Protestos: Argelinos continuam a exigir mudanças no Governo
Jens Borchers | kg
14 de maio de 2019
Mesmo a cumprir o jejum do Ramadão, manifestantes não desistem. População da Argélia quer mudança de Governo, além de eleições livres e justas. Mas uma mudança profunda no cenário político, porém, parece distante.
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Jejuar e protestar é o lema dos argelinos que tomam as ruas do país contra o Governo desde meados de fevereiro. Mesmo com o Ramadão, as manifestações que levaram à queda do antigo Presidente Abdelaziz Bouteflika continuam. Na capital Argel, os manifestantes são incansáveis. "As pessoas estão a fazer jejum e têm pouca energia. Porém, não vamos desistir, porque o nosso objetivo é maior do que nós mesmos", conta um estudante.
O Presidente interino, Abdelkader Bensalah, diz que o Governo reagiu de forma positiva aos protestos. "A voz da população foi ouvida. O Governo reagiu de forma positiva, rápida e compreensiva aos desejos, expectativas e exigências", afirmou.
Ainda assim, os manifestantes exigem a demissão de Bensalah, um seguidor fiel do antigo Presidente que ocupou vários cargos durante as quase duas décadas do Governo anterior.
Em protesto há três meses, argelinos continuam a exigir mudanças
O chefe do Exército argelino, Ahmed Gaid Salah, determinou que um novo Presidente seja eleito num prazo de dois meses. A eleição presidencial foi agendada para 4 de julho, mas manifestantes e um grupo de magistrados prometem boicotar a votação por entenderem que o atual Governo não irá garantir eleições livres e justas.
Louisa Hamadouche, cientista política da Universidade de Argel, diz que sem reformas profundas uma eleição presidencial apressada não trará uma solução para a crise. "Isso seguirá a Constituição, mas vai substituir um Presidente que foi alvo de protestos por um novo Presidente que também será alvo de manifestantes, enquanto temos um Presidente interino que também é alvo de protestos", observou.
Falta de confiança
Grande parte da população argelina perdeu toda a confiança nos governantes. O chefe do Exército Gaid Salah fala numa "crise de Estado", que precisa terminar o mais rápido possível. Já a politóloga Louisa Hamadouche diz que trocar apenas algumas figuras da antiga administração não irá solucionar o problema.
"O Estado não está em perigo. Os governantes estão em perigo. Eu duvido que seja possível seguir adiante com o lema de que se o Governo fizer algumas concessões, os manifestantes irão para casa. Eu não acho que isso será suficiente no futuro", diz a analista.
O general Ahmed Gaid Salah, o homem mais poderoso da Argélia no momento, tenta obter vantagens políticas com um discurso contra a corrupção. A Justiça Militar determinou a prisão de Said Bouteflika, irmão do antigo Presidente, e de dois ex-chefes da inteligência, sob a acusação de conspirarem contra o Estado argelino. Alguns empresários ricos também estão sob custódia por supostas acusações de desvios.
Para alguns manifestantes, essa é apenas uma manobra de distração. "Essas prisões são como uma sessão de cinema. Essas pessoas devem ser julgadas, talvez até por traição. Mas agora não é o momento certo para isto", afirmou um estudante.
Participantes nos protestos afirmam que tais processos judiciais devem decorrer depois da troca de regime. Mas uma mudança profunda de Governo parece distante, apesar dos insistentes protestos da população.
Presidentes africanos para sempre
Vários presidentes africanos governam há tanto tempo, que muitos cidadãos não conhecem outro líder do seu país. Teodoro Obiang Nguema é o líder africano há mais tempo no poder: governa a Guiné Equatorial desde 1979.
Foto: picture-alliance/AP Photo/S. Alamba
Guiné Equatorial: Teodoro Obiang Nguema
Teodoro Obiang Nguema Mbasogo é atualmente o líder africano há mais tempo no poder, depois de, em 2017, José Eduardo dos Santos ter deixado o cargo de Presidente de Angola, que ocupava também desde 1979. Neste ano, Obiang chegou ao poder através de um golpe de estado contra o seu tio, Francisco Macías. Nas últimas eleições no país, em 2016, Obiang afirmou que não voltaria a concorrer em 2020.
