RENAMO e MDM denunciam perseguição e tortura aos seus membros em distritos da Zambézia, no centro de Moçambique. Também o uso de bens do Estado para apoiar a campanha da FRELIMO, que, entretanto, nega as acusações.
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A campanha eleitoral na província da Zambézia, no centro moçambicano, começou a esquentar com os partidos políticos a enfrentar dificuldades na caça ao voto para as eleições do dia 15 de outubro. As forças políticas da oposição apontam vários ilícitos que, no entanto, são desvalorizados pelo partido no poder.
Manuel de Araújo, o candidato a governador da Zambézia pela Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), diz que sua campanha está a decorrer num ambiente doentio.
"Algo que nos preocupa bastante que é a não existência de um ambiente favorável para a atividade política. A nossa Constituição diz que a liberdade de manifestação, a liberdade de opinião e a liberdade de expressão são direitos consagrados", afirma Araújo, que revela que em vários distritos "essa atividade politica é apenas reservada ao partido no poder".
Perseguição política
E ao fazer essa crítica, Manuel de Araújo apresenta três exemplos concretos de casos que aconteceram recentemente. Um deles ocorreu há poucos dias, quando, segundo o candidato da RENAMO, "um jovem docente da escola de Gurissa, que só pelo facto de ter recebido em sua casa o cabeça de lista da RENAMO, foi assaltado e neste momento está no hospital central de Quelimane a receber tratamentos".
"Tivemos outro caso em Pinda, onde populares, esperando o cabeça de lista do partido RENAMO, foram violentados pela própria autoridade policial. Temos também um caso em Inhassunge, onde um cidadão, também por ter cumprimentado o cabeça de lista da RENAMO, foi espancado e arrancaram-lhe os seus bens", denuncia Manuel de Araújo.
Partido no poder não vê ilícitos eleitorais
Entretanto, Pio Matos, candidato a governador da Zambézia pela Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), não vê dificuldades alguma na atual campanha, sobretudo no que diz respeito aos ilícitos eleitorais apontados pela oposição.
Para este candidato do partido no poder, "a campanha decorre num clima de paz". "A Zambézia sempre pautou por este principio cívico. Somos uma população bastante disciplinada, que se respeita e que se faz respeitar. Por isso a campanha está a decorrer num ambiente de paz", ressalta.
Para o Movimento Democrático de Moçambique (MDM), os episódios violentos que estão a ocorrer durante a campanha, nomeadamente contra os apoiantes de alguns candidatos, demonstram efetivamente que o processo não está a ser conduzido da forma como todos esperavam.
Vitorino Francisco, porta-voz da campanha do MDM na Zambézia, diz que o partido esperava que "fosse uma campanha à dimensão dos discursos que foram proferidos no início da mesma pela Comissão Nacional de Eleições (CNE), apelando que a campanha fosse ordeira".
Uso indevido de bens do Estado
No entanto, Vitorino Francisco denuncia "a continuação do uso abusivo das viaturas do Estado pelas caravanas dos membros do Governo que se confundem com os membros do partido no poder". "Uma realidade que faz com que as pessoas tenham a ideia de que a FRELIMO é quem manda e, portanto, os não frelimistas apenas se sujeitam a cumprir", afirma.
Também Vitorino Francisco cita exemplos: "deparamos-nos nos últimos dias com situações piores, estamos a falar de situações de ameaças aos nossos membros e simpatizantes quando realizam a campanha porta a porta".
Eleições em Moçambique: Oposição denuncia intimidação na Zambézia
"Por exemplo", continua o porta-voz, "uma família de membros do MDM em Milange foi vítima de assassinato e procuramos perceber quais seriam as motivações, enquanto os lideres comunitários recusaram efetuar a cerimonia fúnebre alegadamente porque eram membros do MDM. Também foi recusado o uso do cemitério. Nós em vida não temos a liberdade, mas também na morte é-nos negado o direito de ter uma sepultura. Isso é gravíssimo!", concluiu o porta-voz da campanha do MDM na Zambézia.
Entretanto, os candidatos a governadores provinciais Manuel de Araújo, da RENAMO, e Luís Boa Vida, do MDM, trabalham esta semana na região norte da província da Zambézia, enquanto Pio Matos, da FRELIMO, escala a zona centro.
Quelimane: Familiares de doentes queixam-se das condições de acomodação no Hospital
Familiares vêm acompanhar os pacientes transferidos, na maioria, dos hospitais dos distritos e províncias vizinhas. Acompanhantes dormem no chão, alguns sem cobertores, e sem redes mosquiteiras.
Foto: DW/M. Mueia
Acomodação nos sanitários
As autoridades de saúde adjudicaram, recentemente, as obras para a construção de um muro de vedação à volta dos sanitários públicos do Hospital Central Quelimane. É nestes sanitários, e ao ar livre, que uma parte dos acompanhantes dos pacientes deste Hospital dorme. Usam a água do poço para as necessidades diárias, nomeadamente, para preparar refeições, lavar roupa e tomar banho.
