Todos os dias há jovens a subir. São eles que alimentam os garimpeiros em Chimanimani, a reserva natural que separa Moçambique do Zimbabué. Quando descem, trazem pepitas de ouro nos bolsos.
Há muito que as notas do Zimbabué não valem os milhões que prometem na figura. Por isso, em Chimanimani, o ouro circula sempre nas notas do país do ladoFoto: DW/M.Barroso
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Baco Ramambo é o mercado central do ouro que corre de mão em mão em Chimanimani. É para lá que Neto António Coco e muitos outros, como ele ainda jovens, se dirigem. O mercado fica longe, para lá do Monte Binga, o ponto mais alto de Moçambique, para lá de subidas e descidas e outras subidas e descidas que iludem pernas inexperientes. É na cabeça que, durante todo o percurso, os jovens balançam a mercadoria que abastecerá os garimpeiros que lá estão em cima.
A fuligem que sobe do lume dentro das cavernas crava-se nos pulmões, queima os olhos. Na imagem: Neto (segundo da esq.) e garimpeiros na Caverna GuebuzaFoto: Marta Barroso
Só à noitinha, quando a luz se esconde no fundo do planalto, já lá no cimo, todos se permitem a primeira pausa desde o almoço – lá, onde começam as cavernas. É aqui que carregadores e garimpeiros moram. Aqui cozinham, aqui se aquecem com lenha do mato e aqui dormem.
No dia seguinte, Neto chega a Baco Ramambo. Desde que foi agredido por bandidos e as dores lhe limitam os movimentos da mão esquerda, já não extrai ouro. Agora tem constantemente três rapazes a vender produtos na zona do mercado.
Um quilo de farinha: um ponto, 70 meticais, 1,60 euros
Em dias de chuva como hoje, poucos são os garimpeiros que ousam entrar nos riachos – nestas condições impiedosas, a água provoca febres. Assim, só os carregadores faturam.
Programa Especial Chimanimani Ouro - MP3-Mono
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É certo que os produtos estão baratos no mercado – uma dose de peixe salgado está a dois pontos, que correspondem a 140 meticais ou 3,20 euros; um maço de cigarros são 70 meticais, em pontos: um ponto, sendo que dez pontos equivalem a um grama de ouro – mas por cada dia de chuva que os carregadores passam na montanha, mais um dia alimentam os trabalhadores do ouro.
A verdadeira fortuna não cabe aos que carregam a farinha
Só depois de vendidos todos os produtos, os carregadores descem a montanha. Regressam pelo mesmo caminho, entre a vegetação molhada pela chuva, sobem e descem os montes, entram nos rios, na floresta e correm até à paragem de chapa da localidade da Máquina.
O caminho até Baco Ramambo é longoFoto: Marta Barroso
De lá, dirigem-se sem desvios ao mercado do ouro da cidade de Manica. É um mercado legal, do conhecimento das autoridades. Mas lá, também eles, que têm o ouro que, aos olhos dos fiscais, da polícia e do Governo, é ouro sujo, lá, também eles, os filhos perdidos de Chimanimani, podem vender as suas preciosidades embrulhadas nas notas sem valor do Zimbabué.
Vendem-nas aos libaneses, aos americanos e aos sul-africanos que por eles esperam. São estes que fazem as verdadeiras fortunas vindas de Chimanimani – o "El Dorado" que nunca pisaram.
Marta Barroso conheceu estes jovens, acompanhou-os e comeu com eles, ouviu as suas histórias. Tal como eles, percorreu o caminho até Baco Ramambo e dormiu numa caverna de Chimanimani.
Os filhos perdidos de Chimanimani
Todos os dias há jovens a subir. São eles que alimentam os garimpeiros em Chimanimani, a reserva natural que separa Moçambique do Zimbabué. Quando descem, trazem pepitas de ouro nos bolsos.
Foto: DW/M.Barroso
O ouro de Chimanimani
Em 2006, conta-se, a produção diária em Chimanimani era de 5g por garimpeiro por dia. Hoje, queixam-se, não passa de 3g por garimpeiro por dia.
Foto: DW/M.Barroso
Preciosidades em notas sem valor
É em notas de milhões de dólares zimbabueanos que se transporta o ouro por aqui. Papel não é seguro, porque, quando molha, rasga. A nota é mais fiável: dobra-se uma e outra vez, dobra-se umas quantas vezes e prende-se com um fio de ráfia. E as notas do Zimbabué há muito que não valem os milhões que prometem na figura.
Foto: DW/M.Barroso
Matzundzo, o régulo
Toda a zona que se estende até ao mercado do ouro de Baco Ramambo se encontra sob a autoridade do régulo Matzundzo.
Foto: DW/M.Barroso
Ao almoço, uma pausa
Mateus tem 24 anos. Há três ganha a vida a carregar produtos em Chimanimani. Para conseguir chegar a Baco Ramambo, é preciso fumar, conta. Para ter "power".
Foto: DW/M.Barroso
Para lá dos montes
Por aqui, todos dizem que o caminho até ao mercado demora "duas horas de relógio". Na realidade, o percurso toma dias. Pausas são luxo raro.
Foto: DW/M.Barroso
Quem passa, leva ensopadas as calças
Em Chimanimani, os rios não têm pontes. Os rapazes seguem em frente, água dentro, sem grandes paragens, sem hesitações, vestidos, calçados, a mercadoria a balançar nas cabeças.
Foto: DW/M.Barroso
Neto, o negocianteNeto, o negociante
António Neto Coco com a sua balança de ouro. Desde que foi agredido por bandidos, tem regularmente três rapazes a vender produtos na zona do mercado de Baco Ramambo.
Foto: DW/M.Barroso
Vida sob camuflagem
Muitos em Chimanimani vêm do Zimbabué. Por 600 meticais, nem 14 euros, compram identidade moçambicana. Assim, se forem descobertos com ouro, evitam ser deportados para o país do lado, um país sem futuro.
Foto: DW/M.Barroso
Entre o fumo
Carregadores e garimpeiros moram em cavernas. Aqui cozinham, aqui se aquecem com lenha do mato e aqui dormem. A fuligem que sobe do lume pinta as paredes da rocha, crava-se nos pulmões, queima os olhos.
Foto: DW/M.Barroso
Natureza em erosão
Desde que os fiscais do parque sobem ao planalto para escurraçar os infratores da lei, os garimpeiros dispersam ao longo de vários rios. Assim, a vegetação ribeirinha é destruída, a erosão dos solos espalha-se e os sedimentos são transportados pela corrente, causando turvação das águas.
Foto: DW/M.Barroso
Baco Ramambo, o mercado
Em dias de chuva como hoje, cada um se refugia na sua caverna e o mercado de Baco Ramambo adquire um ar triste. Das negociatas que aqui se fazem em dias bons não há sinal.
Foto: DW/M.Barroso
A camarata do mercado...
Poucos são os que se aventuram a pernoitar na zona de Baco Ramambo com medo dos fiscais. Ainda assim, esta camarata serve de abrigo aos que por aqui ficam.
Foto: DW/M.Barroso
... e a cozinha
O rádio que traz música na caverna da cozinha de Baco Ramambo foi vendido num dia húmido como o de hoje. Em dias assim, só os carregadores faturam, já que poucos garimpeiros ousam entrar nos riachos – nestas condições impiedosas, a água provoca febres.
Foto: DW/M.Barroso
Chimanimani - um El Dorado
É aos americanos, aos sul-africanos e aos libaneses que carregadores e garimpeiros vendem o seu ouro. São eles que fazem as verdadeiras fortunas vindas de Baco Ramambo.