Foto: picture-alliance/dpa/S. Lecocq
Camarões: Paul Biya
Com o seu nascimento no ano de 1933, Paul Biya é o Presidente mais idoso do continente africano e apenas ultrapassado em anos no poder pelo líder da vizinha Guiné Equatorial. Biya chegou ao poder em 1982. Em 2008, uma revisão à Constituição retirou os limites aos mandatos. Em 2018, Biya, foi declarado vencedor das eleições. Os Camarões atravessam uma crise com a rebelião na parte anglófona.
Foto: picture-alliance/AA/J.-P. Kepseu
Uganda: Yoweri Museveni
Com mais de 30 anos no poder, Yoweri Museveni é, para uma grande parte dos ugandeses, o único Presidente que conhecem. 75% dos atuais 35 milhões de habitantes nasceram depois de Museveni ter subido ao poder em 1986. Em 2017, foi aprovada a lei que retira o limite de idade (75 anos) para concorrer à Presidência. Assim sendo, Museveni já pode concorrer ao sexto mandado, nas eleições de 2021.
Foto: picture alliance/AP Photo/B. Chol
República do Congo: Denis Sassou Nguesso
Foi também uma alteração à Constituição que permitiu que Denis Sassou Nguesso voltasse a candidatar-se e a vencer as eleições em 2016 na República do Congo (Brazzaville). Já são mais de 30 anos à frente do país, com uma pequena interrupção entre 1992 e 1997. Denis Sassou Nguesso nasceu no ano de 1943.
Foto: picture-alliance/AA/A. Landoulsi
Ruanda: Paul Kagame
Paul Kagame lidera o Ruanda desde 2000. Antes, já teve outros cargos influentes e foi líder da Frente Patrifótica Ruandesa (FPR), a força que venceu a guerra civil no Ruanda. Em 2017, Kagame ganhou as eleições com 98,8% dos votos. Assim poderá continuar no poder até, pelo menos, 2034. Assim ditou a consulta popular realizada em 2015 que acabou com o limite de dois mandatos presidenciais.
Foto: Imago/Zumapress/M. Brochstein
Burundi: Pierre Nkurunziza
Em 2005, Pierre Nkurunziza chegou ao poder no Burundi. Em 2015, o terceiro mandato de Nkurunziza gerou uma onda de protestos entre a população que, de acordo com o Tribunal Penal Internacional, terá causado cerca de 1.200 mortos e 400.000 refugiados. Em maio de 2018, teve lugar um referendo para alterar a Constituição, que permitiu ao Presidente continuar no cargo até 2034.
Foto: Reuters/E. Ngendakumana
Gabão: Ali Bongo Ondimba
Ali Bongo ainda está longe de quebrar o recorde do pai, que esteve 41 anos no poder, mas já vai no terceiro mandato, ganho em 2017, no meio de muita contestação. Em 2018, a Constituição do Gabão foi revista para acabar com o limite de mandatos. A nova versão da Constituição também aumentou os poderes do Presidente para tomar decisões unilateralmente.
Foto: Reuters/Reuters TV
Togo: Faure Gnassingbé
Em 2005, Faure Gnassingbé substituiu o pai, que liderou o país durante 38 anos. Ao contrário de outros países, o Togo não impunha um limite aos mandatos. Em 2017, após protestos da população contra a "dinastia" Gnassingbé, foi aprovada a lei que impõe um limite de mandatos. No entanto, a lei não tem efeitos retroativos, pelo que o ainda Presidente poderá disputar as próximas eleições, em 2020.
Foto: DW/N. Tadegnon
Argélia: Abdelaziz Bouteflika
Abdelaziz Bouteflika esteve 20 anos no poder na Argélia (1999-2019). Em 2013, sofreu um acidente vascular cerebral (AVC), mas nem a idade, nem o estado de saúde travaram o Presidente de anunciar que iria procurar um quinto mandato em 2019. Em abril de 2019, face a protestos públicos, anunciou a sua renúncia ao cargo. Nesta altura, já teve 82 anos de idade.