Foto: DW/M. Mueia
Dormir em "Muchungué"
"Muchungué" é o nome dado ao local onde, no Hospital Central de Quelimane, se acomodam os acompanhantes dos pacientes que precisam de internamento. A maioria vem transferida dos hospitais distritais da província da Zambézia. À DW, os acompanhantes explicam que este nome se deve às condições do local: "o modo de vida é comparado ao da região de Muchungué, em Sofala, no tempo do conflito armado".
Foto: DW/M. Mueia
Péssimas condições
À DW, os acompanhantes dos doentes queixam-se da falta de dormitórios, cobertores e redes mosquiteiras. Não há também estendais para a roupa. As roupas que são lavadas são expostas nas matas para secar. Já por muitas vezes, asseveram estas pessoas, houve queixas sobre as condições de sobrevivências no local, mas as autoridades nada fizeram para melhorar a situação.
Foto: DW/M. Mueia
Redes mosquiteiras
Cada acompanhante é responsável por criar as suas condições para dormir. Têm por isso que trazer as suas próprias "esteiras e mantas". A fumaça das fogueiras tem sido uma salvação, pois afugenta os mosquitos, uma vez que também não existem redes mosquiteiras no local.
Foto: DW/M. Mueia
Refeições
As refeições são confecionadas individualmente ou em pequenos grupos de quatro elementos, independentemente, do sexo ou idade, e têm como base as pequenas contribuições de arroz e farinha ou valor monetário. Muitas vezes, o caril é feito com peixe seco, localmente conhecido como "Madjembe", e verduras preparadas em água e sal.
Foto: DW/M. Mueia
Entreajuda
Joaquina Oniva veio da Maganja da Costa, a sul da província da Zambézia. Acompanha a sua neta, que está internada há meses. Joaquina Oniva não tem nada para comer, nem para dormir, tal como a maioria dos acompanhantes. Quando a comida acaba, pede ajuda a outros acompanhantes. Algumas vezes, há gente de boa fé que, ao preparar refeições, conta com mais dois ou três elementos.
Foto: DW/M. Mueia
Falta de segurança e luz
Também Eric Semba se queixa das condições do local. À DW, lembra o sofrimento que tem passado: as noites sem cobertor, sem um dormitório convencional e sem comida. Com ou sem chuva, homens e mulheres dormem, juntos, no local. Muitas mulheres reclamam que são assediadas sexualmente por falta de segurança e iluminação.
Foto: DW/M. Mueia
Esperando a alta médica dos familiares...
Beatriz Lourenco Coambe é mais uma das muitas mulheres que aqui se encontra. Veio há três semanas do distrito de Mocuba, para acompanhar o seu irmão, internado devido a um acidente de viação. Beatriz Coambe explica que gostava de abandonar o local devido ao sofrimento que ali passa. Mas não tem alternativa. Terá que esperar até que o seu irmão tenha alta médica.
Foto: DW/M. Mueia
Situações mais críticas
Não revelando a sua identidade, este jovem veio do distrito de Gorongosa, em Sofala, para acompanhar o seu irmão mais novo. Por semana vai duas vezes à lixeira do Hospital à procura de caixas que sirvam de dormitório. Não tem condições para comprar esteiras ou cobertores. O dinheiro que trazia de casa acabou, por isso, de madrugada, circula pelos bairros vizinhos, onde apanha fruta para vender.
Foto: DW/M. Mueia
Sem garantias de melhorias
Em média, e segundo os dados estatísticos da direção do Hospital Central de Quelimane, cinco a dez acompanhantes procuram abrigo neste local, diariamente. A maioria chega dos distritos de Caia, Maganja da Costa, Mocuba, Inhassunge, Madal, Namacurra, Nicoadala e Pebane. Apesar das reclamações serem frequentes, não há garantias de melhoria das condições a curto prazo.
Foto: DW/M. Mueia
Hospital reconhece situação
O diretor do Hospital Central de Quelimane, Ladino Suade, diz estar preocupado com a situação e lamenta a falta de capacidade para solucionar o problema. No entanto, afirma que à sua instituição compete cuidar dos pacientes e não dos acompanhantes. Na sua opinião, a Direção Provincial de Ação Social da Zambézia deveria intervir.
Foto: DW/M. Mueia
Situação arrasta-se desde 2016
Construído com fundos do Governo e parceiros sul-coreanos, o Hospital Central de Quelimane foi inaugurado a 27 de outubro de 2016. É composto por mais de 100 compartimentos e tem ainda uma clínica privada com serviços e tratamentos mais especializados. Durante a construção deste Hospital, não foi periodizada a construção de salas para os acompanhantes dos pacientes.