Eleições gerais na Guiné-Bissau: o início de um caminho para a reconstrução do Estado
14 de junho de 2013 Bruxelas irá assegurar as condições técnicas e financeiras para a realização das eleições gerais na Guiné-Bissau. Falando aos jornalistas após a tomada de posse da nova equipa dirigente da Comissão Nacional de Eleições (CNE), liderada pelo juiz do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) Augusto Mendes, o representante da União Europeia (UE) na Guiné-Bissau, Joaquim Gonzalez Ducay, assegurou que a UE "vai apoiar técnica e financeiramente as eleições gerais" que devem realizar-se até ao final de 2013.
Gonzalez Ducay não é presença habitual nas cerimónias ou atos oficiais das autoridades de transição, que não são reconhecidas por Bruxelas, todavia esta quinta-feira (13.06) Gonzalez Ducay sentou-se na primeira fila de convidados no ato de posse dos novos dirigentes da CNE.
O que terá contribuido para desbloquear o impasse nas relações entre Bruxelas e Bissau foi a constituição de um Governo inclusivo, mas também a percepção da necessidade de um novo quadro de compromisso dos parceiros internacionais.
Eleições não são panaceia
O desafio maior na Guiné-Bissau, nunca foi o de organizar eleições, para as quais os doadores internacionais sempre mostraram vontade política e agiram rapidamente, o verdadeiro problema do país é a fragilidade do Estado, nomeadamente a instabilidade política recorrente, o défice democrático, a incapacidade das instituições públicas, a insubordinação das Forças Armadas, a impunidade, factores a que se soma o impacto de fenómenos transnacionais como o tráfico de droga e a criminalidade organizada. A permeabilidade dos militares da classe política ao narcotráfico acrescenta um elemento de maior volatilidade à já complexa constelação guineense.
A história recente da Guiné-Bissau, desde a independência, é um somatório de desafios constantes à normalidade constitucional e instabilidade política, em particular desde a guerra civil de 1998-1999. Golpes de estado, contragolpes e intentonas, assassínios políticos e um padrão de desrespeito pelos direitos humanos deixaram de ser a excepção e passaram a ser a regra. Nos dez anos a política guineense passou a ser feita de arma em punho.
Golpes, contragolpes e intentonas
Enumeremos: entre 1998 a 2013, a Guiné-Bissau elegeu dez primeiros-ministros, sem nenhum deles ter concluido o mandato, teve três presidentes interinos em virtude dos levantamentos militares, quatro chefes de Estado-Maior, todos afastados, sem nenhum completar o mandato, por motins militares (e dois foram assassinados, em funções, pelos militares), e três Presidentes.
Com este pano de fundo o desenvolvimento têm sido repetidamente adiado e a Guiné-Bissau, um dos países mais pobres do mundo apesar dos seus abundantes recursos naturais, encontra-se hoje na cauda do Índice de Desenvolvimento Humano, ocupando 176ª posição entre 186 países no relatório do PNUD relativo a 2013.
Dos aproximadamente 1.5 milhões de habitantes do país, 69.3% vive em situação de pobreza absoluta (ou seja com um rendimento inferior a 2 dólares por dia), comparado com 49% em 1991.
A Guiné-Bissau pode desaparecer como país
Face aos actuais desafios com que o país se depara José Ramos Horta, Representante Especial das Nações para a Guiné-Bissau, alertou, precisamento no dia em que se completava o primeiro aniversário do mais recente golpe militar (12.04.12) que o país enfrenta "uma ameaça existencial enquanto Estado".
À Guiné-Bissau, que perdeu inúmeras oportunidades de travar o crescendo de violência e insegurança e inverter a espiral de fragilidade e pobreza, resta uma via de saída da crise crónica muito estreita que não pode ser dissociada da reforma do sector de segurança e defesa.
Soluções de longo prazo para a Guiné passam pela reforma das Forças Armadas
Em Março, a Missão Conjunta de Avaliação CEDEAO/UA/CPLP/UE/ONU na Guiné-Bissau, reconheceu a necessidade imperiosa de soluções de longo prazo para "os problemas da impunidade, das violações dos direitos humanos e da intrusão repetida do exército na vida política do país que se colocam há muito tempo".
A Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) irá disponibilizar de imeadiato para a Guiné-Bissau 9,2 milhões de dólares (6,9 milhões de euros) para apoiar o programa de reforma do sector de defesa e segurança. A verba que deve chegar a Bissau o mais tardar na próxima terça-feira (18.06) faz parte de um envelope de 63 milhões de dólares (47,3 milhões de euros) que a CEDEAO prometeu entregar às autoridades guineenses para a reforma do sector militar.
Os analistas reconhecem a necessidade de reduzir consideravelmente as Forças Armadas ( há actualmente mais oficiais do que soldados), repensar o papel destas na construção de um Estado democrático e dotar o Fundo de Pensões com a verba prometida.