O Partido Socialista venceu de forma expressiva as legislativas portuguesas e deve formar Governo, embora sem maioria absoluta. Votação em Portugal também foi marcada pela eleição de deputados afrodescendentes.
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Mesmo sem maioria absoluta, o Partido Socialista (PS) é o principal vencedor das eleições legislativas deste domingo (06.10), em Portugal, com 36 por cento dos votos, tendo à cabeça António Costa, que deverá formar Governo nos próximos dias.
"Assumimos esse encargo com determinação, alegria e elevado sentido da responsabilidade de termos de cumprir como cumprimos nestes quatro anos os compromissos que assumimos perante as portuguesas e os portugueses", afirmou o primeiro-ministro António Costa.
Eleições em Portugal: Socialistas vencem legislativas
Romualda Fernandes, de origem guineense, que ocupou a 19ª posição na lista do PS de António Costa pelo círculo de Lisboa, tem motivos para festejar. "A minha primeira reação é de muita felicidade e também de muitos agradecimentos aos portugueses e às portuguesas das diferentes origens", disse a deputada eleita.
Fernandes ressaltou que vai estar "atenta a todas as questões relacionadas com a exclusão social, não só relativamente às pessoas de ascendência africana, os afrodescendentes, mas de todas as pessoas que se encontram em situação de exclusão social".
Guineense abre caminho ao LIVRE
Entre os afrodescendentes que integraram as listas partidárias, destaque para Joacine Moreira, também de origem guineense, que entra diretamente para o Parlamento dando ao LIVRE uma vitória histórica, como referiu o líder do pequeno partido, Rui Moreira: "O LIVRE estará na Assembleia da República com uma agenda ambiciosa, de justiça social, justiça ambiental e uma nova estratégia de futuro para o país, para falar com toda a esquerda".
Joacine Moreira, que batalhou pela visibilidade dos afrodescendentes, falou emotiva dos desafios do futuro, afirmando que "as reivindicações das minorias, quaisquer que sejam, são aquelas que vão reforçar a democracia em Portugal".
Na longa noite eleitoral, Beatriz Gomes Dias, luso-guineense nascida no Senegal, também tem razões para comemorar, pela posição reforçada que o seu partido, Bloco de Esquerda – liderado por Catarina Martins –, conseguiu alcançar agora como a terceira força política no Parlamento português.
De acordo com Dias, o seu "compromisso é com o programa que nós apresentamos às eleições, que é um programa de uma luta intransigente contra a discriminação racial, pela igualdade e pela democracia".
Por seu lado, o luso-angolano, Nuno Carvalho, que concorreu como cabeça de lista pelo círculo de Setúbal, é outro eleito entre os futuros deputados do Partido Social Democrata (PSD).
Maior abstenção e "derrota histórica"
De referir que nestas eleições, em que participaram 21 partidos políticos, a abstenção subiu dos 44 por cento em 2015 para os 45 por cento agora em 2019.
O novo Parlamento português mudará de configuração com a entrada de três pequenos partidos, a saber: o CHEGA, Iniciativa Liberal e LIVRE, que elegeram um deputado cada. No entanto, embora o líder social-democrata, Rui Rio, não o tivesse admitido, analistas consideram que esta foi uma "noite eleitoral amarga" para a direita, que sofreu uma "derrota histórica".
Marginalização: Onde vivem os afrodescendentes em Lisboa
Em Lisboa, vivem dispersas várias comunidades, entre as quais a africana e de afrodescendentes. Ao longo dos anos, foram submissas a uma posição social que contribuiu para a sua marginalização.
Foto: DW/J. Carlos
O caso extremo da Jamaica
Jamaica é um exemplo de marginalidade no Vale de Chícharros, situado no Seixal, no distrito de Setúbal. "As condições são incríveis. Nem se acredita", lamenta a arquiteta italiana, Elena Taviani. O realojamento das famílias, de acordo com a autarquia local, ficará completo em dezembro, antecipando o calendário para a sua conclusão em 2022. Aqui vai nascer um parque urbano e uma zona comercial.
Foto: DW/J. Carlos
Mapeamento dos bairros
A arquiteta italiana Elena Taviani decidiu fazer o mapeamento dos bairros residenciais onde é assinalável a presença de africanos e afrodescendentes para avaliar o índice de marginalização no espaço urbano na Área Metropolitana de Lisboa. O estudo em curso pretende mostrar que tais comunidades foram "empurradas" pelas estruturas do poder a ocupar uma posição marginal em Lisboa.
