aluguel de um apartamento mais de cinco mil dólares por mês. A Baía de Luanda é testemunho constante do "boom" do petróleo: guindastes e arranha-céus disputam quem é mais alto.
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O "Capitólio" de Angola
Próximo à Baía de Luanda, surge a nova sede do parlamento angolano. O partido governista MPLA vai ocupar a maior parte dos 220 assentos: elegeu 175 deputados em agosto de 2012. Por outro lado, o MPLA perdeu 18 assentos em comparação à eleição de 2008. A UNITA, maior partido da oposição, ganhou 32 assentos em 2012 – mas tem pouco espaço...
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O presidente no cotidiano de Luanda
…porque, segundo críticos, o presidente José Eduardo dos Santos (numa foto da campanha eleitoral) "domina tudo": o poder Executivo, o Judiciário e o Legislativo, diz o economista Fernando Heitor. José Eduardo dos Santos também parece dominar muitas ruas de Luanda: em novembro de 2012, quase todas as imagens eram da campanha do partido no poder, o MPLA.
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Dormir nos carros
Os engarrafamentos são frequentes em Luanda. Por isso, muitos funcionários que moram em locais mais afastados já partem para a capital angolana de madrugada. Ao chegarem em Luanda, dormem nos carros até a hora de ir trabalhar – juntamente com as crianças que precisam ir à escola. A foto foi tirada às 06:00h da manhã perto do Palácio da Justiça em novembro de 2012.
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A riqueza em recursos naturais de Angola
Angola é o segundo maior produtor de petróleo da África, mas também tem potencial para se tornar um dos maiores exportadores de gás natural. A primeira unidade de produção de LNG – Gás Natural Liquefeito, em inglês – foi construída no Soyo, norte do país, mas ainda está em fase de testes. A fábrica tem uma capacidade de produção de 5,2 milhões de toneladas de LNG por ano.
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Para acabar com a dependência do petróleo...
A diversificação da economia poderia ser uma solução, diz o Fundo Monetário Internacional (FMI). O governo angolano criou um fundo soberano do petróleo para investir no país e no estrangeiro, e para ter uma reserva caso haja oscilações no preço do chamado "ouro negro". Uma alternativa, segundo especialistas, poderia ser a agricultura, já que o petróleo só deve durar mais 20 ou 30 anos.
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Angola atrai estrangeiros
Vêem-se muitas placas em chinês e empresas chinesas em Angola. Os chineses são a maior comunidade estrangeira no país. Em seguida, vêm os portugueses, que em parte fogem à crise económica europeia. Depois, os brasileiros, por causa da proximidade cultural. Todos querem uma parte da riqueza angolana ou investem na reconstrução do país.
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Homem X Asfalto
Para o educador Fernando Pinto Ndondi, o governo angolano deveria investir "no homem e não no asfalto". Há cinco anos, Fernando e sua famíla foram desalojados da ilha de Luanda por causa da construção de uma estrada. Agora vivem nestas casas precárias. O governo constrói novas casas para a população. Porém, os preços, a partir de 90 mil dólares, são altos demais para a maior parte dos angolanos.
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Para onde vai o dinheiro?
O que aconteceu com 32 mil milhões de dólares lucrados pela empresa petrolífera estatal angolana Sonangol entre 2007 e 2011? Um relatório do FMI constatou, em 2011, que faltava essa soma nos cofres públicos. A Sonangol diz ter investido o dinheiro em infraestrutura. Elias Isaac, da Open Society, diz que o governo disponibiliza mais informações – o que "não é sinônimo de transparência".