Em Portugal, João Lourenço promete superar falta de divisas
24 de novembro de 2018Neste sábado (24.11), num programa mais privado a marcar a última etapa desta primeira visita oficial a Portugal, João Lourenço esteve de manhã na Base Naval de Lisboa e ao Arsenal do Alfeite, a que se seguiram uma entrevista coletiva aos órgãos de comunicação social portugueses, bem como angolanos, e um almoço no Palácio de Belém com o seu anfitrião Marcelo Rebelo de Sousa.
O Presidente angolano anunciou que convidou o chefe de Estado português, Marcelo Rebelo de Sousa, a visitar Angola entre 6 e 8 de março do próximo ano, com chegada a Luanda no dia 5. Lourenço anunciou estas datas no final do almoço privado oferecido pelo Presidente português, no Palácio de Belém, em Lisboa.
De recordar que o foco desta visita de Estado é atrair mais investimento externo e abrir as portas às pequenas e médias empresas portuguesas que, com o seu conhecimento e experiência, podem levar mais-valias para a estratégia de diversificação da economia angolana, a qual ainda depende da "monocultura do petróleo", como aludiu o próprio João Lourenço.
Esta é uma das vias para fazer crescer a economia e sair da crise, de modo a gerar riqueza, que possa permitir ao Governo dar resposta a muitas das inquietações com que se confronta no dia a dia a comunidade angolana em Portugal.
Uma delas prende-se com as dificuldades de transferência monetária de Angola para Portugal, o que afeta os angolanos na diáspora em geral - mas sobretudo os estudantes, os doentes com ou sem junta médica a viver em situação precária ou os antigos combatentes e veteranos da Pátria.
Falta de divisas
Na noite desta sexta-feira (23/11), durante o encontro entre João Lourenço e a comunidade angolana, num hotel de Lisboa, os participantes expuseram uma vasta lista de preocupações - entre as quais, as dificuldades de transferência de dinheiro do país natal para o exterior.
Procurando satisfazer as expetativas, João Lourenço esclareceu que "a economia angolana não está a produzir divisas suficientes", mas assegurou que o seu Governo "não vai cruzar os braços" para solucionar o problema.
O Presidente angolano adiantou ainda que os setores competentes, nomeadamente o Ministério da Finanças e o Banco Nacional de Angola, estão a trabalhar no sentido de se ultrapassar esta situação.
"No caso de Portugal, temos maior garantia de resolver o problema de escassez da divisa euro do que da divisa dólar", disse. "Há mais garantia para quem reside na Europa. Proximamente, nós teremos esse problema resolvido e com a facilidade de voltar a fazer as transferências que se fazia no passado", concluiu.
Eleições na diáspora
Os angolanos radicados em Portugal manifestaram ainda ao Presidente de Angola, João Lourenço, o desejo de votar, por direito, nas próximas eleições gerais.
Uma cidadã angolana, inscrita entre os intervenientes criteriosamente selecionados para colocar questões ao Presidente da República, lançou o desafio ao reclamar o direito de voto da diáspora nas futuras eleições gerais em Angola.
"Apesar de vivermos longe, nós também somos angolanos", disse a referida cidadã que, tal como muitos conterrâneos seus sentados no amplo auditório do hotel, deseja que as mudanças em curso no país cheguem também à comunidade radicada no estrangeiro.
Os angolanos querem saber quais as medidas que o Executivo de João Lourenço irá encetar para que isso venha a acontecer e que instrumentos político-administrativos vão ser utilizados para o efeito. João Lourenço recorreu à Constituição para responder à ansiedade de todos, recordando que o anterior texto constitucional previa a eleição de três deputados da diáspora.
A Assembleia Nacional era composta por 223 deputados, três dos quais eleitos na diáspora, mas, segundo o Presidente angolano, esta possibilidade não está prevista na Constituição de 2010 atualmente em vigor.
"É um problema. Como resolver? Só mexendo na Constituição," respondeu o chefe de Estado. Perante a reação na sala, João Lourenço precisou: "Não estou a dizer que não seja possível. Isso não é nenhuma impossibilidade".
"Ela própria, a Constituição, define em que situações é que pode haver revisões constitucionais, para se fazerem alterações a esta lei-mãe," esclareceu.
Faltou vontade do regime anterior
Em reação, a DW-África ouviu o ativista associativo, Carlos Osvaldo Sousa, a propósito da "Campanha Angola Vota 2022", lançada esta semana a partir de Lisboa, cujo documento foi enviado, entre outros, aos órgãos de soberania angolanos e portugueses.
O presidente da Plataforma de Reflexo Angola, um movimento que reúne críticos da sociedade civil angolana, disse que a proposta, apresentada intencionalmente na semana da visita de João Lourenço a Portugal, pede ao Presidente angolano que crie condições para permitir a participação da diáspora espalhada pelo mundo nas eleições previstas para 2022.
Por meio desta campanha, "os angolanos a residir no estrangeiro" reiteram "o apelo, agora ao Presidente da República João Lourenço, enquanto titular do Poder Executivo, para a criação urgente e definitiva das condições", que permitam "o exercício do direito de voto nos futuros pleitos eleitorais" – lê-se no documento distribuído à imprensa.
O mesmo documento refere que "o voto é um direito constitucionalmente previsto no Artigo 54º da Constituição da República de Angola, sendo ainda garantido o direito de voto aos cidadãos angolanos residentes no estrangeiro no Artigo 143º".
Mais adiante lembra que "é absolutamente imperativo que o princípio da igualdade dos cidadãos angolanos, consagrado constitucionalmente, seja respeitado pelas autoridades angolanas".
A campanha visa "mobilizar toda a diáspora e contribuir para a prosperidade de Angola", precisou o dirigente da Plataforma que diz estarem plasmadas na Constituição as condições para que haja participação da diáspora.
"É preciso depois haver mobilização, em termo de registos, para que os nossos consulados em qualquer parte do mundo façam o recenseamento dos angolanos residentes, criando-se até 2022 as tais condições que permitam a todos poderem participar", pondera Carlos Osvaldo Sousa.
Os angolanos radicados no exterior do país nunca votaram, lembra. "Não houve vontade nenhuma do regime anterior [encabeçado pelo ex-Presidente José Eduardo dos Santos] de criar condições para o efeito", critica.
Agora que o país vive uma fase de mudanças, Carlos Sousa espera "um sinal" da parte do Presidente da República "em se debruçar sobre esta matéria".
Provavelmente, admitiu, será necessário um amplo debate e reflexão com a sociedade sobre a proposta - a pensar nas próximas eleições legislativas, mas também nas presidenciais – "se as condições constitucionais forem propícias" para a eleição de um a dois deputados em representação da diáspora.
De convidado a anfitrião
João Lourenço parte de Lisboa este domingo (25.11), com chegada a Luanda prevista para o final do dia, tendo deixado expresso um convite ao seu homólogo português para visitar Angola em 2019. Marcelo Rebelo de Sousa afirmara antes, em entrevista à Rádio Nacional de Angola, que visitará o país na primeira ocasião. “Marquem a data que vou já”, declarou.
Quando ainda estava à flor da pele o mal-estar nas relações político-diplomáticas luso-angolanas, Rebelo de Sousa pautou sempre por um discurso de estadista prudente, sublinhando que os angolanos e os portugueses estão destinados a estarem juntos.
"Estaremos sempre juntos. Isso é mais importante do que as questões de pormenor temporárias, que essas são passageiras", disse em tom de cortesia à estação estatal angolana.