Foto: DW/J. Carlos
"6 de maio" em fase de extinção
No bairro "6 de maio", na Damaia, também construído por imigrantes africanos, ainda restam estruturas num raio de dois quilómetros. A forma como foram realizadas as demolições e o realojamento das pessoas que ali moravam ainda estão a ser objeto de grande debate e conflito entre a população e a Câmara Municipal.
Foto: DW/J. Carlos
Cova da Moura e o estigma da criminalidade
A Cova da Moura, no concelho da Amadora, mantém o seu traçado arquitetónico peculiar, onde é muito forte a identidade cultural africana, em particular a cabo-verdiana. Um dos bairros informais outrora rotulado de "problemático" pela imprensa "é um dos sítios onde as pessoas ainda evitam ir pelo seu forte estigma de negatividade e criminalidade", refere Elena Taviana.
Foto: DW/J. Carlos
Sinais de degradação no Bairro Amarelo
No Monte da Caparica, em Almada, fica o Bairro Amarelo. O também conhecido Bairro do Pica Pau Amarelo acolheu grupos de pessoas oriundas dos PALOP que viviam em barracas espalhadas pelo município. O bairro está minimamente dotado de infraestruturas sociais, mas notam-se sinais de degradação dos edifícios e falta de higienização nalgumas das áreas circundantes e do interior.
Foto: DW/J. Carlos
Protestos por uma melhor habitação
Ricardina Cuthbert, do precário Bairro da Torre em Camarate (Sacavém), é uma das vozes que, desde 2012, tem reclamado melhores condições de habitação para cerca de 40 famílias que lá vivem. "Tem sido um processo muito lento", lamenta a dirigente da Associação Torre Amiga.
Foto: DW/J. Carlos
Trajetória espacial dos afrodescendentes
Elena Taviani quer aprofundar o estudo sobre esses bairros para a sua tese de doutoramento a apresentar, em 2021, no Gran Sasso Science Institute (Itália). Em junho, a arquiteta publicou uma análise relativa à trajetória espacial dos afrodescendentes na revista científica de Estudos Urbanos "Cidades, Comunidades e Territórios", editada pelo Instituto Universitário de Lisboa.
Foto: DW/J. Carlos
Mouraria em transição
A Mouraria, onde vive Taviani com o marido cabo-verdiano e a filha, está numa fase de profunda renovação por força da especulação imobiliária. No passado, tinha o estereótipo de um lugar central, mas degradado, com rendas muito baixas, o que atraiu muitos imigrantes, entre os quais africanos. De acordo com a sua pesquisa, cerca de 25% dos que moram em Mouraria são originários dos PALOP.
Foto: DW/J. Carlos
Uma das zonas de referência
Apesar da inflação dos preços provocada pela valorização urbana e pelo turismo, o bairro da Mouraria ainda tem alguma presença de africanos e afrodescendentes. Ainda antes dos asiáticos, introduziram aqui o comércio de produtos oriundos de África, acabando por ser hoje uma zona de referência na capital para negócios e para quem quer fazer compras ou procurar gastronomia dos países de origem.
Foto: DW/J. Carlos
Sem razões de queixa
Januário morava numa barraca em Algés. Veio para Portugal com 16 anos e fixou-se na Outurela quando tinha 39 anos de idade. Natural de Cabo Verde, ele está em Portugal há 45 anos, já com nacionalidade portuguesa. Gosta do bairro e do convívio entre as pessoas. Os transportes funcionam bem, tem autocarros à porta. Não tem razões de queixa.
Foto: DW/J. Carlos
O bom exemplo de Outurela
Outurela – onde existe uma forte comunidade cabo-verdiana – é considerado "um caso bem sucedido" no âmbito do programa de realojamento da Câmara Municipal de Oeiras. "Os moradores dizem que tiveram sorte de serem realojados ali", afirma Elena Taviani, que menciona também o Casal da Mira, na Amadora, como um sítio onde as coisas vão melhorando, apesar do forte estigma negativo.
Foto: DW/J. Carlos
Arte urbana na Quinta do Mocho
A Quinta do Mocho, em Loures, passou a designar-se Terraços da Ponte, depois de construído. É uma das "ilhas" com grandes problemas de marginalidade. O bairro, que sempre teve uma imagem negativa, foi transformado na maior galeria de arte urbana a céu aberto da Europa com mais de cem grafittis nas suas fachadas cegas. Essa é uma tentativa de criar um novo pólo de atração turística.